Manaus (AM) – Em 2007, a Organização das Nações Unidas (ONU) definiu o dia 2 de abril como o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, uma data voltada para a conscientização da sociedade sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA).
O TEA é um transtorno que se caracteriza, entre outras manifestações, pela dificuldade de interação social e presença de comportamentos repetitivos. Apresenta diferentes graus, classificados de leve à grave.
Contudo, o pouco conhecimento sobre a condição, que se manifesta no neurodesenvolvimento, é responsável por diversas atitudes preconceituosas e exclusivas, principalmente no ambiente escolar.
Em conversa com o Portal AM1, Érika Souza, mãe de Anízio Domingos Xavier Neto, de 18 anos, contou as dificuldades e experiências vividas com seu filho desde a alfabetização até os dias atuais, e como conseguiu superá-las.
Anízio foi diagnosticado com Transtorno de Espectro Autista (TEA) ainda pequeno, aos 2 anos, quando a mãe começou a notar diferenças entre ele e o irmão mais novo
Érika relata que tudo mudou após o diagnóstico. Seu modo de pensar, de ver a situação e, consequentemente surgiu a preocupação com o próximo passo do filho: a escola. De acordo com a mãe de Anízio, o menino tinha problemas com relação à socialização.
Em um relatório feito pela escola em que Anízio frequentou, ele foi visto como um “jovem muito tranquilo, que em função do diagnóstico de TEA, apresentava boa regulação emocional e um comportamento, estável emocionalmente, porem é introspectivo, tímido e solitário, sem agressividade e estereotipias.”
Expectativa para o futuro
Apesar das dificuldades, a família conseguiu se adaptar e superar as diferenças, assim Anízio concluiu o ensino médio. A mãe já tem planos para o próximo passo dele na vida adulta: a faculdade. Érika afirmou que quer que Anízio faça uma graduação e já tem o aval de um neurologista.
“Eu já pensei seriamente em cursar a faculdade junto com ele para que não aconteça o mesmo que aconteceu na época da escola. Eu lutei muito para que ele conseguisse aprender, ler e escrever. Hoje ele sabe porque eu lutei para que isso acontecesse e eu não vou desistir, não cabe a mim essa opção de desistir”, afirmou.
Orgulho da mãe, o jovem vem acumulando diversas conquistas nos últimos anos: ela já concluiu um curso de informática básica, cursou informática avançada, aprendeu a tocar flauta e violão por meio da musicoterapia
O aprendizado
“Vivemos no mundo onde uma pessoa não respeita o outro, imagine pra ele que tem suas limitações’’, disse mãe. Com palavras gentis, Érika compartilhou sua alegria em ver a evolução do filho e o orgulho que ele dá a ela todos os dias.
Érika e Anízio moram em Boa Vista, atualmente, mas durante os dias que morou em Manaus, ela contou que teve uma grande ajuda da ‘Associação de Mães Unidas pelo Autismo’ (AMUA).
O AMUA é uma associação independente do governo, fundado em 2018. Atualmente, atende 80 pessoas com Transtorno do Espectro Autista.
Inclusão no ensino superior
O universitário Silvano Furtado da Costa e Silva, de 23 anos, estava no 8º período da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), quando teve seu diagnóstico de autismo, em 2020.
“No primeiro ano da pandemia, eu tive várias questões psicológicas, passei por alguns tratamentos e tive meu diagnóstico de autismo. Fiquei um pouco vulnerável. Em uma reunião aberta entre os alunos e a representação discente da faculdade, eu disse à época que eu não pisaria nesse prédio novamente depois de pegar meu diploma, caso a faculdade não mudasse a forma como lida com seus alunos neurodivergentes”, contou.
A manifestação de Silvano fez com que ele fosse convidado a integrar a representação dos estudantes. “Assim, começamos a desenhar uma política de avaliações alternativas de acessibilidades pedagógicas dentro do Largo de São Francisco [local da faculdade]”, contou.
O universitário colaborou na construção da Política de Acessibilidade Pedagógica (PAP) da Faculdade de Direito da USP, uma das mais antigas e tradicionais do Brasil. A PAP, implantada em agosto de 2022, é direcionada aos alunos diagnosticados com transtornos globais do desenvolvimento, como o transtorno do espectro autista (TEA).
Para o presidente da Associação Nacional para Inclusão das Pessoas Autistas (Ania/BR), Guilherme Almeida, a Política de Acessibilidade Pedagógica é um potente regulamento em prol da garantia de direitos das pessoas neurodivergentes. Guilherme lembra que a PAP representa o cumprimento da Lei Brasileira de Inclusão, da Constituição Federal de 1988, e dos tratados internacionais de que o Brasil é signatário, em especial a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência de Nova York.
Segundo dados mais recentes do Censo da Educação Superior, de 2021, no Brasil, estão matriculados em cursos de graduação presenciais e a distância 4.018 pessoas com transtorno global do desenvolvimento (TGD). O transtorno do espectro autista (TEA) é um dos cinco tipos do TGD. Sendo assim, todos aqueles que têm algum grau de TEA possuem um TGD.
O censo é realizado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), instituição vinculada ao Ministério da Educação.
A PAP estabelece que os alunos que necessitem de atendimento pedagógico diferenciado poderão solicitar previamente adaptações de provas e demais atividades avaliativas e tempo adicional, local reservado ou assistência para realização das provas. Considerando as legislações brasileiras de inclusão, a política visa “superar limitações ordinárias e promover adaptações razoáveis destinadas a garantir condições de desempenho acadêmico”.
Para Silvano, a política é um dos passos para a inclusão das pessoas com o espectro autista, mas a maior barreira ainda são as atitudes das pessoas com os autistas.
“Não são barreiras de engenharia. Dependem de mudanças de atitudes, as pessoas têm mais dificuldades de mudar atitudes do que o formato de um prédio”, acrescenta. Silvano tem esperança de que as gerações futuras possam ser, de fato, incluídas no ensino superior.
(*) Com informações da Agência Brasil
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