Manaus, 27 de abril de 2024
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Manaus, 27 de abril de 2024

Economia

Na busca por emprego, venezuelanos montam ‘recursos humanos’ em rotatória de Manaus

Todos os dias, dezenas de venezuelanos se juntam na rotatória das avenidas Laguna com Desembargador João Machado. Eles buscam uma diária de serviço na área da construção civil, para poder comprar alimento e pagar o aluguel do local onde residem

Na busca por emprego, venezuelanos montam ‘recursos humanos’ em rotatória de Manaus

Fotos e vídeos: Conceição Melquíades| AM1

MANAUS – O venezuelano Pablo Hurtado, de 52 anos, é servente de obras. Ele vive no Brasil, em Manaus, há aproximadamente três anos e todos os dias ele se dirige, às 3h da manhã, para a rotatória da avenida Laguna, no bairro Nova Esperança, na Zona Oeste de Manaus, em busca de diária como servente de obras da construção civil.

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José Villerrovel, de 37 anos, é motorista de caminhão. Ele também se dirige diariamente para o mesmo ponto. No local, dezenas de homens venezuelanos como ele buscam por uma oportunidade de trabalho. Com desejo de trabalhar, tentam conseguir uma diária de trabalho na área de construção, pois precisam levar o alimento para seus filhos e esposa, além de dinheiro para o aluguel do quitinete em que moram, nas proximidades.

Todos os dias, há mais de três anos, dezenas de venezuelanos montam “acampamento” na rotatória das avenidas Laguna com a Desembargador João Machado, na esperança de conseguir ao menos uma diária de serviço. “De qualquer coisa”, diz Leonard Palina, de 18 anos, que faz questão de informar que possui o ensino médio completo.

O setor da construção civil é o que mais atrai esses homens, que buscam um ganho rápido, para poder comprar alimento e pagar o aluguel do local onde residem com suas famílias.

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O venezuelano José Villerroel, de 37 anos, é motorista e está em processo de regularização dos documentos e da habilitação para pelejar por uma vaga de condutor de automóveis

O motorista de caminhão José Villerroel também chegou ao Amazonas com seus dois filhos e a esposa há cerca de três anos. Ele está com 37 anos e revelou ao AM1 que é motorista. Porém, ainda está atualizando a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) para poder conseguir uma vaga na área. Para ele, o valor dos exames é o que mais pesa, pois precisa pagar R$ 400 de aluguel, cerca de R$ 90 de energia, mais as despesas com a alimentação da família e o transporte, ou seja, fica muito caro para se manter, já que não possui um emprego e conta com a sorte paga ganhar o “pão de cada dia”.

“Eu venho cedinho para cá todos os dias. Mas, tem dia que chega 11h e a gente não consegue nada de trabalho e aí vai embora, porque não conseguiu nada. Semana que passou, não teve nem mesmo um dia de serviço para a maioria aqui de nós (disse, mostrando os demais colegas). Foi difícil para conseguir comer em casa com minha esposa e filhos. Só conseguimos comer salsicha mesmo”, relatou José Villerroel .

Pablo Hurtado, de 52 anos, disse que foi um dos primeiros trabalhadores a usar o local para oferecer seus serviços como servente de pedreiro e, por isso, já tem alguns cliente certos, mesmo assim, admite que tem semana que não consegue muito serviço e o dinheiro, que já é curto, fica ainda mais reduzido, enquanto “as despesas só aumentam”. Ele disse que recebe entre R$ 50 e R$ 70 por diária.

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O pedreiro Alexis José Araújo, de 37 anos, disse que cobra R$ 120 a diária dele, mas que, às vezes, é bem difícil chegar em casa com algum recurso. “Tem muito homem aqui precisando de trabalho. Todos os dias são 25 homens e, às vezes, têm uns 50 como eu que vêm pra [sic] esse local em busca de conseguir uma diária de serviço, e alguns não conseguem e voltam de mãos vazias”, lamentou Alexis.

O jovem Jesús Alcantara, de 23 anos, chegou ao Brasil faz 1 mês

O pedreiro Miguel Eduardo Paez, de 41 anos, conta que está procurando emprego e que está trabalhando informalmente, mas que sonha conseguir um trabalho de carteira assinada, para ter mais garantias. “Eu moro alugado, minha esposa é enfermeira, mas também não conseguiu validar o diploma dela para poder trabalhar como enfermeira aqui no Brasil. Meu filho tem 9 anos, está estudando. Sou grato por isso, mas ainda precisamos de muita ajuda. Eu venho caminhando de casa para economizar, mas é difícil.”

Embora Miguel Paez se diga agradecido pela oportunidade que tem tido no Brasil, reclama que há pessoas mal intencionadas no momento em que os procuram para contratá-los para o serviço.

“Tem uns que chegam, acertam um valor da diária e na hora de pagar o dia de trabalho, avisam que só podem pagar no sábado. A gente trabalha para comprar comida, pagar aluguel, internet e outras coisas, se não recebe fica difícil para nós”, queixou-se Miguel, que disse residir no bairro Planalto, na mesma casa desde que chegou a Manaus, há três anos.

De janeiro de 2017 a março de 2022, o Brasil recebeu 325.763 venezuelanos que permaneceram aqui. Desses, além da dificuldade da língua, documentação e outros entraves, há ainda o fator que é difícil, inclusive para os próprios brasileiros: a idade.

Jesús Romero tem 68 anos, é marítimo e disse que está em Manaus há três meses. Ele não compreende o português e depende dos colegas para traduzir e falar por ele nas diversas situações, porém, ele disse que poucas pessoas aceitam os serviços dele devido à idade que ele considera preocupante.

Atualmente, Romero tem duas filhas e um neto morando no Brasil. Ele vive na mesma casa que a filha Mariza, de 22 anos. Ela é cabeleireira e sustenta a casa, no momento. A outra filha dele, Ivane, de 35 anos, mora em Curitiba (PR), com o filho dela de 9 anos. Ela conseguiu emprego, mas ele não soube informar com o que a filha trabalha. Ele está tentando regularizar os documentos para poder trabalhar no ramo que gosta, como marítimo.

VENEZUELANOS NO BRASIL

Nos últimos cinco anos, o Brasil registrou a entrada de mais de 700 mil venezuelanos, segundo levantamento do Subcomitê Federal para Recepção, Identificação e Triagem dos Imigrantes.

Por meio do informativo se verifica o mapa das principais rotas de entrada e saída do país. Além da cidade de Pacaraima (RR), outros dois principais pontos de acesso são as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, pelos aeroportos internacionais.

Entre eles, 325.763 permaneceram em território nacional, enquanto 376.459 passaram pelo Brasil e seguiram outras rotas. A maioria saiu do Brasil por Roraima, pela cidade do Rio de Janeiro e por Foz do Iguaçu, no Paraná.

A maioria deles são do sexo masculino e tem entre 30 e 59 anos – faixa etária que representa 49% do total – segundo dados de janeiro de 2017 a fevereiro de 2022.

O estudo mostra que 30% têm entre 18 e 29 anos, sendo que a população infantojuvenil corresponde a 16%, com idades entre 0 e 17 anos. Idosos com 60 anos ou mais são minoria, representam 5% dos venezuelanos que entram no Brasil. Desses imigrantes, 53% são homens, enquanto a população feminina corresponde a 47%.

Em cinco anos foram emitidos 378.567 CPFs a nacionais venezuelanos, garantindo-lhes acesso a programas assistenciais e trabalho, além de apoio dos órgãos governamentais e entidades parceiras da sociedade civil.

No Amazonas, com apoio da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), a Secretaria Municipal da Mulher, Assistência Social e Cidadania (SEMASC) tem aprimorado a assistência social e a proteção de pessoas refugiadas e migrantes da Venezuela e de outros países, além de brasileiros que acessam os Centros de Referência e Referência Especializada em Assistência Social (CRAS e CREAS) no município de Manaus.