Manaus, 4 de maio de 2024
×
Manaus, 4 de maio de 2024

Política

Há mais de duas décadas, vereadores conseguem se manter no cargo utilizando métodos de populismo

Com as eleições chegando, políticos que exercem mandatos, atualmente, começam a colocar em prática, mesmo que de forma discreta, suas estratégias.

Há mais de duas décadas, vereadores conseguem se manter no cargo utilizando métodos de populismo

Os três parlamentares ocupam hoje o ranking de vereadores mais antigos no Parlamento Municipal e ao que tudo indica pretendem continuar nas vagas. (Fotos: Divulgação/ CMM)

Manaus (AM) – O pleito municipal de 2024 se aproxima e os políticos que atualmente exercem mandatos começam a colocar em prática, mesmo que de forma discreta, as suas estratégias para não perderem as suas cadeiras na Câmara Municipal de Manaus (CMM).

Exemplo disso são os vereadores Gilmar Nascimento (Avante) e Glória Carratte (PL), que estão no sexto mandato consecutivo na Casa Legislativa, ou seja, há exatamente vinte e quatro anos ocupando a mesma vaga.

Depois deles, vem o vereador Marcel Alexandre (Avante), que exerce o seu quarto mandato na CMM, o que significa que o parlamentar – que também é apóstolo do Ministério Internacional da Restauração (MIR) – é representante da cidade de Manaus há dezesseis anos.

Os três parlamentares ocupam, hoje, o ranking de vereadores mais antigos no Parlamento Municipal e, ao que tudo indica, pretendem continuar nas vagas. Para isso, eles começam a colocar em prática métodos que relembrem o seu reduto eleitoral dos seus feitos, conquistem novos simpatizantes e, para tanto,  investem pesado no chamado “populismo”.

A vereadora Gloria Carratte é uma das que sabe bem como usar estratégias para conquistar a simpatia dos cidadãos. Carratte tem um projeto intitulado ‘Gabinete nos Bairros’ e, por meio dele, realiza semanalmente a distribuição de um sopão solidário em diferentes bairros da capital; além de serviços médicos.

 

“Mulher da sopa”

Esse pode ser um dos motivos que tem levado a parlamentar a se manter no poder, uma vez que, após esse projeto, Glória passou a ser chamada de “mulher da sopa”.

Carratte é decana da Câmara Municipal, ou seja, a vereadora mais antiga, sendo eleita para o cargo pela primeira vez no ano de 2001. Em 2020, Glória foi reeleita com um total de 4.299 votos.

A vida política da vereadora é marcada por diversas polêmicas, entre elas, a condenação aplicada a ela e ao marido, ex-deputado estadual e médico Miguel Carratte, que determinava a devolução de R$ 3,2 milhões aos cofres públicos no ano de 2021.

O processo que originou a condenação foi movido pelo Ministério Público do Amazonas (MP-AM) que apontou uso ilegal de servidores públicos da vereadora e de Miguel. O órgão afirmou, na época, que os dois utilizavam recursos da CMM e da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) para pagar servidores que, na verdade, trabalhavam em clínicas médicas que pertenciam ao casal.

Gilmar Nascimento – que também está no sexto mandato no Parlamento Municipal – segue a mesma linha adotada pela colega. Nascimento está em contato com seu eleitorado, constantemente, por meio de visitas a comunidade, sempre levando e fazendo ações para que a população se sinta lembrada e representada.

O político não era um dos vereadores da atual legislatura, mas assumiu o mandato em fevereiro do ano passado, após o ex-vereador Sandro Maia ter perdido o mandato por decisão do Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE-AM) por abuso de poder econômico durante a campanha de 2020.

No ano de 2016, Nascimento foi o oitavo vereador mais votado em Manaus, com 8.734 votos na época.

O parlamentar se envolveu recentemente numa polêmica relacionada à privatização do Centro Social Urbano (CSU) do bairro Parque Dez de Novembro. A história começou quando o vereador Rodrigo Guedes (Republicanos) afirmou, na CMM, que iria entrar na Justiça contra a privatização.

Guedes afirmou que uma das pessoas que recebia supostos valores de vendas de barracas e espaço do parquinho do Festival do CSU era um assessor de Gilmar na Casa legislativa.

Terceiro mais antigo

Já Marcel Alexandre é conhecido por ter ligação direta com o público evangélico e por ser um ferrenho defensor do conservadorismo. Alexandre é amigo do líder e fundador do MIR, o apóstolo Renê Terra Nova.

Nas eleições do ano passado, Marcel chegou a fazer diversas publicações em suas redes sociais sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas, sugerindo, inclusive, uma nova eleição somente para presidente, uma vez que é apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e questionava o resultado do pleito de 2022.

O apóstolo também tem sido criticado por defender posicionamentos no Legislativo municipal, considerados homofóbicos. Um dos exemplos aconteceu no mês passado, quando o parlamentar defendeu o cancelamento de uma parceria da Prefeitura de Manaus e a Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Amazonas (OAB-AM) para a realização de um casamento coletivo de pessoas LBTQI+.

Estratégia de populismo

A reportagem do AM1 conversou com Ademir Ramos, cientista político, antropólogo e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) sobre a permanência, por décadas, desses vereadores no poder.

Para Ademir, existem dois aspectos que marcam a política: o que ele chama de dimensão ideológica e dimensão estratégica. Na sua visão, o que explica essa manutenção no poder é a questão estratégica.

O professor explicou que esses vereadores trabalham uma estratégia muito próxima do Governo, ou seja, eles trabalham como uma extensão do Poder Executivo, da prefeitura da cidade.

“Eles deveriam ser representantes do povo, mas passam a ser um braço do Poder Executivo e, dessa forma, então, o Executivo investe neles no sentido de captação de recursos; é uma troca de favores”, destacou.

Ramos pontuou que esses parlamentares pouco fazem de serviço à população, sobretudo, quanto à questão da cidadania, e o fortalecimento da soberania e trabalham muito o populismo. “Isso quer dizer o pão e o circo; isso se multiplica muito mais quando se trata de uma sociedade desigual, quando há pobreza, miséria e ignorância”, frisou o especialista.

Religião

Ainda nesse contexto, o cientista político lembrou que é importante destacar a questão da religião, citando que ela  é um campo fértil de captação de recursos.

“Muitos que estão engajados e inseridos nesse contexto buscam uma identidade com a comunidade religiosa e, nesse sentido, eles se multiplicam e se perpetuam como candidatos e, ao mesmo tempo, como vereadores”, disse.

O professor enfatizou, ainda, que essas relações são estratégias que têm uma configuração de “conluio” (combinação), em torno de um determinado nome, municiado pelo Poder Municipal.

“Essa pessoa, na verdade, se torna um pau mandado do Governo Municipal, desmerecendo, sobretudo, a questão da cidadania popular. Eles praticam o populismo e se beneficiam diretamente junto ao Poder Executivo e as migalhas do banquete dessa relação são jogadas ao povo”, concluiu Ademir.

LEIA MAIS: