
(Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)
Manaus (AM) – De janeiro até o dia 12 de dezembro deste ano, o Amazonas registrou 23 feminicídios, conforme dados do Painel de Indicadores Criminais da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM). O número é igual ao registrado em 2023. Diante desse cenário preocupante, a Assembleia Legislativa do Estado (Aleam) aprovou, recentemente, três projetos de lei voltados para a proteção da mulher.
Já em uma análise dos últimos oito anos, esse número salta para 139 feminicídios registrados no estado do Amazonas, conforme a SSP-AM. Durante esse período, o ano de 2018 destacou-se como o de menor incidência, com quatro ocorrências. Em contrapartida, a maior parte das vítimas tinha idades entre 35 e 65 anos, evidenciando que a violência de gênero afeta predominantemente mulheres adultas.
Em 2024, a capital amazonense concentrou a maioria dos casos, com 13 feminicídios — um aumento em relação aos 11 registrados no ano passado. Outros municípios que também notificaram casos foram Parintins (2), Itacoatiara, Maués, Anori, Carauari, Codajás, Lábrea e Pauini, cada um com uma ocorrência. A maioria das vítimas foi assassinada com arma branca, seguida por armas de fogo, estrangulamento e agressões físicas.
Nos últimos meses, o estado enfrentou episódios alarmantes, com dois casos registrados em menos de duas semanas em Manaus. Um deles ocorreu no dia 21 de novembro, quando Angélica Rodrigues de Oliveira, de 35 anos, foi brutalmente assassinada com pelo menos sete tiros pelo próprio marido, Lucimar Gonçalves Pinto, de 38 anos, conhecido como “Pixote”. O crime ocorreu na residência do casal, localizada no bairro Zumbi dos Palmares, na zona Leste da capital.
Segundo relatos de familiares, o assassinato ocorreu após uma discussão. Angélica teria pedido para que Lucimar deixasse a casa, o que teria desencadeado a reação violenta. Durante a briga, o suspeito sacou uma arma e disparou contra a vítima, que foi atingida diversas vezes. Angélica chegou a ser socorrida e encaminhada ao Hospital João Lúcio, mas não resistiu aos ferimentos.
Pouco mais de uma semana depois, Nariane Cabresto Garcia Sena, de 24 anos, foi assassinada pelo ex-marido, no dia 30 de novembro, na rua Gualter Batista, no bairro Petrópolis, na zona Sul de Manaus. O homem foi preso em flagrante.
De acordo com informações do irmão da vítima, o casal passou quatro anos juntos e estava separado há seis meses. Os filhos deles, duas crianças de 1 e 3 anos, moravam com a ex-sogra. A vítima tinha uma medida protetiva contra o autor.
Nariane teria ido à casa da ex-sogra, conforme relatos, após o suspeito chamá-la para ver as crianças. No momento em que se preparava para ir embora, o homem a atacou por trás com várias facadas. A vítima não resistiu aos ferimentos e faleceu no local.
Caso Julieta
Um dos casos de grande repercussão foi o assassinato de Julieta Ines Hernández Martinez, 38 anos, conhecida como “Palhaça Jujuba”, em Presidente Figueiredo. A artista venezuelana, que viajava de bicicleta, foi vítima de um crime brutal em janeiro deste ano. O casal Thiago Agles da Silva e Deliomara dos Anjos Santos foi preso como autor do assassinato. A vítima iria pernoitar em um local no terreno da casa dos suspeitos para seguir viagem no dia seguinte.
“A vítima estava dormindo em uma rede na varanda do local, quando Thiago pegou uma faca e foi até ela para roubar seu aparelho celular. Eles entraram em luta corporal, ele a enforcou, a jogou no chão e pediu que Deliomara amarrasse os pés dela. Em seguida, ele a arrastou para dentro da casa, pediu que a esposa apagasse as luzes e passou a abusar sexualmente da vítima”, detalhou o delegado titular da 37ª Delegacia Interativa de Polícia (DIP) de Presidente Figueiredo, Valdinei Silva.
O delegado disse que, após Deliomara ter visto a cena, jogou álcool e ateou fogo nos dois. Thiago conseguiu apagar o fogo com um pano molhado e foi até uma unidade hospitalar receber atendimento médico.
Julieta foi enforcada com uma corda e teve seu corpo enterrado em uma cova rasa nas proximidades do local onde estava. O casal foi indiciado pelo crime e o caso está na Justiça. Neste mês, foi realizada a segunda audiência do caso, na qual foram ouvidas cinco testemunhas. Outra deve ocorrer, mas segue sem data definida.
Amazonense morta em São Paulo
O assassinato de Clísia Lima, de 35 anos, foi outro caso de grande repercussão. O corpo da amazonense foi encontrado, no dia 30 de outubro, em uma represa no Rio Jaguari, no município de Piracaia, em São Paulo. O companheiro dela, Edson Fernando Cardoso, de 36 anos, foi preso como o principal autor do crime.
A mulher era natural de Manacapuru, que fica na Região Metropolitana de Manaus, e havia ido para o interior paulista para morar com o namorado. O laudo do corpo de delito constatou que Clísia Lima sofreu múltiplos ferimentos em diversas partes do corpo, e que foi arremessada na represa com as mãos e pés amarrados. O laudo também apontou que a mulher foi arremessada na água ainda com vida.
Mais de 30 facadas
No último dia 5, uma mulher de 29 anos foi brutalmente atacada com mais de 30 facadas pelo ex-companheiro, identificado como Cardete Ferreira Rodrigues, de 54 anos, que não aceitava o término do relacionamento, no município de Presidente Figueiredo.
Durante o ataque, crianças que estavam próximas tentaram intervir, usando pedaços de madeira para afastar o agressor, mas não conseguiram impedir as agressões.
Brenda foi socorrida por moradores e encaminhada a uma unidade hospitalar da região. O agressor está sendo procurado pela polícia.
Com base nas evidências coletadas, a polícia solicitou à Justiça uma Medida Protetiva de Urgência (MPU) para a vítima. Além disso, também foi requerida a prisão preventiva de Cardete, que segue foragido.
Mais de 4 mil ocorrências
De janeiro a início de novembro deste ano, mais de 4 mil Boletins de Ocorrência (BOs) foram registrados nas Delegacias Especializadas em Crimes Contra a Mulher (DECCMs) em Manaus.
De acordo com a delegada Alessandra Trigueiro, titular da DECCM Norte/Leste, é fundamental que as mulheres conheçam cada vez mais as instituições e os órgãos que fazem parte da rede de proteção, para poderem romper o ciclo da violência.
“A cada ano, o número de ocorrências registradas aumenta. Antes, as vítimas tinham medo de denunciar, mas, com o trabalho das delegacias especializadas na elucidação dos crimes e, principalmente, nas orientações preventivas, elas se sentem mais confiantes para procurar a delegacia, conhecer seus direitos e utilizá-los”, destacou a delegada.
Projetos de lei que aumentam proteção à mulher no Amazonas
No fim do mês de novembro, foram aprovados três projetos de lei de autoria da deputada Alessandra Campelo (Podemos), Procuradora Especial da Mulher na Assembleia Legislativa do Amazonas, que fortalecem a proteção às mulheres no estado.
O PL 266/2024 determina a divulgação online de uma lista de condenados por violência contra a mulher, conhecido como “Serasa” da violência. O PL 305/2024 proíbe o uso de termos pejorativos ou degradantes em casos de feminicídio e violência contra a mulher. Já o PL 339/2024 trata do monitoramento eletrônico de agressores em situações de violência doméstica e familiar.
Alessandra Campelo também citou a importância da implantação do monitoramento da tornozeleira eletrônica aliada às medidas protetivas no combate à violência contra a mulher.
“Quando o agressor é monitorado por tornozeleira eletrônica a medida protetiva deixa de ser um pedaço de papel e passa a ser uma ação mais efetiva de prevenção a uma nova agressão, ou seja, essa é uma tecnologia que evita o dano maior da violência contra a mulher, que é o feminicídio”, explicou Alessandra Campelo.
Para a deputada, os três projetos aprovados pelo Legislativo Estadual colaboram com a segurança e a dignidade das mulheres que moram no estado do Amazonas.
“O Serasa da violência contra a mulher, por exemplo, vai possibilitar a criação de uma lista online com os nomes de condenados por crime de violência contra a mulher no estado. Qualquer pessoa poderá consultar os fichas-sujas na internet e, dessa forma, evitar o envolvimento com agressores e feminicidas”, concluiu Alessandra Campelo.
Botão do Pânico
A Justiça do Amazonas concedeu, de maneira inédita no âmbito dos “Juizados Maria da Penha” do Amazonas, o uso do dispositivo conhecido como “botão do pânico” como forma de Medida Protetiva de Urgência à mulher vítima de violência doméstica.
A vítima denunciou o marido, o qual, reiteradamente, proferia, via mensagens de áudios, ameaças de morte contra ela, por não aceitar o fim do relacionamento. A decisão é do 3.º Juizado Especializado no Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Manaus.
“Esta é uma decisão pioneira no estado do Amazonas. Incluímos na medida protetiva concedida à requerente, pela primeira vez, o ‘botão do pânico’, que é um dispositivo diferente da tornozeleira eletrônica, por meio do qual a vítima consegue acionar o Centro de Operações e Controle quando está havendo alguma situação de perigo, violência física ou psicológica contra ela”, disse a juíza Ana Paula de Medeiros Braga, titular do 3.º “Juizado Maria da Penha”.
Denúncias
A Polícia Civil adverte que casos de violência doméstica podem ser denunciados pelos seguintes números: 180, da Central de Atendimento à Mulher; e 181, da SSP-AM.
As denúncias também podem ser feitas presencialmente nas DECCMs. A DECCM Centro-Sul está localizada na avenida Mário Ypiranga Monteiro, no bairro Parque Dez de Novembro, e funciona 24 horas por dia, em regime de plantão, para registro de ocorrências.
A DECCM Norte/Leste está situada na avenida Nossa Senhora da Conceição, no bairro Cidade de Deus, zona Norte. Já a DECCM Sul/Oeste fica na rua Desembargador Felismino Soares, no bairro Colônia Oliveira Machado, zona sul. Ambas funcionam de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h.
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