Brasília (DF) – O governo brasileiro decidiu não assinar um comunicado conjunto dos Estados Unidos e mais dez países latino-americanos que “rechaçaram categoricamente” o reconhecimento da reeleição do ditador Nicolás Maduro na Venezuela.
Em paralelo, a União Europeia também afirmou que não vai aceitar a certificação encomendada por Maduro e emitida nesta quinta-feira, dia 22, pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) – a corte é a instância judicial máxima do país e jamais contraria o regime chavista.
Os governos de Argentina, Costa Rica, Chile, Equador, Estados Unidos, Guatemala, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai “rechaçaram categoricamente o anúncio do TSJ”. Esses mesmos países já haviam declarado que não reconheceriam a vitória de Maduro proclamada anteriormente pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE) venezuelano, sem base em dados transparentes. Segundo o grupo, tanto a corte suprema quanto órgão eleitoral na Venezuela carecem de “imparcialidade e independência”.
“Somente uma auditoria imparcial e independente sobre os votos, que avalie todas as atas, permitirá garantir o respeito à vontade popular soberana e a democracia na Venezuela”, afirmaram os países no comunicado conjunto, emitido na noite desta quinta, após a decisão do TSJ ser anunciada.
Em outra frente, Josep Borrell, alto representante da União Europeia para Assuntos Estrangeiros de Política de Segurança, disse nesta sexta-feira, dia 23, que o bloco não aceitará a certificação da corte chavista, sem que o tribunal emita qualquer documento comprobatório. “Estamos dizendo que este resultado eleitoral deve ser comprovado. Até o momento, não vimos nenhuma prova. Enquanto não virmos um resultado verificável, não vamos reconhecê-lo”, disse Borrell, que exerce função similar a de um chanceler dos 27 países do bloco.
Telefonema a Petro e pedido por transparência
Apesar do posicionamento dos demais países, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não se pronunciou sobre a decisão do Tribunal Supremo de Justiça. Ele telefonou na noite desta sexta-feira, dia 23, ao presidente da Colômbia, Gustavo Petro, para coordenar uma posição comum. Lula e Petro combinaram a publicação de uma nota conjunta, mas ela não deve ser divulgada nesta sexta.
Lula indicou que não está disposto a reconhecer a reeleição do ditador e aliado Nicolás Maduro, mesmo depois do endosso emitido por um tribunal controlado pelo regime. Segundo embaixadores a par das conversas, o governo não deve ceder nos fundamentos que defendeu até agora.
A expectativa é que o teor da nota de Brasil e Colômbia reitere as cobranças anteriores por transparência para respaldar o resultado eleitoral. O texto está sendo elaborado com atenção a quatro mãos, pelas chancelarias de Brasil e Colômbia. Os dois presidentes consideram relevante preservar canais de diálogo com o regime e opositores, uma porta para tentar influenciar futuramente na Venezuela.
A realização da chamada telefônica com Petro foi articulada nas últimas horas e rapidamente concretizada. Desde a manifestação oficial do TSJ, auxiliares de Lula entraram em cena para discutir que caminho tomar, diante da decisão de Maduro de tentar encerrar a disputa pela via judicial.
Desde o pronunciamento do TSJ, as tratativas diplomáticas incluíram telefonemas de alto nível político, entre o chanceler Mauro Vieira e seus homólogos da Colômbia e outros países da região.
Embaixadores envolvidos nas conversas entendem que o cenário está mais complicado e que deve aumentar agora a pressão sobre Maduro, depois que ele fechou ainda mais as portas a qualquer tentativa de mediação. O risco de recrudescimento do regime também preocupa.
Houve ao menos 23 mortes e entre 1,5 mil e 2,4 mil encarceramentos – sendo centenas de crianças e adolescentes. Entidades de direitos humanos e o regime chavista diferem na contagem, sendo que as forças oficialistas divulgam os números mais dramáticos, algo interpretado como uma estratégia de causar temor. Lideranças da oposição, como González e María Corina Machado, também estão na mira e disseram atuar agora escondidos na clandestinidade.
O TSJ validou a reeleição de Maduro na disputa presidencial realizada em 28 de de julho, em decisão que não surpreendeu o governo brasileiro. A corte, porém, não tornou públicos documentos que embasaram seu pronunciamento e decidiu colocá-los sob custódia judicial. O tribunal afirma ter conduzido uma perícia no material entregue pelo CNE e que sua decisão encerra o caso.
A presidente do TSJ, Caryslia Rodriguez, disse que os peritos “certificam inquestionavelmente o material da perícia e validaram os resultados emitidos pelo CNE onde Nicolás Maduro foi eleito”. “Com base nos resultados da perícia, concluímos que os boletins do CNE estão respaldados pelas atas emitidas pelas máquinas de votação e mantêm plena coincidência com o registros das bases de dados”, afirmou a magistrada.
O Estadão questionou a Presidência da República e o Itamaraty sobre o posicionamento oficial do País após a ratificação da reeleição na Corte, mas ainda não houve resposta.
A decisão do TSJ também tornou mais difícil que Lula atenda a um pedido de telefonema de Maduro, feito há mais de 20 dias. O petista sugeriu que Petro participasse. Desde então, ambos têm manifestado publicamente em entrevistas visões conflitantes.
(*) Com informações do Estadão
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