Manaus, 24 de abril de 2024
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Cenário

Escolas de samba de Manaus decidem homenagear políticos em ano eleitoral

A história entre política e samba já é bem antiga e em anos eleitorais, os 'padrinhos políticos' são homenageados pelas agremiações

Escolas de samba de Manaus decidem homenagear políticos em ano eleitoral

Foto: Arquivo / Câmara dos Deputados

MANAUS, AM – Com a aproximação de uma das festas mais comemoradas no Brasil, o Carnaval, escolas de samba de Manaus já se preparam para 2022. Entre os preparos carnavalescos, está a escolha do samba-enredo que dará o tom das demais alas e, em Manaus, ao menos duas escolas de samba decidiram homenagear figuras políticas locais. A escola Unidos do Alvorada escolheu Luiz Fernando Nicolau. A mocidade Independente do Coroado elegeu Marcelo Ramos.

Não é de hoje que isso acontece em todo o Brasil, toda vez que estão chegando os anos em que haverá eleições, as escolas recorrem a esses recursos, independentemente se o político está vivo ou a homenagem vai ser a um político já falecido (in memorian).

Prova disso foi quando o município de Coari estava em alta com a produção de gás natural. A agremiação Grande Rio decidiu homenagear a cidade em 2008. Com o enredo “Do Verde de Coari Vem Meu Gás Sapucaí”, a escola ficou em terceiro lugar na época.

E claro que por se tratar de Coari, uma das cidades mais ricas do Amazonas, por conta dos royalties do gás natural, a família Pinheiro não poderia ficar fora e o prefeito, à época, Adail Pinheiro esteve na “Avenida do Samba”. Depois disso, o nome de Adail virou notícia nacionalmente por envolvimento em caso de pedofilia no Amazonas.

No caso do Carnaval de Manaus, em 2022, as agremiações Unidos do Alvorada, na zona Centro-Oeste e a Mocidade Independente do Coroado, na zona Leste da capital, vão homenagear o médico e político morto, Luiz Fernando Nicolau e o deputado federal Marcelo Ramos (PL), respectivamente.

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Unidos do Alvorada

O clã dos Nicolau será representado na avenida, pelos irmãos Ricardo Nicolau (deputado estadual) Hiram Nicolau (ex-vereador) e do gestor do Grupo Samel, Beto Nicolau. Com o samba de enredo “Obu Manaó – O Alvorecer da Cura, sob as Bênçãos do Céu. Anauê, Samel!”, vai narrar a trajetória de Luiz Fernando no Amazonas, tanto como médico quanto político.

O patriarca dos Nicolau, Luiz Fernando, faleceu neste período – um dia após o 1º turno, no dia 16 de novembro, conforme divulgado à época.

Política e samba

A Escola de Samba também já fez homenagem ao clã dos Netos, baseado no conto do Rei Arthur, prestando a homenagem, a Artur Virgílio Filho, pai de Artur Neto. Na época da homenagem, Arthur Neto era prefeito de Manaus. Na apuração final, a Unidos do Alvorada dividiu o vice-campeonato com a Grande Família.

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Mocidade Independente do Coroado

A agremiação decidiu homenagear Marcelo Ramos, por sua trajetória de vida pública, com o tema: “Essa é a sua história. Lutas, conquistas e vitórias… Marcelo Ramos”.

De acordo com a minuta de homenagem, na composição do samba deveriam ter alguns bordões que marcam o político amazonense, que hoje é vice-presidente na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Entre eles: com amor tudo se vence; verde e amarelo ou pavilhão e “Tem Dinheiro Dá Pra Fazer”, mote da campanha política de Marcelo em 2016, quando o parlamentar concorreu à cadeira da Prefeitura de Manaus, chegando ao segundo turno com Arthur Neto, que saiu eleito naquele ano.

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Campanha de 2016 – Prefeitura de Manaus

Contraditório

Enquanto as grandes escolas carnavalescas buscam o “apadrinhamento político” para ganhar mais visibilidade, grupos como a Banda Independente Confraria do Armando, mais conhecida como BICA, satiriza, anualmente, questões políticas do Brasil e do mundo nas letras de suas “marchinhas”, além de usar bonecos gigantes construídos conforme a temática.

Em 2020, a banda teve como marchinha oficial a “Pirralha faz pirraça e a Bica entra na graça”, uma paródia à ativista Greta Thunberg, criticada pelo presidente Jair Bolsonaro. Mesmo com muita polêmica sobre o tema a banda saiu na avenida normalmente, no Centro de Manaus.

Em 2018, a Banda também criticou o troca-troca de governadores, ano em que o Amazonas teve nas mãos de três comandos, entre eles: o de José Melo, de David Almeida e de Amazonino Mendes, com o tema: “Overdose de governador”.

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Foto: Reprodução / Facebook Bar do Armando (BICA)

Do ponto de vista político-econômico

Para o analista político e sociólogo, Carlos Santiago, a festa vai além da diversão e as pessoas devem, cada vez mais, refletir a situação do Brasil, tanto pelo olhar político quanto pelo econômico. Santiago defende que o povo precisa ficar em alerta quanto ao uso do dinheiro público nas festas carnavalescas, citando exemplos da fome e da desigualdade que assolam o país atualmente.

“A festa popular é para que o povo tenha diversão, tenha lazer, para que o povo brinque. Também é, porém, o momento de expor, de fazer uma reflexão sobre o atual quadro político e econômico do país. É com marchinhas de carnaval, com temas das escolas de samba que o povo também fica esclarecido. No atual momento do país, não se tem muito a comemorar. A classe política não merece bajulação. Um país de escândalos políticos, de pessoas procurando restos de comida em carro de lixo, milhares de brasileiros em filas de distribuição de ossos. Um país onde a fome, a pobreza e a desigualdade só crescem, não pode ser um lugar para exaltar, bajular e fazer autopromoção de políticos, ainda mais, se as escolas de samba ou blocos carnavalescos receberem recursos públicos”, enfatizou o analista político.

Santiago afirma, ainda, que é necessário mudança de pensamento dos brasileiros diante das eleições e das urnas, defendendo que o ano de 2022 é ano de cobrança de resultados não alcançados, principalmente pelo meio político, que em muito se omitiu na questão da pandemia e das mortes causadas pela covid-19. Ele disse que não há o que se comemorar diante da crise político-econômica no Brasil.

“O país não tem muito a comemorar. Políticos e dirigentes que usam o Carnaval para autopromoção sua e de seus familiares, neste momento trágico do Brasil, em que milhões de pessoas morreram e outras milhares ficaram sequeladas, por omissões de políticos, essas escolas e políticos não merecem o respeito da sociedade, que deve ficar atenta para saber quem é que banca tudo isso. O país não suporta mais “pão e circo”. O Brasil precisa mudar e a mudança começa nas eleições. Em 2022, não é ano de bajular é ano de cobrar as realizações e as mudanças, que, até agora, não aconteceram, em um país que não cresce economicamente há uma década”, pontuou.

Política e Samba
Carlos Santiago é advogado, sociólogo e analista político

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