Manaus, 19 de abril de 2024
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Manaus, 19 de abril de 2024

Com poucas sessões plenárias, deputados do AM ‘descansam’ 25 dias a mais que trabalhador comum

Com poucas sessões plenárias, deputados do AM ‘descansam’ 25 dias a mais que trabalhador comum

Manaus/AM – As sessões plenárias na Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) ocorrem somente três vezes na semana: às terças, quartas e quintas-feiras. E, mesmo não exercendo trabalhos legislativos – votações e discussões sobre propostas de leis – a semana inteira, os 24 deputados possuem 55 dias de férias ou recesso ao longo do ano.

A quantidade representa 25 dias a mais que o período de férias de um trabalhador comum, segundo a Constituição Federal. Pelo decreto legislativo 1.535, de 15 de abril de 1977, todo empregado tem direito a 30 dias de férias, sem prejuízo da remuneração.

Os 55 dias de ‘descanso’ dos parlamentares são divididos em dois períodos: 15 dias no meio do ano e 40 dias no final do ano.

No início do ano, por conta da pandemia de covid-19, os parlamentares aprovaram um requerimento que suspendeu o recesso de final do ano de 2020, em razão das atividades já estarem suspensas desde dezembro. Com essa suspensão, os parlamentares já não estavam mais tendo sessões plenárias.

Recentemente, o deputado Belarmino Lins (PP) apresentou na Aleam uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para redução do recesso parlamentar de fim de ano para 30 dias. Se aprovada, deverá mudar a redação do caput do artigo 29 da Constituição Estadual vigorando com o seguinte texto: “Aleam se reunirá, anualmente, na Capital do Estado, de 1° de fevereiro a 31 de dezembro”. 

Absurdo

A diferença entre esse ‘privilégio’ dos deputados e o direito do trabalhador comum causa indignação em alguns amazonenses, como é o caso do professor Raimundo Araújo, de 54 anos. Segundo ele, o período de recesso dos políticos é um ‘absurdo’.

“É um absurdo, uma imoralidade legalizada. Deveriam ter seus proventos baseados na produtividade do mandato ou receber apenas pelos dias trabalhados tendo como parâmetro o salário mínimo vigente no País”, disse.

A revisora de textos, Elen Silveira, 26 anos, considerou ‘vergonhoso’ e revoltante o quanto os políticos do Brasil possuem privilégios, enquanto outros trabalhadores enfrentam muitas dificuldades.

“Os políticos têm muitos privilégios, a meu ver, exorbitantes. Um trabalhador comum não possui nem mesmo um terço disso. Isso, porém, é reflexo de uma Justiça fraca para com os poderosos – chega a revoltar o trabalhador. Um professor, por exemplo, que é bem mais atuante e necessário para a sociedade, ganha pouco e estuda muito – bons docentes são profissionais que não se acomodam e não são reconhecidos como deveriam, assim como muitos outros profissionais. Chega a ser vergonhoso para o nosso país, pois muitos políticos, além de sempre gozarem de muitos privilégios, não apresentam solução para muitos problemas que os cidadãos enfrentam, principalmente em áreas da periferia”, disse.

Recesso ou férias?

De acordo com o advogado e cientista político, Carlos Santiago, é importante destacar que os deputados estaduais não tiram férias, mas sim recesso, visto que o Poder Legislativo não pode fechar as portas.

“O recesso parlamentar é diferente das férias. O recesso é o seguinte: a sede do Poder Legislativo no Amazonas é a Assembleia, então, o Poder, ele não fecha, ele não entra de férias, ele tem o recesso, que é a atividade de Plenário e nessa atividade se tem análise das propostas, apresentação de propostas, aprovação ou não. Só que quando entra no recesso, isso não funciona mais, não funciona mais a apresentação de proposta, a análise de propostas, rejeição ou aprovação”, explicou o especialista.

Santiago também não concorda com a grande quantidade de dias para os deputados ficarem de recesso. Para ele, os deputados trabalham pouco e ganham muito, o que é desproporcional.

“Os Poderes da República, os benefícios, os salários e os privilégios dos membros da cúpula dos Poderes da República são enormes. Os privilégios custam caro ao contribuinte. Então, cabe a esses privilegiados, trabalharem mais em prol daqueles que pagam os seus salários, como por exemplo, os deputados que precisam trabalhar muito mais do que trabalham hoje. São bem remunerados e possuem muitas regalias”, criticou.

Sobre a proposta de Belarmino, o especialista considerou bem-vinda, uma vez que, segundo ele, o Poder Legislativo não pode ficar sem atividades, principalmente neste período de pandemia.  

“A proposta do deputado Belarmino Lins, da Assembleia Legislativa do Amazonas, é bem-vinda, até porque, em tempos de pandemia, no momento em que o Amazonas passa pela pior tragédia da sua história com milhares de mortos e outros milhares de pessoas sequeladas, o Poder Legislativo Estadual não pode ficar sem atividade plenária. Não pode ter 45 dias sem atividade no Plenário, sem análise de propostas legislativas e sem votação. A maioria dos brasileiros somente tem 30 dias de repouso, é um absurdo, então, que seus representantes fiquem 45 dias de recesso. Isso é um absurdo”, disse.

Dias necessários

Por outro lado, para o sociólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Luiz Antônio Nascimento, o trabalho de um parlamentar não pode ser comparado com os de um trabalhador comum, pois são ofícios bem distintos.

“O trabalho do parlamentar não pode ser comparado com o trabalho rotineiro, ordinário, dos trabalhadores brasileiros, porque ele está ali cumprindo um mandato da sociedade brasileira, mandato eletivo que tem 4 anos e que tem duas funções principais: formular leis e fiscalizar o cumprimento da lei”, defendeu.

Nascimento explicou, ainda, que, embora as sessões plenárias sejam apenas nas terças, quartas e quintas, os parlamentares também exercem outras atividades nas segundas e sextas-feiras. Ou seja, segundo ele, o trabalho do deputado não pode ser resumido apenas nesses três dias de Plenário.

“Tem duas coisas que me parece ser importante distinguir. Uma delas é: alguém teve uma jornada de trabalho anual de tanto, e essa pessoa tem o direito de ter férias para descansar fisicamente, para estar com a família e etc, isso é imprescindível. Uma outra coisa que é igualmente importante é: esse parlamentar que tem uma jornada de trabalho no parlamento, que não se confunde com a jornada de trabalho no Plenário. Um deputado, quando não está em Plenário, quando não está lá terça, quarta, quinta em Plenário, não significa que não esteja trabalhando. Ele pode estar fazendo inúmeras coisas […] O trabalho não pode ser reduzido ao tempo em que ele está no gabinete”, disse o especialista.

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