Manaus, 24 de abril de 2024
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Cidades

Igarapé do Tarumã acumula lixo há 30 anos e deixa de ser espaço de lazer

Falta de planejamento urbano e educação ambiental são apontados como fatores da degradação dos igarapés de Manaus

Igarapé do Tarumã acumula lixo há 30 anos e deixa de ser espaço de lazer

(Foto: Márcio Silva/ arquivo/ Portal AM1)

MANAUS, AM – Das margens do Igarapé do Tarumã, na zona Oeste de Manaus, a dona de casa Sebastiana Fátima Gomes da Silva, 68, olha atentamente a água poluída do local que, há cerca de 30 anos, ela e milhares de manauaras tinham como espaço de lazer. Hoje, o curso d’água é apenas mais um igarapé repleto de lixo na cidade.

“Era uma maravilha esse banho. Isso já foi muito bom, o povo vinha pra cá. Isso era muito bonito, agora acabou”, relembrou a moradora.

Sebastiana relembra os tempos que tomava banho no igarapé (Foto: Márcio Silva/ Portal AM1)

O igarapé fica a poucos metros da casa da aposentada e de centenas de outras famílias. Sobre as águas, que compõem uma das maiores bacias hidrográficas da cidade, flutuam diversas garrafas plásticas e embalagens. O Tarumã-Açu tem uma extensão de 37.612 quilômetros e inicia no quilômetro 40 da BR-174 e desemboca no rio Negro.

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Além da poluição industrial, muitas das casas e flutuantes não possuem tratamento de esgoto. Segundo dados preliminares levantados por equipes técnicas do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), atualmente existem cerca de 489 estruturas flutuantes na bacia, entre residências, estabelecimentos comerciais, balneários e outros.

Igarapé do Tarumã em 1987 (Foto: Reprodução/ No Amazonas é Assim)

Diferentemente de Sebastiana, o sobrinho dela, o mecânico industrial Tiago Oliveira, 24, faz parte da geração que não conheceu as águas limpas do Tarumã. Ele mora há 12 anos no local, e atualmente, com a esposa e os filhos, convive com o odor causado pela poluição, além dos perigos.

“Aparece muito jacaré aqui, cobras, filhote de sucuri. Eu já matei uns dois. Tem riscos demais, mas a gente se vira”, contou. Ele afirma que com a descida das águas do rio Negro, após a cheia histórica de 2021, a poluição se tornou ainda mais visível.


Desordem urbana


Segundo o biólogo e especialista em ecologia, Daniel Santos a poluição no local é uma das consequências da falta de planejamento urbano na capital amazonense.

“O crescimento desordenado de bairros em Manaus, com a falta de saneamento básico e a prática das pessoas de utilizarem os igarapés como fossa e lixeiras, foram os principais fatores da poluição”, explicou.

Daniel, que também é consultor, auditor e embaixador do Instituto Lixo Zero em Manaus, destacou que as ações do poder público não têm sido eficientes e rápidas como as ocupações irregulares. Além disso, a falta de educação ambiental corrobora com o problema.

“Com tecnologias é possível se reverter a poluição, como por exemplo, a despoluição do rio Tâmisa, na Inglaterra. Mas, além de tecnologias tem que ser feito a mudança das pessoas que são as que impactam diretamente os igarapés de nossa cidade”, disse.

Especialistas alertam para a recuperação das margens (Foto: Márcio Silva/ Portal AM1)

Da mesma forma, a socioambientalista, Muriel Saragoussi, aponta que a falta da educação ambiental como um dos fatores que impulsionaram a degradação. Contudo, ela destaca que a poluição acumulada nas águas também é consequência de falhas na coleta de lixo nas ruas da capital.

“A coleta do lixo urbano não pega a cidade toda e não tem a frequência suficiente. Então precisa ter tanto uma educação maior dos manauaras, quanto uma coleta melhor e o destino dos resíduos sólidos dentro da cidade de Manaus para que tenha menos resíduos nos igarapés”, pontuou.

Saragoussi ressalta, ainda, que é preciso recuperar também as margens dos igarapés. “Ter as áreas com bosque, com floresta, com plantas, de modo a garantir um leito maior para o igarapé e, que esteja mais limpo e mais protegido. Então isso também ajuda a melhorar a qualidade da água do igarapé”, afirmou.


Sem ações públicas

Atualmente, na gestão do prefeito David Almeida, a Secretaria Municipal de Limpeza Urbana (Semulsp) realiza a coleta de lixo nos igarapés. No entanto, quando questionada pela reportagem sobre projetos para a recuperação das áreas degradadas, a Prefeitura de Manaus silenciou.

Enquanto o poder público permanece omisso a ações efetivas para reverter os danos ambientais, os especialistas alertam para os impactos piores nas gerações futuras. “Não existe vida sem água, a contaminação de igarapés, rios, mares e do lençol freático, vai impactar diretamente na manutenção da vida. Os gastos com saúde pública e de limpeza das águas, são gastos que poderiam ser investidos em educação, lazer, transporte e cultura”, finalizou Daniel Santos.

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