Manaus, 24 de abril de 2024
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Manaus, 24 de abril de 2024

Cidades

Uso de máscara para evitar contágio por Covid-19 aumentou criminalidade

Bandidos estão se aproveitando da pandemia do novo coronavírus para praticar crimes em Manaus e no interior do Amazonas

Uso de máscara para evitar contágio por Covid-19 aumentou criminalidade

Foto: Josemar Antunes/Amazonas1

O número de mortes e casos confirmados pelo novo coronavírus cresce dia após dia no Amazonas e vem afetando a economia com o aumento da taxa de desemprego, diminuição da renda familiar, queda na arrecadação tributária, investimentos e produção.

Para conter o avanço da doença causada pelo novo coronavírus e evitar estragos na economia legal, o Governo do Amazonas tem tomado como política de saúde pública, medidas de prevenção com o isolamento social, fechamento de comércios não essenciais e o uso de máscaras de proteção facial a fim de evitar o contato físico.

Máscara obrigatória para prevenir vírus tornou-se uma aliada de criminosos (Foto: Josemar Antunes/Amazonas1)

O uso de máscaras como equipamento individual em locais públicos deveria ser um aliado da população, porém, tem sido um aliado dos criminosos.

Desde que as restrições passaram a vigorar, os cenários de descontrole social mostram aumento de violência doméstica, estupros, assaltos, furtos, latrocínio, apreensões de entorpecentes, prisões por tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo, tentativas de homicídios e homicídios consumados.

Se por um lado, as medidas adotadas pelo Governo para a não disseminação da doença serviram de justificativa para colocar as pessoas com o slogan “Fique em Casa”, por outro, o crescimento da criminalidade preocupa a população, principalmente em áreas carentes, sem presença efetiva de policiamento por conta de difícil acesso.

A reportagem foi às ruas da capital amazonense para saber as opiniões da população a respeito da quarentena mantida pelo Governo do Amazonas.

O industriário Elisvaldo de Jesus Pinto dos Santos, 43, aprova a medida imposta pelo governador e mostra preocupação com os altos índices de criminalidade no estado, especialmente na capital.

“É plausível a ideia do governador em manter o isolamento social, principalmente, quando a decisão consiste em prevenir a população dos riscos de contágio com a doença. Por outro lado, as pessoas que estão saudáveis e permanecem nas ruas, ficam vulneráveis às ações criminosas. Neste período de pandemia, eu pude presenciar vários assaltos em plena luz do dia e durante a noite. Os criminosos estavam de máscaras e bonés”, disse.

Para a microempresária Elessandra da Silva, 22, do ramo de padaria, serviço essencial mantido pela medida de restrições, disse que o isolamento social tem custos diretos e indiretos, com impactos nas vendas.

“Após o decreto para cumprir a quarentena, as vendas caíram bastante e depois ficaram estáveis. Isso por que, muitas pessoas não estão cumprindo o isolamento social e nem usando máscaras. Para agravar, os suprimentos subiram de preços e as pessoas estão se aproveitando. No mesmo dia, com horários alternados, a saca de trigo pela manhã estava ao custo de R$ 137. Já pela tarde, o preço tinha sido elevado para R$ 145”, explicou.

Elessandra ressalta, ainda, que a alta taxa de criminalidade tem forçado a tomar algumas medidas para evitar assaltos. Segundo ela, a criminalidade prejudicou os lucros.

“Quem também se aproveita dessa medida são os bandidos. Se sem máscara não sabemos quem é bandido, imagina quando está com o equipamento individual? Infelizmente, estou tendo que fechar o estabelecimento mais cedo por conta da taxa alta de crimes. Ainda não fui alvo de assaltos graças a Deus, mas já presenciei os bandidos com máscaras durante suas ações”, finalizou.

Quem também concorda com as restrições é o microempresário Josino Rocha, 40, que atua há oito anos no ramo de condução escolar. De acordo com ele, manter o isolamento social contra a Covid-19 é fundamental, mas a economia tem sido prejudicada, principalmente para quem necessita sobreviver de renda informal.

“No meu ponto de vista, as restrições determinadas em decreto pelo governador são válidas para prevenir a doença, após o número de aumento de pessoas infectadas por conta da Covid-19. O meu trabalho foi afetado e, por conta disso, estou usando os recursos que estavam sendo mantidos para pagar a parcela do veículo e taxas do Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), já que tive o acesso emergencial negado pela Caixa Econômica Federal. Paralelo a isso, os criminosos estão se aproveitando para cometer crimes. É necessário manter o policiamento nas ruas para coibir os crimes”, declarou Josino Rocha.

Homicídios

Durante a quarentena, houve aumento no número de homicídios (Foto: Josemar Antunes/Amazonas1)

Apesar do distanciamento social, o número de crimes contra a vida já contabiliza 116 casos, em 62 dias com a quarentena. Em janeiro deste ano, o levantamento feito pelo Amazonas 1 apontou 117 crimes letais intencionais. Os dados se baseiam nos relatórios apurados pela reportagem diariamente no Instituto Médico Legal (IML).

Considerado como o mês mais violento de 2020, os crimes como homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e roubo seguido de morte, conhecido também como latrocínio, teve um aumento de 60% em comparação a janeiro de 2019, quando foram registradas 73 mortes violentas.

Conforme os dados obtidos pelo Amazonas1 junto à Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS), parte dos assassinatos pode estar ligada à guerra entre facções criminosas rivais, que disputam territórios pelo controle do tráfico de drogas.

Nessa briga pelo poder entre as organizações criminosas Família do Norte (FDN) e Comando Vermelho (CV), o bairro Compensa, na Zona Oeste de Manaus, palco de recentes derramamentos de sangue, registrou 17 mortes neste período de pandemia. As vítimas foram assassinadas por arma de fogo e arma branca.

O último caso registrado no bairro Compensa foi a morte de Kevin Pedrosa Alves, 23, na rua Pedro Elisário. O crime ocorreu por volta das 20h, de terça-feira, 11, após a vítima ser surpreendida por ocupantes de um carro branco, de placa não reconhecida. Kevin foi atingido por 12 tiros de calibre ponto 40.

Para aumentar a estatística de homicídios, Charlesson Freitas da Silva, 28, foi assassinado a tiros na comunidade Nova Canaã, em Novo Airão (distante 115 quilômetros da capital). O aconteceu fato na tarde de segunda-feira, 11, por volta das 15h.

Segundo familiares, a polícia foi acionada, mas como houve demora, eles decidiram levar o corpo para Manaus, em uma embarcação de pequeno porte. A remoção do corpo ocorreu na manhã desta terça-feira, 12, na rua Beira Rio, no bairro Compensa, zona Oeste.

Rafael e Kimberly Karen em passeio juntos (Foto: Reprodução/Facebook)

Outro crime ocorreu no início da madrugada desta terça-feira, 12, na avenida Joaquim Nabuco, no bairro Centro, na Zona Sul de Manaus. A estudante Kimberly Karen Mota de Oliveira, 22, foi encontrada morta com facadas no pescoço e abdômen, dentro do apartamento do namorado, identificado como Rafael Fernandes Rodrigues, 31.

À polícia, os familiares informaram que a jovem estava desaparecida desde o último domingo, 10. Kimberly Karen, que é natural de Manicoré (distante 332 quilômetros de Manaus), venceu o concurso de Miss Manicoré em 2019 e foi finalista no Miss Amazonas.

Segundo a equipe da DEHS, o namorado da vítima é servidor do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região – Amazonas e Roraima (TRT11) desde outubro de 2017. Ele está foragido e é considerado como principal suspeito do crime. As investigações apontam, ainda, que Rafael já havia solicitado transferência para outra unidade da federação.

Criminosos com máscaras

Ao mesmo tempo que o número de homicídios cresce, os criminosos procuram endossar o aumento da violência urbana na capital e no interior do Amazonas. Com o uso de máscara obrigatório para evitar o contágio da Covid-19, os bandidos encontraram um jeito para se adaptar a essa nova realidade.

Um dos suspeitos trajava farda da secretaria de obras do município (Foto: Reprodução)

Com o novo método criminoso, dois casos recentes foram registrados pela polícia. Em Manaus, uma casa lotérica situada na rua Lê Bon Marchê, no bairro Dom Pedro, na zona Centro-Oeste, foi assaltada por dois homens armados, que usavam máscaras.

Rafael confessou que participou do roubo à casa lotérica (Foto: Reprodução)

O assalto ocorreu no dia 20 de abril deste ano, e toda a ação foi filmada pelas câmeras de segurança do local. Três dias depois do roubo, Rafael Santos da Silva, 24, que aparece nas imagens trajando uma farda de agente de obras municipal, foi preso pela equipe da Força Tática.

O segundo homem envolvido no roubo ainda não foi preso (Foto: Reprodução)

O suspeito foi localizado após denúncia anônima na rua Aramita (antiga rua 8), comunidade Mundo Novo, bairro Flores, Zona Centro-Sul de Manaus. Com Rafael, os policiais militares apreenderam um revólver calibre 38, contendo seis munições intactas.

Em depoimento no 6º Distrito Integrado de Polícia (DIP), Rafael confessou sua participação no crime. O segundo homem, ainda não identificado, envolvido no roubo ainda está sendo procurado pela polícia.

Também com máscaras de prevenção contra o novo coronavírus, dois homens, ainda não identificados, assaltaram um supermercado no dia 6 de maio deste ano, em Coari (distante 363 quilômetros de Manaus). Toda a ação foi gravada por várias câmeras de segurança do estabelecimento.

Os criminosos usavam máscaras de proteção contra a Covid-19 (Foto: Reprodução)

Conforme as imagens, os criminosos entram no supermercado, por volta de 12h, e rendem as funcionárias dos caixas. Sob ameaças de uma arma de fogo, elas foram obrigadas a entregar toda a renda das vendas. Antes da fuga, os assaltantes ainda levaram celulares das funcionárias e de alguns clientes.

A Polícia Militar foi acionada, mas nenhum dos suspeitos foi localizado durante as buscas. O assalto gerou um prejuízo de quase R$ 2 mil. O caso foi registrado na Delegacia Interativa de Polícia (DIP), que está investigando a ação criminosa.

Balanço

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP-AM), Manaus registrou redução no número de casos de homicídios, latrocínios, roubos, estupros e lesão corporal seguida de morte, no ano passado. O balanço foi apresentado pelo governador Wilson Lima, no dia 17 de janeiro deste ano.

Em seu discurso, o chefe do Executivo do Estado atribuiu queda nos seis indicadores, a presença da polícia nas ruas para combater a criminalidade, inclusive nas áreas consideradas vermelhas, além de novas operações, sendo uma delas: “Polícia sem Rosto”.

Na oportunidade, o governador aproveitou para destacar que as forças de segurança têm feito um trabalho intenso. Para fortalecer as ações contra a criminalidade, foram liberados R$ 41 milhões em novos equipamentos no ano de 2020. O investimento é oriundo de recursos próprios do Governo do Estado, de parcerias com o governo federal e emenda parlamentar.

Com a pandemia, foram registradas 296 ocorrências de roubo em março deste ano. Os indicadores , no entanto, dos meses de abril e maio, ainda não foram computados pela SSP-AM.

O Amazonas1 solicitou do órgão de Segurança Pública os índices da criminalidade para complemento da reportagem. Por e-mail, a assessoria de comunicação informou que aguarda os resultados do setor de estatística.