Manaus, 24 de abril de 2024
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Manaus, 24 de abril de 2024

Cultura

Artistas de Parintins relatam dificuldades em meio à pandemia

Com a possível não realização do Festival Folclórico de Parintins, pelo segundo ano, artistas parintinenses encontram novas maneiras de conseguir uma renda em meio às dificuldades da pandemia

Artistas de Parintins relatam dificuldades em meio à pandemia

Foto: Divulgação

MANAUS – O Festival Folclórico de Parintins é uma das principais atividades econômicas na Ilha Tupinambarana. Com o evento, centenas de famílias garantem uma renda, que pode ser extra ou anual. Devido à pandemia do novo coronavírus, a festa não pôde ser realizada no ano de 2020, e com o atual cenário do Brasil, e a demora para ocorrer uma vacinação em massa, o espetáculo pode ser adiado novamente. Dessa forma, artistas que dependem do Festival para sobreviver ficariam sem obter um lucro, dificultando, assim, a sobrevivência.

Um dos artistas que foram afetados com o adiamento do Festival foi Edh Soares, 48. Os serviços prestados por ele são para ambos os bumbás, Garantido e Caprichoso. Ele conta que, no ano passado, houve dificuldades para conseguir dinheiro, e que este ano acredita que continuará enfrentando esse problema. “Tive que vender meu carro para pagar as contas, mas o dinheiro da venda já está acabando”, relata.

O artista plástico trabalha com esculturas dos bois de Parintins, e conta que, no momento, não há busca pelas peças, mas que o dinheiro que consegue com algumas vendas é o que é utilizado para a alimentação. Para sobreviver, Edh é beneficiado pelo auxílio da Agência de Fomento do Estado do Amazonas (Afeam).

 

Foto: Miniaturas do Boi Caprichoso feitas por Edh Soares

Antes da pandemia, Edh era membro da equipe que esculpia o boi para evolução nos três dias de evento. Ele conta que realizava as pinturas do bumbá durante 10 anos. Além de estar impossibilitado de vender seus itens, o artista também não pode realizar o seu projeto social pelo Brasil, que tem como objetivo levar o boi-bumbá de Parintins para outras cidades do território brasileiro. ” Convidaram-me para levar o Boi Caprichosinho para um garoto com uma doença, até agora sem cura. Ele conhecia o Festival apenas pela internet. Também participo de campanhas de doação de sangue e levo o boi para crianças em abrigos”, comentou.

Com o cenário da pandemia, Edh acredita que seja impossível realizar o evento este ano. Por enquanto, ele está produzindo as miniaturas dos bois pare comercializar em um próximo Festival. Enquanto não há espetáculo, o artista faz encomenda dois boizinhos por meio do seu Instagram (@edhsoares).

Outro artista que está enfrentando dificuldades neste período é o Makoy Cardoso, 41. O trabalhador está se reinventando para obter uma renda e garantir o seu sustento. Ele explica que sobrevive dos festivais da Região Norte, além da festa em Parintins, ele confecciona nos espetáculos de Juruti, Santarém, Nova Olinda, Barreirinha, entre outros.

“Em 2020, tive muita dificuldades na minha área, mas sempre tentando me reinventar e dando um jeito. Nesse período, produzimos no atelier, de forma artesanal, máscaras, viseiras de acetato e capotes pra [sic]  vendermos para os supermercados, lojas e feirantes de Parintins”, contou.

Makoy ainda afirma que o mês de junho, época em que ocorre o espetáculo, foi um momento triste e de problemas financeiros. “Estávamos sem perspectiva alguma, pois não havia esperança na nossa classe”, relatou.

O artista afirma que gostaria que todos já estivessem vacinados, para que assim o Festival pudesse ser realizado. “É a nossa vida, é a indústria que movimenta a nossa ilha, mas, no momento, eu vejo que em 2021 será difícil novamente”, disse.

Foto: Alegoria confeccionada por Makoy Cardoso e equipe

Artista do Boi Caprichoso, Makoy produz cocares de penas e cocares de fio emoldurados para enfeites de ambientes, em parceria com alguns arquitetos de Manaus e do município de Parintins, além de fazer encomendas de artesanatos, fantasias e acessórios por meio do seu Instagram (@ateliemakoycardoso).

Sem a realização do Festival, o trabalhador comenta que o público pode esperar as melhores inovações do seu trabalho no retorno da temporada da grande festa, tanto em indumentárias, quanto em alegorias. “Só peço a Nossa Senhora do Carmo que nos proteja e que logo possamos voltar a fazer o que mais amamos”, completou.

Foto: Cocar feito pelo artista Makoy Cardoso

Artistas em Manaus

Na capital amazonense, o diretor artístico da Raça Azul, Leonam Pimentel, 30, conta sobre os esforços para trabalhar durante o isolamento social. Ele comenta que contraiu o novo coronavírus e isso ocasionou uma maior dificuldade para conseguir ganhar dinheiro e manter as contas em dia. Formado em artes visuais pela Universidade Federal do Amazonas, Leonam afirma que, durante o isolamento, estuda novas propostas para executar na arquibancada do bumbódromo.

“Estou sobrevivendo em meio a esse caos, mas, tenho fé que tudo vai passar. Vou continuar trabalhando com minhas pinturas artísticas e residenciais”, explicou. Leonam ainda pontua que é necessário uma vacinação em massa para o retorno do Festival de Parintins. “A nossa cultura é conhecida mundialmente, então, temos que esperar todos serem imunizados para retornarmos às atividades!”, afirmou.

Foto: Pintura em residência

Conexão Parintins-São Paulo

A renda do artista Fabson Rodriguez, 28, tem ganhos no Festival de Parintins e no Carnaval de São Paulo. “São duas rendas fundamentais na minha vida, até porque o mundo em que eu vivo é o mundo em que eu trabalho, é o mundo artístico. O dinheiro das contratações é importantes na minha vida financeira e também da minha família”, comentou.

Após realizar trabalhos no Carnaval de São Paulo 2020, Fabson retornou para Parintins com o objetivo de iniciar os projetos para a arena do bumbódromo, quando o alerta de pandemia foi divulgado. “Na minha cabeça, eu achei que fosse algo passageiro, mas só foi piorando cada vez mais. Consegui ganhar um dinheiro com as lives que eram realizadas, com customização de blusas, máscaras personalizadas, mas foi bem difícil, ficamos bem apertados e sem dinheiro”, relatou.

O artista comenta que ficou triste com a não realização do evento durante o mês de junho, e foi algo difícil de vivenciar. “Não afeta só os artistas, mas uma população inteira. É algo que movimenta a cidade e que contribui financeiramente para toda a população!”, explicou. Ele ainda afirma que apesar da saudade, os amantes do espetáculo devem aceitar o cenário de pandemia e que não é tempo para comemorar, mas sim para de união, para vencer o vírus.

Atualmente, o artista está em São Paulo realizando projetos para um futuro Carnaval. Ele conta que, mesmo sem uma data definida, a escola de samba Mocidade Alegre, para qual presta serviço, trabalha no enredo que foi definido. “O Carnaval foi algo que me ajudou muito durante esse período, mas estamos fazendo as coisas aos poucos”, disse. Ele ainda explica que a agremiação trabalha com equipe reduzida, além de receber metade do salário, mas acredita que seja melhor do que estar sem lucro.

Foto: Componente da escola de samba de São Paulo usando fantasia confeccionada por Fabson Rodriguez

O artista ainda comenta que alguns parintinenses que foram à capital paulista para trabalhar no Carnaval 2021, que, até então, iria ocorrer em julho, tiveram que voltar para o município do Amazonas, pois não teriam condições de se manter em São Paulo com metade de um salário.

Ainda de acordo com ele, os artistas conseguiram sobreviver por meio do benefício da Lei Aldir Blanc, que prevê um auxílio emergencial aos trabalhadores da cultura.

“Acredito que se metade da população brasileira estivesse vacinada, as coisas já teriam voltado ao normal”, comentou. Para ele, o retorno do Festival de Parintins deve ser grandioso e marcante. “Todos estão na expectativa de que as coisas melhorem, e precisamos acreditar que dias melhores estão por vir. Essa vacina veio para fazer com que a nossa vida volte ao normal e para ter a nossa festa de volta”, disse.

Foto: Daniel Brandão

Para a volta do espetáculo, Fabson afirma que o público pode esperar pelo seu melhor. “Vou apresentar coisas maravilhosas e marcantes. Tenho projetos e ideias maravilhosas para o Boi Caprichoso dar um show na arena do bumbódromo”, finaliza.