Manaus, 2 de maio de 2024
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Manaus, 2 de maio de 2024

Cultura

Falta de curso superior dificulta fazer cinema no Amazonas

O curso de Tecnologia em Audiovisual da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) formou duas turmas, sendo a última em 2018

Falta de curso superior dificulta fazer cinema no Amazonas

Bernardo Ale Abinader em atividade no curso de cinema da UEA (Foto: Reprodução/UEA)

Manaus (AM) – Com o Amazonas deixando de ser cenário e fornecedor de mão de obra para produções cinematográficas e assumindo o protagonismo na produção autoral e independentes, o setor de audiovisual passa a cobrar mais empenho do estado para cursos superiores ou técnicos na área. Uma demanda que também é vista como social.

O curso de Tecnologia em Audiovisual da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) formou duas turmas, sendo a última em 2018. Em 2021 passou a ser apenas de audiovisual, igualando-se aos demais cursos de bacharelado – dança, teatro, música e turismo – ofertados pela Escola Superior de Artes e Turismo (ESAT). Esperava-se a abertura de uma nova com o vestibular de 2023, o que não aconteceu.

Iniciativa própria

Enquanto não há aceno de novas turmas ou de cursos superiores voltados a produção cinematográfica, quem faz cinema no Amazonas, corre por fora e realiza com iniciativa própria, como no caso de Bernardo Ale Abinader, egresso e formado na segunda e última turma de cinema na UEA.

Abinader lamenta por essa escassez de um curso especializado em produção audiovisual. “Esta ausência de cursos gratuitos se configura como uma grande perda para a região em várias instâncias, seja impossibilitando os trabalhadores do audiovisual de Manaus em se aperfeiçoarem e realizarem um trabalho de maior qualidade, seja enfraquecendo a oportunidade de interação e trocas que um espaço acadêmico gera”, conta o diretor.

De acordo com Abinader, atualmente, quem deseja aprender audiovisual na cidade ou precisa sair do estado, ou dispõe de poucos cursos livres. “Essa situação acaba contribuindo também para tornar o nosso estado em um espaço de colonização do imaginário. As pessoas querem saber sobre nossas histórias, e a nossa região desperta interesses de todo mundo, seja pela importância da nossa floresta, ou pela potência estética de nosso rio e a sua instigante simbiose com a cidade”, explica.

Bernardo dirigiu e roteirizou o curta-metragem “O Barco e o Rio”, sua quarta obra, que fechou o Festival de Gramado em 2020, sabe muito bem das angústias de se produzir cinema na região e fala da repercussão de prêmios recentes e do que é produzido no estado. O diretor sente a necessidade de se ter um olhar nosso.

“Nossa realidade é que ainda são poucas as narrativas audiovisuais – sobretudo longas-metragens, realizadas aqui por pessoas daqui, e isso é uma consequência também da escassez de cursos e oportunidades de especialização. Muitas pessoas acabam tendo seus imaginários sobre Manaus e o Amazonas colonizados por estereótipos de filmes e narrativas criadas por pessoas de outras regiões”, afirma.

“O grande público, por esse motivo, desconhece nossas histórias, subjetividades e dinâmicas sociais, pois o acesso às nossas imagens geralmente são intermediadas por olhares de fora”, lamenta Abinader.

Frame de “Zico, o Jabuti” curta-metragem independente de Jimmy Christian (Foto: Reprodução)

Cinema como demanda social

Professor universitário, cinéfilo e nas primeiras incursões ao cinema independente como roteirista, produtor e ator, Max Caracol também se ressente da falta de um curso superior de audiovisual no estado. A falta de continuidade do curso da UEA, entretanto, não impediu a evolução do cinema amazonense, apesar da lacuna deixada.

“Houve uma época em que éramos apenas figurantes. Os produtores aqui serviam como fornecedores de mão de obra barata, arranjar figurantes para filmes feitos aqui por gente de fora. Agora estamos nos qualificando, temos profissionais que tratam do figurino à manipulação tecnológica. O Amazonas não mais um espaço periférico que fornece mão de obra barata”, comenta Max.

“Temos profissionais valiosos e valorosos que querem se inserir no mercado e produzir coisas. Penso que é a vez de forçarmos, no sentido positivo da palavra, a volta de mais uma turma e formarmos efetivamente um curso superior na UEA, para contemplar todas essa mão de obra que vem se aperfeiçoando a décadas”, disse.

Max Caracol: “É uma demanda social qualificar esses profissionais, porque o momento é esse!” (Foto: Acervo pessoal)

A busca por cursos livres, inclusive online tem sido a saída para quem almeja produzir no Amazonas, conta Max. “Por conta da ausência de um espaço público e físico de qualificação, procuramos o que nos é ofertado. Muitos desses cursos são excelentes, mas uma graduação física seria essencial”, ressaltou.

“O retorno social de um investimento como esse seria enorme, incalculável. Isso exige concurso, estruturação e investimento. E a boa vontade política, fundamentalmente. Seria muito relevante agora que o cinema no Amazonas está em pleno curso, tem gente filmando com técnica ou sem, usando aparelhos celulares ou equipamentos de ponta, então existe uma produção incalculável. Hoje um curso de graduação na área é uma exigência social. É uma demanda social qualificar esses profissionais, porque o momento é esse!”, frisou Max.

Roteiro e direção

Bernardo Abinader irá ministrar entre os dias 3, 10, 17 e 34 de junho e 01 de julho, um curso de roteiro e direção de cinema. As aulas acontecerão no Centro Cultural Palácio da Justiça do Amazonas, na Avenida Eduardo Ribeiro, 901 – Centro. O curso tem vagas abertas para 40 os participantes que serão anunciados no dia 17.

Conforme Abinader, o curso visa colaborar para melhorar a ausência da graduação superior no estado. “Apesar de ter uma escala pequena em comparação a um curso superior completo, procurei preparar os alunos interessadas em cinema da região a dar seus primeiros passos. Procurei oferecer o curso mais completo possível no tempo delimitado que, além de abarcar os alicerces e fundamentos da escrita de um roteiro e da direção cinematográfica, também trouxesse um olhar amazônico”, conta.

Diretor Bernardo Abinader frente a turma de abril do curso de roteiro e direção (Foto: Acervo pessoal)

Na última turma de abril houve discussões e reflexões acerca do meio audiovisual manauara, bem como o compartilhamento de experiências minhas que, além de professor, também sou um realizador manauara.

“Tive cerca de 30 alunos que frequentaram as aulas. A faixa etária foi entre 20 e 30 anos, mas tive também uma aluna adolescente e algumas mais velhas. Ainda vou aguardar para ver o que esses alunos vão trazer para o nosso cenário, mas tenho grandes expectativas. A grande maioria deles se mostraram muito interessados e com ideias interessantes e inovadoras”, encerrou o diretor.

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