Ora adversário, ora aliado: política amazonense é marcada por alianças inesperadas

Manaus (AM) – Você já deve ter ouvido falar na expressão que na política amazonense, tudo pode acontecer, até “boi voar”. Isso exemplifica bem o que está acontecendo neste ano de eleição municipal em Manaus: a aliança inesperada entre o senador Eduardo Braga (PMDB) e o prefeito de Manaus, David Almeida (Avante), que busca a reeleição.

Na disputa de 2020, quando David saiu vitorioso no segundo turno, Braga apoiou Amazonino Mendes. Na época, o atual prefeito de Manaus afirmava, durante discursos, que o pleito seria o fim da “era dos caciques políticos” no Amazonas. Inclusive, após ser eleito, David continuou as críticas contra Braga.

Durante um evento em 2021, que marcou a assinatura de convênios de R$ 30 milhões entre o Governo do Amazonas e a Prefeitura de Manaus para a reforma de 29 feiras e mercados municipais da cidade, o prefeito dirigiu críticas a Amazonino Mendes e ao senador.

Em seu discurso, David afirmou que, no passado, os dois ex-governadores perderam votos em Manaus e tiraram receitas da capital que, na época, já somavam a ordem de R$ 1 bilhão. A fala de David referia-se a 2002, época em que Amazonino era prefeito e Eduardo governador, e o Estado deixou de repassar recursos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de Manaus para destinar ao município de Coari.

David ainda chegou a afirmar que Wilson Lima “estava devolvendo os recursos para Manaus”. “Até o ano que vem (2022), já serão devolvidos R$ 580 milhões”, afirmou David. Essa declaração foi dada quando o “casamento” entre o chefe do Poder Executivo Municipal e o estadual estava a mil maravilhas, o que, agora, parece ter desmoronado.

Inclusive, em 2020, mesmo sem ter tido algo explicitamente declarado, os bastidores apontavam que Wilson Lima estava apoiando a candidatura de David. No entanto, na época, o governador estava sendo investigado por supostas fraudes e desvios na compra de respiradores, com dispensa de licitação, de uma importadora de vinhos — os equipamentos deveriam ser destinados ao combate ao novo coronavírus nos hospitais de Manaus, o que fez David tentar negar o apoio não declarado de Wilson.

Aliança firmada com Wilson em 2022 e contra Braga

Em seu primeiro ano de mandato, David obteve uma aprovação de 80%, de acordo com pesquisa feita pelo Real Time Big Data, sendo uma das maiores do Brasil. Com isso, ele decolou como o principal cabo eleitoral para as eleições de 2022 no Amazonas.

Foi exatamente o que aconteceu: David firmou parceria com Wilson Lima e se empenhou na campanha de reeleição do governador, inclusive, o vice, Tadeu de Souza, foi uma indicação do prefeito. O prefeito chegou a ir para as ruas de Manaus pedir voto para Wilson. A eleição foi decidida no segundo turno entre Wilson Lima e Eduardo Braga, que saiu derrotado. Durante a disputa, o governador conseguiu criar um forte arco de aliança com prefeitos do interior, tirando até apoios do senador.

Um exemplo foi o apoio dos prefeitos Paulino Grana (PSDB) e Regis Nazaré (Republicanos), respectivamente, das cidades de Silves e Anori, no segundo turno. Os gestores eram ex-apoiadores do senador Eduardo.

Após a eleição, em dezembro de 2022, Wilson e David chegaram a se reunir e foi noticiado que haviam firmado a aliança para as eleições de 2024. Durante o encontro, Wilson Lima teria assumido o compromisso de apoiar a candidatura à reeleição de David Almeida, indicando o vice do prefeito na futura disputa.

Parceria desmoronada e união a Braga

No entanto, em 2023, essa parceria começou a ser abalada. Os dois foram ficando distanciados, o que levantou suspeitas de que o acordo feito em 2022 não estava indo bem. O distanciamento ficou mais evidente quando Braga subiu no mesmo palanque que David, em julho de 2023, durante a inauguração de uma creche que leva o nome da mãe do senador — Dorothéa de Souza Braga —, no conjunto Cidadão V, no bairro Nova Cidade, na Zona Norte de Manaus. No evento, Braga já havia sinalizado o possível apoio a David, que se concretizou um tempo depois.

Mas a evidência maior de que a aliança entre David e Wilson tinha acabado foi quando o União Brasil lançou Roberto Cidade como pré-candidato a prefeito e Wilson Lima declarou apoio. Durante o lançamento da pré-campanha de Cidade, Wilson Lima disse que se empenharia para que Roberto Cidade fosse o próximo prefeito de Manaus.

“Estou aqui para empenhar o meu compromisso como presidente do União Brasil, como governador do Amazonas e, acima de tudo, como cidadão, para que o Roberto Cidade seja o próximo prefeito de Manaus. Conte com o meu empenho pessoal. Sou um soldado na sua campanha. Agora, é oficial; vamos para cima!”, frisou Wilson Lima.

Refúgio nos braços de Braga

Voltando à expressão de que na política até “boi pode voar”, após não ter apoio de Wilson, David se refugiou nos braços de Braga, que tanto já criticou. Ao que tudo indica, os dois passaram uma borracha no passado e já até fazem planos. No começo deste mês, David Almeida declarou apoio à reeleição do senador nas eleições de 2026.

O anúncio foi feito durante a apresentação de um pacote de ações para Manaus, no parque Gigantes da Floresta, onde David Almeida agradeceu publicamente a Braga pelo apoio à cidade de Manaus.

“Tenho certeza de que estarei ao seu lado para agradecer todas as ajudas que o senhor tem dado para a cidade de Manaus”, declarou o prefeito. O anúncio também confirma o fim da aliança entre David e Wilson Lima, já que Braga e Lima são adversários políticos, além de que o governador também pretende disputar a vaga no Senado.

Eduardo Braga e Wilson Lima

Em entrevista ao Portal AM1, o cientista Helso Ribeiro fez análise sobre a atual configuração política no Amazonas, destacando as alianças e influências dos principais atores políticos da região. Ele aponta que Wilson Lima possui um amplo apoio na Assembleia Legislativa e entre prefeitos, o que fortalece seu grupo político.

Em contraste, o senador Eduardo Braga, apesar de sua liderança nacional e posição de destaque no Congresso, parece ter menos apoio ao nível estadual e municipal, com poucos aliados entre deputados e vereadores.

Segundo o especialista, as alianças políticas são comuns não apenas no Amazonas, mas em outros estados e municípios do Brasil. No entanto, critica essas alianças por serem predominantemente eleitoreiras e pouco ideológicas, com foco principal em vencer eleições e obter cargos no governo, em vez de promover o bem-estar da população ou seguir princípios ideológicos sólidos.

A análise de Helso Ribeiro sugere que, apesar das aparências de cooperação e aliança entre os políticos, muitas dessas relações são temporárias e baseadas em interesses pragmáticos. Esse cenário reflete uma prática política pragmática e utilitarista, onde os valores e princípios são frequentemente secundários em relação ao objetivo de ganhar poder e influência.

“As alianças políticas são bem eleitoreiras, pouco ideológicas. Estão ali para ganhar a eleição, são pontuais. Ganha a eleição, indica tantos secretários, faz parte daquele governo enquanto interessa. E aí, os políticos vão dar as desculpas de que, naquele momento, era a melhor opção, mas a conclusão é que são alianças eleitoreiras. Não estão, pensando necessariamente no bem da população, tampouco em ideologias ou princípios. Estão pensando em ganhar a eleição, em se aliar com alguém para derrubar outro, que se dane valores, ideologias e princípios. Isso ocorre não só no Amazonas, mas em vários outros lugares; infelizmente”, pontua.

 

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