Manaus (AM) – O tempo não apaga a dor e a incerteza, apenas aumenta a ansiedade por respostas. Esse é o sentimento que familiares de pessoas desaparecidas compartilham. Somente de janeiro até agosto deste ano, 924 pessoas desapareceram no Amazonas, conforme consta no painel de estatísticas da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM).
Entre tantos casos, muitos seguem sem resposta, como os de Shara Ruana, Cinthia da Gama, Erlon Gabriel e Andressa Castilho de Souza. As famílias continuam se perguntando: o que aconteceu? Quem é o responsável? Onde estão agora?
Um dos casos de grande repercussão é o desaparecimento de Shara Ruana Reis, há 17 anos. Era manhã de domingo, 28 de outubro de 2007, quando a menina, de apenas 7 anos, saiu para comprar pão e nunca mais voltou.
De acordo com a família, Shara estava acostumada com o trajeto até a padaria. Ela vestia uma bermuda laranja, uma blusa azul e chinelos de dedo quando desapareceu no bairro Betânia, nas proximidades do Morro da Liberdade, zona Sul de Manaus.
A partir de então, a família iniciou uma busca que dura até hoje. Nascida em 22 de outubro de 2000, a menina teria 24 anos atualmente. Tanto a família quanto a polícia receberam diversas ligações com supostas informações sobre o paradeiro de Shara, mas a maioria era apenas trote e muitas outras não se confirmaram.
A família segue confiante em encontrá-la e mantém uma página no Facebook, na qual divulga fotos e reportagens sobre o caso na expectativa de conseguir novas informações.
Em uma das postagens, o pai de Shara, Pedro Lourenço Reis, desabafou e afirmou que espera uma resposta das autoridades. “Continuamos na mesma fé, esperando em Deus e na resposta dele e das autoridades, pois já entrou e saiu delegada e nada foi feito. As pessoas que estavam envolvidas, a delegada Linda Gláucia sempre me dizia: ‘Não se preocupe, pois eles estão sendo monitorados.’ Os suspeitos já são maiores de idade e nunca foram chamados para prestar esclarecimentos. Fica aqui o meu repúdio, pois tenho certeza de que, se ela fosse filha de um político ou de qualquer autoridade, já teríamos uma resposta para esse caso”, pontuou.
Cinthia Gama
O desaparecimento de Cinthia da Gama Pereira, de apenas 12 anos, também segue sem solução. A menina saiu de casa às 11h do dia 5 de outubro de 2016 para buscar o irmão, de 10 anos, na escola, no Vale do Sinai, bairro Cidade Nova, zona norte, e nunca mais foi vista pela família.
O trajeto entre a casa e a escola tinha cerca de 500 metros, numa rua reta com residências e comércios. Cinthia costumava ir sozinha buscar o irmão quando a mãe não podia.
Na época, apenas um adolescente de 14 anos afirmou ter visto Cinthia próxima à escola. Segundo o jovem, ele a viu no caminho, já perto da unidade educacional, conversou com ela e seguiu. Outro menino disse ter visto Cinthia sendo colocada à força em um carro Gol de cor preta.
Apesar das informações, o caso segue sem resposta. A família chegou a realizar protestos para cobrar celeridade da polícia, mas nada foi concluído sobre o desaparecimento.
Erlon Gabriel
Um dos casos mais recentes é o de Erlon Gabriel, que desapareceu aos 2 anos de idade, na manhã do dia 6 de fevereiro de 2020, enquanto brincava no pátio da residência da família, localizada na rua 7, comunidade União da Vitória, bairro Tarumã-Açu, na zona Oeste de Manaus.
Hoje, Erlon Gabriel teria 6 anos. No entanto, não há nenhuma projeção de imagem de como ele poderia estar fisicamente atualmente. O Portal AM1 conversou com a mãe da criança, Maria Dias, que relatou ainda ter esperança de encontrar o filho vivo.
“Continuamos as buscas, continuamos a procurar informações. Se alguém viu, se alguém sabe algo ou pode dar alguma informação, acredito que podemos encontrá-lo. Tenho fé em Deus que ele me dará uma resposta sobre o meu filho”, disse Maria.
Assim como a família de Shara Ruana, Maria criou uma página no Facebook para divulgar fotos do filho, além de um grupo no WhatsApp, no qual ajuda outras mães de crianças desaparecidas.
“Compartilho sempre as fotos dele e ofereço apoio para outras mães. Quando casos de desaparecimento saem na mídia, nós divulgamos no grupo também”, afirmou.
Na época, foram levantadas algumas hipóteses sobre o desaparecimento de Erlon. Relatos apontaram que um carro preto teria entrado na rua e sequestrado a criança, mas essa versão foi descartada após investigações. Outra possibilidade levantada foi a de que Erlon teria caído em um igarapé próximo à casa. No entanto, buscas realizadas pela Polícia Militar com o auxílio da cadela Fiona, treinada para localizar corpos, não encontraram vestígios.
Andressa Castilho
Andressa Castilho de Souza desapareceu no dia 28 de novembro de 2017, após sair de casa para levar alimentos e outros objetos ao companheiro no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj), na zona rural de Manaus. Desde então, os familiares não tiveram mais notícias sobre ela.
Um homem identificado como Alex da Silva Sabóia, de 45 anos, foi preso como autor do assassinato de Andressa. A partir de sua prisão, o caso passou a ser tratado como homicídio. No entanto, o corpo da vítima nunca foi encontrado, o que intriga a família.
Após a prisão de Sabóia, outros cinco criminosos foram detidos por suspeita de participação no crime. Na época, o caso chegou a ser descrito como uma “história macabra” pelo secretário de Segurança, Coronel Amadeu Soares.
A polícia chegou a afirmar que as investigações continuariam para chegar à motivação do crime, mas, desde então, não foram divulgadas novas informações.
A reportagem do Portal AM1 procurou a Polícia Civil do Amazonas (PC-AM) para saber se os inquéritos desses casos foram concluídos e encaminhados à Justiça e quais os procedimentos adotados em situações de longos desaparecimentos. Perguntou-se ainda se os inquéritos permanecem abertos ou são encerrados à espera de novas informações. No entanto, até o momento, os questionamentos não foram respondidos.
Projeto de Lei
A Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (Aleam) aprovou, por unanimidade, o Projeto de Lei 1023/2023, que institui o Alerta para Resgate de Pessoas e o Estado de contingência nas hipóteses de desaparecimento, rapto ou sequestro de crianças e adolescentes. O PL seguiu para sanção do governador e já é uma realidade nos estados do Ceará, Distrito Federal e Minas Gerais.
De autoria da deputada Débora Menezes, o projeto tem objetivo de criar o Alerta para Resgate de Pessoas no Amazonas (ARPAM), estabelecendo diretrizes de Estado de contingência nas hipóteses de desaparecimento, rapto ou sequestro de crianças e adolescentes.
“O projeto constitui uma rede digital estadual de comunicação para rápida elucidação de desaparecimentos, estabelecendo uma espécie de rede de contatos que dissemina informações sobre a criança ou o adolescente desaparecido, como características físicas, roupas, entre outras”, explicou.
A proposta, conforme a parlamentar, é inspirada no sistema norte-americano Alerta Amber (America’s Missing: Broadcast Emergency Response), implantado após o rapto e assassinato da menina Amber Hagerman, de 9 anos, no Texas, em 1996.
Na prática, Débora exemplificou que quando uma criança ou adolescente é raptado, sequestrado ou desaparece serão enviadas mensagens por celular para a população e transmitidos alertas nos meios de comunicação em parceria com as autoridades competentes.
O alerta seria formado por uma rede digital de comunicação no Amazonas, integrando o poder público e a sociedade civil. Os órgãos de segurança transmitiriam o alerta a seus servidores e em seus canais de comunicação. Também é prevista a parceria com a imprensa local, para a rápida divulgação das notícias de desaparecimento, rapto e sequestro de crianças e adolescentes.
LEIA MAIS:
- Após quatro anos, família continua à procura de Erlon Gabriel, desaparecido em Manaus
- ‘Ainda não encontramos indícios de sequestro’, diz PC sobre menino Erlon
- Polícia busca informações sobre jovem e adolescente desaparecidos em Manaus
Não deixe de curtir nossa página no Facebook, siga no Instagram e também no X.