Manaus, 24 de abril de 2024
×
Manaus, 24 de abril de 2024

Brasil

Justiça impede prefeitura de interditar e demolir sem aviso na cracolândia

Justiça impede prefeitura de interditar e demolir sem aviso na cracolândia

Decisão estipula multa diária de R$ 10 mil caso a prefeitura promova a remoção, interdição e demolição. (Foto: Eduardo Ogata/Secom)

A Justiça de São Paulo concedeu, na tarde desta quarta-feira (24), uma liminar (decisão provisória) contra a demolição compulsória de imóveis na região da cracolândia, no centro de São Paulo, e remoção de moradores sem encaminhamento para programas de saúde e habitação.

A decisão do juiz Luis Manuel Fonseca Pires, da 3ª Vara de Fazenda Pública, ocorre por solicitação da Defensoria Pública devido às ações do governo João Doria (PSDB) após a operação policial do último domingo (21), e estipula multa diária de R$ 10 mil caso a prefeitura promova a remoção, interdição e demolição.

A decisão desta quarta não tem relação com o pedido da prefeitura para que a Justiça autorize a internação de usuários de droga à força, feito na noite de terça e que continua sem resposta judicial.

“A demolição de algumas casas foi executada (…) apesar da presença de moradores, aos quais não foi conferida a oportunidade, conforme alegado pela autora, de retirada de objetos pessoais, documentos, tampouco foram orientados ou encaminhados para a programas sociais de habitação e saúde”, aponta a decisão.

Procurada, a prefeitura afirmou que concorda com a decisão. “Nunca foi intenção fazer intervenções em edificações ocupadas sem que houvesse arrolamento prévio de seus habitantes. O cadastramento das famílias já está sendo feito. As pessoas que aceitarem desocupar os imóveis serão encaminhadas para opções de habitação social. Aqueles que não aceitarem deverão ser objeto de ações judiciais. A liminar, portanto, será respeitada integralmente, porque já é o que determina a lei”, diz em nota.

Apesar da afirmação da prefeitura, a Folha falou, na terça-feira (23), com comerciantes que tiveram prazos de uma ou duas horas para retirar todos os pertences dos seus estabelecimentos, e outros que tiveram os imóveis emparedados com tudo ainda dentro.

Foi o caso da comerciante Magnólia Porto Coutinho, 45, que tem um bar na rua Helvétia há quatro anos. “Um guarda entrou, disse que eu não tinha extintor e, por isso, seria fechado. Não deram tempo de eu tirar nada”, disse ela.

Dentro do imóvel, ficaram freezers, geladeiras, fogão e alimentos que seriam usados para a produção de marmitas. “O guarda só disse assim: ‘se vira’. Eles acham que todo mundo aqui é bandido, é viciado,. Não é assim, aqui também tem gente honesta e trabalhador”, relata Magnólia. Ela pagava R$ 900 de aluguel pelo imóvel.

Também na terça, uma escavadeira da prefeitura iniciou a demolição de uma pensão na alameda Dino Bueno com três pessoas ainda dentro. Os três moradores do imóvel tiveram ferimentos leves. O prefeito, que estava na região no momento do acidente, deixou o local em seguida.

“Idosos, pais de família, mulheres com crianças, que habitam o local há muito tempo, estavam tendo os imóveis interditados. Pessoas com direito de usucapião tiradas de casa da noite para o dia. Falamos com um idoso que ficou em situação de rua sem ter uma Gillette para passar na cara”, diz o defensor público Rafael de Paula Eduardo Faber.

O defensor afirmou que há imóveis emparedados até com animais de estimação e comércio com alvará provisório. Segundo ele, com a decisão das Justiça, as pessoas agora poderão retornar para pegar seus pertences e a prefeitura fica impedida de fazer novas remoções sem que seja dado atendimento de saúde e habitacional.

Por conta das ações dos últimos dias, Doria e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) enfrentaram protesto nesta quarta na região da cracolândia. Os dois anunciariam a construção de novos empreendimentos imobiliários para revitalizar a região da Luz, mas acabaram deixando o local às pressas.

Procurada, a prefeitura ainda não se manifestou sobre a decisão desta quarta.

Fonte: Folha de S. Paulo