Manaus, 3 de maio de 2024
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Brasil

Um ano depois, origem do óleo que poluiu o Nordeste continua desconhecida

Em junho de 2020, mais vestígios de óleo foram identificados em algumas praias do litoral nordestino, somando 100 kg coletados, segundo a Marinha do Brasil

Um ano depois, origem do óleo que poluiu o Nordeste continua desconhecida

ARACAJU, SE, 10.10.2019 - Óleo atinge praia do Viral e prejudica pesca em área isolada na cidade de Aracaju (SE); pescadores tentam manter a rotina de trabalho, apesar da contaminação. (Foto: Raul Spinassé/Folhapress)

Entre setembro de 2019 e fevereiro de 2020, foram recolhidas mais de 5 mil toneladas de óleo e resíduos oleosos na faixa litorânea entre os estados do Maranhão e Rio de Janeiro.

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Em junho de 2020, mais vestígios de óleo foram identificados em algumas praias do litoral nordestino, somando 100 kg coletados, segundo a Marinha do Brasil, que centralizou as informações até aqui. Até hoje, no entanto, as autoridades brasileiras não determinaram de onde a substância vazou. Enquanto isso, milhares de famílias de comunidades pesqueiras ainda amargam prejuízos e incertezas.

Uma dessas comunidades é do Jardim, em Fortim, Litoral Leste do Ceará. Duplamente afetada, primeiro pelo óleo, depois pela pandemia da Covid-19. “Ainda sofremos com a rejeição e insegurança por parte das pessoas em consumir os nossos peixes e mariscos, gerando queda na venda e no valor do pescado, provocando uma situação de perda da nossa autonomia financeira, principalmente entre nós, mulheres”.

A afirmação é de Maria Eliane Pereira do Vale, conhecida como Maninha, marisqueira e pescadora há 40 anos, representante da Articulação Nacional das Pescadoras (ANP) e militante do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP).

“Continuamos em uma situação muito difícil nos nossos territórios tradicionais pesqueiros. Estamos há quase um ano do derramamento do petróleo, ou melhor, da maior contaminação e crime nas nossas águas, que consideramos parte de nossas vidas, bem comum e fonte de alimento e renda para nós pescadoras e pescadores.

Estamos passando por momentos ainda mais difíceis nesse cenário de pandemia, que nos coloca em isolamento necessário para nos manter vivos e longe de risco da contaminação da Covid-19, mas, por outro lado, nos impede de vender o fruto de nosso trabalho”, relata.

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Em seu depoimento, Maninha lamenta pelas perdas financeiras, mas preocupa-se também com a saúde física e mental da sua comunidade:

“Vivenciamos uma situação de colapso em minha comunidade e ainda não conseguimos nos recuperar. Estamos preocupados com a saúde das famílias, pois, desde o derramamento do petróleo, continuamos comendo peixes e mariscos pescados nas águas do nosso Rio Jaguaribe e não sabemos se água e pescado estão contaminados, pois até hoje não foi apresentada análise. E digo mais: nosso território foi contaminado e isso não causou danos só ao nosso ecossistema, pois nossa alma, nosso psicológico e nossos corpos adoecem ao vermos a contaminação do nosso território, pois esse lugar é parte nossa”.

Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) está acompanhando, na medida do possível, a situação de comunidades como a de Maninha. “Como os impactos foram muito territorializados, nós começamos um mapeamento simples, tentando quantificar as pessoas atingidas. Mas a pandemia começou e alguns dados ainda não foram consolidados. Conseguimos levantar que aproximadamente 1.000 comunidades costeiras, formadas por pescadores artesanais, foram atingidas, em tempos diferentes, de formas diferentes. Teve comunidades que não tiveram a presença física do óleo, mas suas vidas foram impactadas por esse derramamento”, explica a secretária executiva do CPP, Ornezita Barbosa.

A CPP destaca três categorias de impacto: o ambiental, mais visível, na água, nos ecossistemas, sobre o qual há uma queixa das comunidades pesqueiras sobre falta de informações confiáveis; à saúde, pois muitos pescadores tiveram que se submeter à retirada do óleo naquele momento sem equipamentos de proteção ou orientações sobre descarte adequado; e o econômico.

“Um ano depois do derramamento ainda percebemos esse impacto. As pessoas ainda não se restabeleceram economicamente e ainda está presente a insegurança dos consumidores em relação à ingestão do pescado” finaliza.

 

(*) Com informações do O Eco