Manaus, 3 de maio de 2024
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Cenário

Ambientalistas divergem sobre preservação da floresta discutida em CPI

Na última semana, durante a CPI das Ongs, o senador Plínio Valério afirmou que "a preservação da floresta não é positiva para os brasileiros".

Ambientalistas divergem sobre preservação da floresta discutida em CPI

(Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado)

Manaus (AM) – Na última quarta-feira (23), durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das ONGs, o senador Plínio Valério afirmou que “a preservação da floresta não é positiva para os brasileiros”. Segundo Valério, que preside a comissão, há fortes indícios de que existam irregularidades na atuação das Organizações Não-governamentais (ONGs) na Amazônia, que prejudicam a floresta, a empobrecem e a isolam do mundo.

A declaração vai em encontro com a tese do ambientalista e professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Rogério Fonseca, que conversou com o Portal AM1. Para o ambientalista, a declaração de Plínio resume o que boa parte da população amazônida pensa sobre preservação e proteção de floresta.

“São dois conceitos que deixam o uso do recurso natural muito inflexibilizado. Ele [Plínio] entende esses dois conceitos e emprega, sempre que possível, o termos conservação e manejo — porque, utilização dos recursos naturais é uma previsão legal, constitucional, da qual todas as pessoas que trabalham no Legislativo brasileiro conhecem. O senador Plínio Valério tem uma carreira de longa data na área ambiental e conhece a realidade da vida como ela é, do cidadão amazônida. Portanto, não é uma pessoa que está fazendo uma afirmação descabida de conhecimento de vida prática”, observou Fonseca.

Para o professor da Ufam, o mundo enxerga o Brasil de uma forma e os brasileiros, especificamente os que moram na Amazônia, enxergam de outra. Portanto, concorda com o presidente da CPI das ONGs, quando diz que, na Amazônia, existem organizações internacionais que trabalham em benefício próprio e não do povo amazônida.

Fonseca ressalta, ainda, que o senador tem propriedade para criticar a atuação dessas ONGs que “agem contraditoriamente” no Brasil e no mundo.

“Exemplo que posso dar: tem uma organização ambiental, que, no mundo inteiro, apoia a conduta de manejo florestal, apoia a conduta de manejo de caça, apoia o manejo pesqueiro, e, no Brasil, ela sataniza o manejo florestal, manejo da conduta de caça e manejo pesqueiro que não seja comunitário. Existe, sim, organismos da sociedade civil seríssimos, mas alguns que têm atuado na região amazônica têm deixado a desejar. Portanto, são passíveis de críticas de toda a sociedade. Lá em Apuí, Beruri, Tapauá, Jutaí, em São Paulo de Olivença, Canutama, Novo Aripuanã, as pessoas estão vendo situações que nós, na capital, não vivenciamos. E isso, eles passam para os seus representantes [nesse caso, Plínio Valério, que vai  representá-los no Senado]”.

A CPI busca revelar evidências de possíveis irregularidades e relações questionáveis entre ONGs e o governo brasileiro. Com isso, o objetivo é investigar se os recursos públicos são aplicados de forma correta nessas organizações.

Rogério Fonseca relata que conhece os 62 municípios do Amazonas, nos quais, pode ver a atuação séria de ONGs. No entanto, segundo ele, casualmente, “algumas grandes [ONGS] têm desviado condutas e a CPI tem visto isso, tem colocado a situação para a sociedade para que, com organismos da segurança pública e órgãos de comando e controle de gestão ambiental, possam comandar, controlar, punir e vigiar conforme a legislação brasileira”.

Outro ponto de vista sobre a CPI das ONGs

Mesmo com todas as acusações apresentadas pela CPI, conforme Fonseca, pode haver ambientalistas que discordem de Plínio Valério, principalmente, se essas pessoas não têm uma conexão com a realidade do povo local, que precisa da floresta para sobreviver.

“Quem vive no interior do Amazonas vive uma realidade totalmente diferente de quem vive em Brasília. E essa desconexão, de pessoas que se autoafirmam ambientalistas, mas não praticam a conservação da floresta, o manejo correto e adequado da natureza, e, portanto, podem fazer afirmação de qualquer político para defender uma percepção, que, no momento, a gente tem visto que é errada, sim!”, argumenta.

“A gente não pode auferir lucro e renda com populações tradicionais porque nós temos firmado, positivado nas leis brasileiras, a proteção aos conhecimentos tradicionais de povos originários e comunidades tradicionais.  Portanto, os povos originários estão protegidos por uma lei, e se uma organização não-governamental fez usufruto desse conhecimento, sem o consentimento livre dessas comunidades tradicionais, a gente tem que assumir isso como um erro. Colegas ambientalistas podem discordar da crítica do senador Plínio Valério, mas é uma crítica válida”, completou.

Para finalizar, o professor universitário pede que, caso ONGs citadas na CPI  discordem das suspeitas levantadas pelo senador, “que tragam os bons argumentos para ele levar para dentro da CPI das ONGS, porque o que a gente tem visto dos fatos que estão sendo apresentados, são situações em desacordo com leis firmadas pelo Legislativo brasileiro”.

Já para Erivaldo Cavalcanti, pesquisador do Grupo de Estudos em Direito de Águas e do Laboratório LABTASS da FIOCRUZ e professor na UFAM e UEA, a declaração de Plínio é lamentável. De acordo com ele, “preservar a floresta é fundamental para os amazônidas, para os brasileiros e para o mundo todo”.

“Essa afirmação do parlamentar vai na contramão de tudo que se discute nos fóruns ambientais, chega a ser irresponsável e inconstitucional, uma vez que fere frontalmente o que dispõe o artigo 225 da Constituição Federal vigente. As florestas também são a maior fonte de água potável e a qualidade deste recurso é primordial para o desenvolvimento de um modo geral, para a saúde e para a vida”, explica.

Procurada para posicionamento a respeito das acusações da CPI das das ONGs, uma das organizações citadas nas investigações, o Instituto Socioambiental (ISA), não se manifestou. As acusações asseguram, inclusive, que pode haver desvio de fundo financeiro como a afirmação de um dado de 2021 e 2022, em que a referida instituição faturou R$ 137 milhões; porém, mais de 80% dessas entradas vêm do exterior.

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