Manaus, 25 de abril de 2024
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Manaus, 25 de abril de 2024

Cidades

Crescem casos de violência infantil durante a pandemia no AM

Desde o começo da pandemia, o Conselho Tutelar da zona Sul de Manaus atendeu em torno de 150 a 200 ocorrências de violência infantil

Crescem casos de violência infantil durante a pandemia no AM

Foto: Reprodução

MANAUS, AM – Com o isolamento social, os casos de violência aumentaram em Manaus. Um exemplo disso são os de violência contra a mulher, que fechou o ano de 2020 com mais de 20 mil casos registrados. O número foi maior que as ocorrências de 2019, quando a capital amazonense registrou 17 mil ocorrências do tipo, conforme os dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP-AM). Levando em consideração esse crescente, os atos de violência infantil também apresentaram aumento durante o distanciamento social.

O presidente do Departamento Científico de Segurança da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Marco Gama, apontou que, assim como a violência doméstica, as agressões infantis cresceram nesse período.

“As agressões aumentaram durante a pandemia e as chances de defesa das crianças diminuíram”, destacou o presidente em entrevista à Agência Brasil.

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O conselheiro tutelar, Ítalo Mendes, afirma que a pandemia agrava o cenário de alguns crimes cometidos contra crianças. Devido ao isolamento social, a vítima não tem como pedir ajuda, de vizinhos, professores ou colegas de sala.

“Por exemplo, o abuso sexual de crianças, comumente, parte de pessoas que convivem diariamente com a criança ou com o adolescente. Imagina quando o abusador fica 24 horas com a criança, visto que a mesma não tem ido à escola”, comentou.

Antes do distanciamento social, alguns casos eram denunciados pela comunidade escolar. “As escolas não têm repassado tantas denúncias, pois o ensino ainda continua de maneira on-line por conta da pandemia”, disse o conselheiro.

Atuação do Conselho Tutelar

O conselheiro atende os bairros da zona Sul de Manaus, são eles: Santa Luzia, Morro da Liberdade, Betânia, São Lázaro, Educandos, Presidente Vargas, Aparecida, Centro, Lagoa Verde e Crespo.

“Cerca de 110 casos foram registrados oficialmente. Atendemos casos demandados em unidades de saúde e delegacias. O Conselho faz a investigação do problema e, necessariamente, não registra o caso. Atendemos em torno de 150 a 200 ocorrências desde o começo do isolamento social”, explicou.

Segundo ele, as denúncias são atendidas conforme a natureza dos casos. “Os crimes são direcionados para a delegacia. Negligências podem ser atendidas pelo Conselho Tutelar e aplicada as medidas de proteção mais convenientes a cada caso. Tem também os casos que envolvem guarda e alimentos, que orientamos ou encaminhamos à Defensoria Pública”, relatou.

Relatos nas escolas

A professora Séfora Almeida, 55, afirmou que já aconteceram casos em sala de aula em que alunos relataram as agressões. A descoberta ocorreu durante uma atividade relacionada à violência e abuso infantil. Na ocasião, a professora escutou o que os alunos pensavam sobre o assunto. Segundo a professora, nesse meio tempo, uma aluna contou à colega de classe o que ocorria dentro da própria casa.

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“Descobri que a mesma mão que afaga e dá carinho, é a mesma que bate e abusa. Eles não compreendem a diferença, porém, uma das alunas tinha conversado com outra criança, que veio me contar no dia seguinte”, comentou a educadora.

“Professora a …. (aluna abusada) disse que veio do interior do Amazonas por causa do tio que alisava ela. Quando falou para os pais, ela apanhou porque acharam que ela estava inventando”, continuou.

Imediatamente, ela decidiu denunciar o caso. A educadora ainda contou que a criança que sofria os abusos tinha comportamento agressivo e dificuldade na aprendizagem.

“O professor nessa situação interfere. É preciso estimular a criança a não se calar e denunciar para que as autoridades possam ser acionadas”, disse.

Análise do psicólogo

A psicóloga Aline Padilha afirma que é possível observar os sinais que crianças e adolescentes apresentam quando estão sofrendo violência.

“Mudanças repentinas de comportamento, proximidade excessiva com pessoas ou comportamentos infantis repentinos. Outro sinal é um silêncio predominante, quando a criança começa a ficar mais silenciosa”, contou.

“A queda do rendimento escolar também é outro sinal. Há também comportamentos sexuais, ou seja, as vítimas de abusos começam a apresentar atos obscenos. Do mesmo modo, quando a criança não consegue dizer o que acontece, aparecem enfermidades como vômito, dor de cabeça, erupções na pele, entre outros. São sinais que os pais devem ficar em alerta”, explicou.

Segundo a profissional, o acompanhamento psicológico é a melhor solução para esses casos de violência infantil.

“Às vezes, devido ao abusador estar no meio familiar ou de amigos, a criança não se sente segura. Então, é preciso procurar um profissional para que seja possível ajudar a vítima, assim que apresentar os primeiros sinais”, comentou.

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A psicóloga ainda comenta que houve casos em que os pais não sabiam da violência e, a partir do acompanhamento psicológico, imediatamente, o problema foi identificado.

“Em alguns casos pode ser bullying, ou agressões no meio familiar ou na escola. Há casos que, quando apresentado o diagnóstico para os pais, as crianças não voltam para continuar o acompanhamento”, afirmou.

“Crianças que sofrem algum tipo de abuso, seja físico ou psicológico, na maioria das vezes elas sofrem no núcleo familiar essa violência infantil. Acredito que exista uma dificuldade para os pais ou responsáveis levarem o filho para o acompanhamento psicológico”, relatou.

Ela ainda destacou que o trabalho do profissional é mais recorrente quando os pais estão lidando com processo judicial. Porém, a psicóloga ainda ressalta que é necessário realizar trabalhos educativos para identificar quando a criança necessita de acompanhamento psicológico.

Disque-denúncia

Em casos de maus-tratos e negligência a crianças ou adolescentes, as denúncias devem ser feitas ao Conselho Tutelar. As ocorrências também são atendidas pela polícia, além do Ministério Público. Os números para contato são: Disque 100, para ocorrências nacionais; Disque 181, para casos estaduais, e Disque 156, em municípios.

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