Manaus, 28 de março de 2024
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Manaus, 28 de março de 2024

Política

Mais de 60% do orçamento da SEC é gasto com Agência Cultural e festas

Governador Wilson Lima afirmou que orçamento da Secretaria acabou em junho e avalia a possibilidade de extinguir a pasta e anexá-la à de Educação

Mais de 60% do orçamento da SEC é gasto com Agência Cultural e festas

Secretaria de Cultura corre o risco de ser extinta como pasta e ser anexada à de Educação (Foto: Divulgação)

Na semana passada, o governador Wilson Lima (PSC) externou o desejo de extinguir a Secretaria de Cultura (SEC) e torná-la um braço da Secretaria de Estado da Educação (Seduc), sob a alegação de que a pasta não tem mais recursos para se manter, tendo, inclusive, estourado o orçamento de R$ 100,8 milhões em junho passado. A fusão da pasta era uma das propostas a ser inserida no projeto de reforma administrativa que o governo ensaia realizar, desde o primeiro semestre deste ano.

O discurso de Lima traz vários questionamentos: como que a pasta – que teve um incremento de 22,6% de seu orçamento este ano em relação a 2018 – está sem recursos neste segundo semestre e, em quê gastou mais de R$ 100 milhões em apenas seis meses?

O Amazonas1 buscou a resposta no Portal da Transparência do Estado. Conforme o documento oficial, a SEC está operando no vermelho, com gastos, entre contratos empenhados, liquidados e pagos, no total de R$ 112,6 milhões.

Além disso, mais de 40% de seu orçamento foi direto para as contas da Agência Amazonense de Desenvolvimento Cultural (AADC), entidade que presta serviço à Secretaria de Cultura no apoio à execução de políticas de desenvolvimento cultural, com contratos sem licitação.

Em oito meses, a AADC recebeu R$ 45,4 milhões do governo do Estado por meio da SEC, em contratos diversos, conforme apurado no Portal da Transparência, se destacando como a principal credora da Secretaria.

A Agência, inclusive, é alvo de investigação do Tribunal de Contas do Estado (TCE), instaurada no ano passado, por ter recebido R$ 37 milhões do governo no primeiro semestre de 2018, na gestão do então governador Amazonino Mendes (PDT).

Antes, disso, porém, os contratos da AADC com a SEC chamaram a atenção do Ministério Público de Contas (MPC-AM), que passou a investigar a agência por ilegalidades em contratos fechados com a própria SEC, na administração do ex-secretário Robério Braga.

Festas temáticas

Outras despesas da Secretaria de Cultura que chamam a atenção – mas que nada têm a ver com a essência da pasta – são os gastos milionários com festas temáticas na capital e no interior do Amazonas, a exemplo de festas de aniversários de municípios, festivais folclóricos, festejos religiosos e o Carnaval.

De janeiro até 4 de setembro deste ano, a Secretaria pagou R$ 20,3 milhões nessas festas, o equivalente a 20% de seu orçamento 2019. Os dados podem ser conferidos no Portal da Transparência.

Os municípios, associações e entidades culturais que receberam verbas para bancar suas festas foram: Parintins, Itacoatiara, Humaitá, Urucurituba, Distrito da Foz do Canumã (Borba), Presidente Figueiredo, Vila de Lindóia (Itacoatiara), Maués, Novo Airão, Autazes, Tonantins, São Gabriel da Cachoeira, Manacapuru, Tabatinga, Lábrea, Rio Preto da Eva, Manaus, além de agremiações carnavalescas, folclóricas, de cirandas e os bumbás Garantido e Caprichoso.

O município que mais recebeu recursos da SEC foi Parintins, num total de R$ 3,7 milhões, para financiar festas no período do Carnaval, do festival dos bois bumbás e o festejo religioso da cidade.

Insatisfação

O volume dessas despesas revela a insatisfação de artistas e produtores culturais do Estado com relação à política de distribuição de recursos, adotada, atualmente, pelo governo do Amazonas.

E essa insatisfação foi externada pelo escritor Márcio Souza na semana passada, quando chegou a pedir ao governador Wilson Lima que não deixe mais seus secretários “financiarem” prefeitos do interior com verbas que serão investidas em “besteiras” e no pagamento de valores milionários de cachês de artistas de fora.

SEC responde

A reportagem procurou o secretário de Cultura, Marcos Apolo, para comentar o cenário sombrio da pasta, a falta de recursos e para explicar esses gastos.

Por meio de nota enviada pela assessoria de comunicação, ele respondeu que a pasta tem adotado medidas de redução nos gastos públicos e procurado meios para enfrentar a crise econômica que atravessa.

Sobre o pagamento de salários dos servidores, a nota afirma que até o fim do ano já está provisionado na Lei Orçamentária, portanto, “assegurado”. De janeiro até agosto deste ano, a folha de pagamento da SEC consumiu R$ 9,4 milhões do orçamento da pasta.

Sobre a AADC, a nota esclarece que a entidade foi instituída como serviço social autônomo como pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos e atua como suporte aos mais variados projetos culturais e artísticos, como exposições, exibição de produções audiovisuais, apresentações de música, dança e teatro, além de grandes eventos.

A nota reforça ainda que o orçamento atual também está sendo empregado para liquidar contas do exercício anterior que não foram quitadas e “que estão sendo tratadas com muita seriedade pela Secretaria”.

Ressalta também que a secretaria tem realizado uma extensa programação, voltada para a difusão cultural na capital e no interior, sendo realizadas até o momento cerca de 1,2 mil atividades nos mais diversos espaços culturais administrados pela pasta.

Ainda na nota, a Secretaria de Cultura informa que está se estruturando para lançar um edital de fomento em breve, “por entender a importância, inclusive econômica, das produções artísticas, motivo pelo qual apoia grandes eventos que movimentam a capital e os municípios, atraindo turistas e gerando trabalho, a exemplo do Carnaval e festivais folclóricos, como citado no questionamento”.