Manaus, 6 de maio de 2024
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Cenário

Especialistas analisam fala de Silas sobre não ser amigo de Lula

A declaração foi feita, devido a uma “pressão” que o parlamentar vem sendo alvo após assumir a presidência da Frente Evangélica.

Especialistas analisam fala de Silas sobre não ser amigo de Lula

(Fotos: Ricardo Stuckert/Divulgação/Câmara dos Deputados)

Manaus (AM) – O deputado federal Silas Câmara (Republicanos) concedeu, esta semana, uma entrevista ao jornal Folha de São Paulo, na qual ele afirmou que não é amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nem da esquerda, mas que é uma pessoa do diálogo.

A declaração foi feita, devido a uma “pressão” que o parlamentar amazonense vem sendo alvo após assumir a presidência da Frente Parlamentar Evangélica no Congresso, no atual Governo Federal que, segundo o próprio deputado, “tem pautas completamente na contramão do que eram as pautas do governo passado”, o qual ele apoiou.

De acordo com Silas, negar diálogo com os petistas iria contra a sua formação cristã e ao falar isso, o parlamentar citou um trecho da bíblia: “sempre que possível devemos ter paz com todos”.

O deputado federal – que exerce o seu sétimo mandato em Brasília – também já presidiu a Frente nos anos de 2019 e 2020, ainda na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Para o político não faz sentido ser acusado de proximidade com o PT, uma vez que segundo as suas próprias declarações, ele é “apenas uma pessoa do diálogo”. “Ser de diálogo não é ser aliado. Conversar não é ceder. Quem parla, conversa”, disse o deputado em um dos trechos da conversa.

Silas e, também, o evangélico, Eli Borges (PL), fizeram um acordo na eleição para a liderança da Frente Parlamentar, no início do ano e o resultado desse trato possibilitou a Silas reassumir o cargo, após quase três anos. O acordo é especificamente um revezamento entre os deputados até o ano de 2024, sendo que cada um terá o comando por um semestre durante esses dois anos.

Em um dos momentos da entrevista, o político afirma que é possível dar ao atual presidente o benefício da dúvida, mas que não encara Lula como um “aliado natural”.

“O horizonte permanece nublado por não conseguirmos ainda ler completamente o que pretende o governo em diversas áreas preciosas para a Frente”, argumenta.

Câmara chega a elogiar o início do governo petista na entrevista, ao afirmar que a atual administração do país tenta construir um caminho para que o diálogo seja restabelecido mediante políticas públicas que beneficiem “majoritariamente a comunidade evangélica”.

Desafiador

Na visão do deputado, a “ponte” entre o público o qual ele representa e o governo Lula pode até ser possível, mas não necessariamente provável. Para ele isso é muito desafiador, uma vez que o governo reafirma sua posição contra princípios que os evangélicos acreditam.

O político também demonstra que Bolsonaro ainda tem o seu apoio irrestrito, mesmo enfrentando polêmicas e investigações, como no caso das joias, além da inelegibilidade por oito anos.

Silas falou ainda sobre manter a “presença fortíssima” da bancada evangélica nas comissões do Congresso Nacional para que as pautas que possam, porventura, prejudicar o público sejam monitoradas com mais rigor e detalhes.

Quanto custa?

Para o cientista político, antropólogo e professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Ademir Ramos, a frase de Silas ao afirmar que não é amigo de Lula, nem da esquerda, mas é do diálogo é uma forma pragmática de perguntar: “quanto tal decisão que vou tomar custa?”; “quanto custa meu voto?”.

“Entenda-se por diálogo, o que chamamos na linguagem popular de ‘facada’, é o benefício próprio. Na verdade, o Silas é mais Silas do que o coletivo, do que o povo do Amazonas”, enfatizou o especialista.

O sociólogo falou que, na verdade, é de conhecimento que o deputado está hoje “na onda do Centrão”, mas que o mesmo só poderá se beneficiar disso, se ele realmente estiver organizado com esse bloco.

“Ele é um oportunista, interesseiro e particular-privado. Ele sabe que o presidente Lula precisa do Centrão para buscar certo equilíbrio. Isso é lamentável para nós do Amazonas, porque nós precisamos de deputados, uma bancada federal mais comprometida com as causas públicas populares, coletivas e ele não tem esse perfil”, destacou Ademir.

Ramos lembrou ainda que ano que vem é ano de eleição e, na sua visão, Silas Câmara deverá interferir de alguma forma no processo, buscando fazer uma base, uma ponte para o Senado futuramente e até para a disputa pela Prefeitura de Manaus.

O Portal AM1 também conversou sobre o assunto com o professor de ciência política da Ufam, Ludolf Waldmann Júnior.

Na visão de Ludolf, o deputado representa um comportamento bastante típico da bancada evangélica antes dos anos em que Bolsonaro esteve no comando do Brasil, que era a construção de um bloco de deputados que tinha a finalidade de ‘barganhar’ com o governo, numa espécie de troca, em que ofereciam votos para a agenda governista, recebendo benefícios por essa posição de adesão e, ao mesmo tempo, conseguiam bloquear ou ao menos enfraquecer as pautas mais progressistas que contrariavam as pautas mais conservadoras. Temas estes como o aborto, direitos dos LGBTQI+, dentre outros.

“De certa maneira, representa um novo reposicionamento após quatro anos em que a bancada teve uma ação mais propositiva durante o governo Bolsonaro, quando foi uma das bases de sustentação política do ex-presidente. As declarações do deputado evidenciam justamente esse reposicionamento, de um lado tentando evitar atritos ou rachar a bancada (em especial, com os setores mais radicalizados que predominaram durante o período Bolsonaro), mas, ao mesmo tempo, se mostrando aberto à negociação com o governo, algo que proporciona recursos e poder de agenda”, pontuou.

A reportagem também questionou o professor, se para ele a atitude do parlamentar é uma ação comum entre políticos brasileiros que se perpetuaram no poder.

Para Waldmann, é uma ação típica de deputados ligados a partidos mais fisiológicos, que se mantêm sempre abertos para barganha de votos com recursos e poder de agenda com o governo de ocasião.

“É uma estratégia legítima, típica das relações Executivo-Legislativo, que pode se mostrar muito bem-sucedida, já que o deputado tende a ganhar benesses (vantagens, privilégios) em particular, bem como recursos na forma de emendas parlamentares e possibilidade de indicação de aliados para postos de confiança na administração federal em troca dos votos de seu bloco parlamentar. Tais recursos são importantes na busca da reeleição, já que atendem demandas de seu eleitorado e lhe permitem aumentar sua influência junto a prefeitos e vereadores, que são importantes cabos eleitorais para deputados”, frisou Ludolf.

Polêmicas

O deputado já teve o nome envolvido em várias polêmicas. Uma delas foi o um processo que pedia a cassação do seu mandato por suposto crime de peculato, pela prática conhecida como “rachadinha”, no período de janeiro de 2000 a dezembro de 2001.

Segundo a denúncia, Silas, com o auxílio de um ex-secretário parlamentar, teria desviado, em proveito próprio, parte de recursos públicos destinados à contratação de sua assessoria parlamentar. Em resumo, o político recebia de volta uma parte no pagamento de servidores lotados em seu gabinete na Câmara dos Deputados.

Silas era acusado de suposta prática do crime previsto no artigo 312, § 1º, combinado com os artigos 29 e 71, todos do Código Penal.

O processo se arrastou por quase duas décadas, tramitando especificamente no Supremo Tribunal Federal (STF), desde o segundo semestre de 2015. Nesse período, o processo entrava e saía de pauta, sem uma definição.

No dia 1º de dezembro do ano passado, o ministro Luís Roberto Barroso, homologou um acordo de não persecução penal (ANPP) firmado entre a Procuradoria Geral da República (PGR) e Silas. O acordo era para que o parlamentar se comprometesse a pagar uma multa de R$ 242 mil em até 30 dias e após isso o processo contra ele seria extinto.

Em maio deste ano, a PGR informou que o processo que o deputado respondia por peculato havia sido extinto, após o pagamento do valor.

Câmara aguarda o julgamento de um embargo de declaração no Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE-AM) sobre sua prestação de contas da campanha do ano passado, desaprovada pela Corte por diversas irregularidades. O Ministério Público Eleitoral (MPE) emitiu um parecer pela rejeição dos embargos.

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