BRASIL – A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), entendeu que é “imprescindível” investigar todos os possíveis envolvidos no “gabinete paralelo” do Ministério da Educação (MEC), incluindo o presidente Jair Bolsonaro (PL). Assim, Cármen Lúcia estipulou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) tem 15 dias para se manifestar a respeito dos próximos passos para analisar a conduta do presidente.
Segundo a ministra, “a gravidade dos fatos” que levaram a abertura de inquéritos “tem-se por imprescindível a investigação conjunta de todos os envolvidos e não somente do Ministro de Estado da Educação”.
Além disso, na análise do STF, as ações de Milton Ribeiro, ministro do MEC, “estão intimamente conexos com a sua própria fala sobre a eventual participação de Jair Messias Bolsonaro, presidente da República”.
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O despacho é baseado em três notícias-crime contra Milton Ribeiro.
Mais cedo, Cármen Lúcia determinou a abertura de um inquérito para investigar Milton Ribeiro, em decisão que atende a um pedido da PGR para apurar as suspeitas dos crimes de corrupção passiva, advocacia administrativa e tráfico de influência.
Bolsonaro “bota cara no fogo” por Ribeiro
Hoje à noite, Bolsonaro falou pela primeira vez publicamente sobre o assunto, chamando a reação contra o ministro “uma covardia”. “O Milton, coisa rara eu falar aqui, eu boto a minha cara no fogo pelo Milton. Minha cara toda no fogo pelo Milton”, disse em sua transmissão ao vivo semanal.
O posicionamento ocorre em meio a suspeitas levantadas com a divulgação de um áudio, no qual Ribeiro afirma que o governo federal prioriza prefeituras ligadas a dois pastores. O áudio foi revelado pela Folha de S. Paulo.
O conteúdo do áudio
Na gravação, Ribeiro fala dos pastores evangélicos Gilmar Silva dos Santos e Arilton Moura Correia. “Foi um pedido especial que o Presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, diz o ministro no áudio obtido pela Folha de S. Paulo. Sem cargos, eles atuam em um esquema informal de obtenção de verbas do MEC (Ministério da Educação).

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Na conversa, participaram prefeitos, os dois religiosos e lideranças do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). Na reunião, que aconteceu dentro do MEC, o ministro falou sobre o orçamento da pasta, cortes na educação, e ainda sobre a liberação de recursos para essas obras.
“Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, diz o ministro.
Para isso, porém, Milton Ribeiro fala em uma contrapartida: “então o apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção das igrejas”. Na gravação obtida pela Folha, porém, o ministro não detalha como isso seria feito.
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De acordo com relatos feitos sob anonimato à Folha por gestores e assessores, os pastores negociam a liberação de recursos às prefeituras em restaurantes e hotéis de Brasília, e depois entram em contato com o ministro. O chefe do MEC, então, determina ao FNDE a oficialização do empenho, reservando o recurso.
Ainda conforme informações do jornal, políticos foram recebidos na casa de Milton Ribeiro fora da agenda oficial. O prefeito de Rosário (MA), Calvet Filho (PSC), gravou um vídeo com o ministro no apartamento dele em Brasília. À reportagem da Folha, ele disse que o encontro foi informal. Ele também negou ter negociado obras com os pastores, tendo conversado com eles apenas “para organizar pregações” na cidade.
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No ano passado, em evento no MEC com os dois pastores, prefeitos conseguiram a liberação de recursos para novas obras. Um deles, da cidade de Anajatuba (MA), que tem 27 mil habitantes, conseguiu seis obras empenhadas. De acordo com a reportagem, a prefeitura sequer comprou os terrenos.
Segundo o prefeito do município Helder Aragão (MDB), ele se encontrou com o pastor Arilton em um hotel da capital federal, mas disse não ter amizade com ele: “Fui até um hotel em Brasília onde tinha vários prefeitos e ele falava que conseguia obra para o FNDE”. Aragão garantiu, porém, que não negociou obras com os pastores nem com pessoas do MEC, e que os empenhos foram garantidos pelos meios corretos.
(*) Com informações do UOL