Manaus, 17 de maio de 2025
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Cenário

Mães no Parlamento: ocupar espaços é importante mesmo em meio a desafios

O campo político foi, por muito tempo, ocupado apenas por homens; mesmo com tantas conquistas, mães com mandatos ainda são alvo de preconceitos por inúmeros fatores.

Mães no Parlamento: ocupar espaços é importante mesmo em meio a desafios

(Fotos: Redes Sociais)

Manaus (AM) – Por muito tempo, as mães foram vistas na sociedade como pessoas que deveriam se limitar à dedicação aos filhos, esposo e casa, ou seja, o trabalho de cuidado. No entanto, essa realidade vem mudando com o passar dos anos, devido às lutas, desafios enfrentados e conquistas alcançadas.

Uma dessas conquistas é o fato de, atualmente, os Parlamentos contarem com a atuação dessas mães, que por meio de seus mandatos, contribuem para a melhoria da vida de outras mães e mulheres na sociedade.

Essas mães cuidam de um dos seus bens mais preciosos e, ao mesmo tempo, se tornam vozes importantes para a conscientização dos direitos de cada mulher. Tais mulheres, inclusive, que ainda sofrem com o preconceito no trabalho; como amamentar um filho em público, por exemplo. Em muitos outros casos, que sofrem rejeição, a partir do momento que engravidam e precisam se afastar das atividades profissionais por um período.

As mães que hoje possuem mandato na Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) são: Alessandra Campêlo (Podemos); Joana Darc (União Brasil); Mayara Pinheiro (Republicanos) e Mayra Dias (Avante).

Já na Câmara Municipal de Manaus (CMM), o time das mães é composto por Glória Carratte (PSB), Professora Jacqueline (União Brasil) e Yomara Lins (Podemos).

Ganho de espaço x dificuldades constantes

A deputada estadual Joana Darc entende bem sobre o assunto, já que é mãe do pequeno Joaquim, de três anos, e da Ana Darc, que está com um mês e meio de vida.

Joana disse ao Portal AM1 que conciliar a maternidade e o Parlamento é um desafio marcante e que as mães ganharam espaço, aos poucos, mas que as dificuldades não param, e que, na verdade, essas dificuldades só aumentam na visão da parlamentar.

A deputada lembrou à reportagem que, quando se tornou mãe, era deputada de primeiro mandato, e enfatiza que os primeiros meses após o nascimento são essenciais e, por esse motivo, lutou para que o direito à licença-maternidade fosse contemplado no Regimento Interno da Casa Legislativa.

“Nunca uma deputada mãe tinha tirado licença-maternidade até 2021, quando fiz um projeto para a licença-maternidade na Assembleia do Amazonas. A dificuldade vai aumentando, aos poucos, pois para quem tem um mandato ativo, como o meu, precisa se abster de muitos momentos da infância dos filhos para se dedicar à luta pela população e, no meu caso, pelos animais do estado. Muitas vezes, a falta de apoio faz parte do dia a dia de uma mãe”, afirmou.

Darc lembrou, ainda, do recente episódio em que foi cobrada na Aleam sobre a tramitação de um projeto de lei na Comissão de Proteção aos Animais, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, a qual ela preside, mesmo estando de licença-maternidade e a Comissão possuindo outros membros que poderiam ser cobrados e seguirem com os trabalhos.

“Não adianta lutar por mais mulheres na política apenas. Precisamos apoiar as mulheres mães que já atuam na política também”, desabafou a deputada.

Para Joana, a existência de mães em um Parlamento é de grande importância, porque só elas sentem e sabem a real necessidade de propor aquilo que é necessário para outras mães. Ela destaca, nesse sentido, que ter homens propondo uma lei para as mulheres é uma coisa; agora, ter mães legislando para outras mães, sejam elas atípicas ou não, é algo que escancara o machismo na esfera pública.

“A gente deixa de viver o tempo com os filhos para cuidar do Amazonas, pensando nas mulheres de maternidades atípicas, como as mães com filhos autistas, com Síndrome de Down ou as mães de crianças traqueostomizadas. E a falta de apoio é a dificuldade principal que qualquer mãe enfrenta, seja deputada ou não. Nós precisamos de apoio, seja no trabalho, na família ou na sociedade”, frisou.

Evolução significativa

Para Mayra Dias, mãe do Henry e da Maya e ocupa uma das 24 cadeiras do Legislativo Estadual, a mãe atuando num Parlamento é um grande desafio, que também mostra a versatilidade, a força e a resiliência da mulher que precisa se adaptar a todas as adversidades.

Na visão da deputada, a conscientização sobre a importância da presença feminina e materna no Parlamento tem crescido – o que ajuda a aliviar os desafios que permanecem.

“Houve uma evolução significativa. Se antes tínhamos apenas uma deputada na Assembleia Legislativa, agora, temos cinco. Esperamos que esse número continue aumentando, pois as mulheres têm muito a contribuir para a vida política do país. Sem dúvida, cada dia é um aprendizado, a Mayra de hoje é mais forte, resiliente e determinada a fazer o melhor pela população”, disse.

Mayra afirmou também que a questão da licença-maternidade ainda é um tema delicado, assim como o julgamento de pessoas, principalmente homens, que muitas vezes não entendem os direitos das mulheres.

“Ainda há um longo caminho a percorrer para garantir que as mães no parlamento sejam plenamente respeitadas e apoiadas em suas funções legislativas. Tenho trabalho com leis que são voltadas para a mulher como a lei de minha autoria, que combate o preconceito e gera oportunidade de trabalho para as mães solo, a lei de incentivo ao empreendedorismo para jovens, mulheres e a terceira idade, entre outras que foram sancionadas”, explicou.

Conciliar papéis

O Portal AM1 também conversou com a vereadora Professora Jacqueline sobre o trabalho de uma parlamentar mãe na Câmara Municipal. A vereadora, que é mãe de três filhos, defendeu que as mulheres precisam aprender a votar em mulheres.

Na opinião de Jacqueline, a luta de uma mulher que é mãe e atua no Parlamento é um desafio significativo, pois precisa equilibrar suas responsabilidades políticas com os cuidados familiares, fazendo com que isso se torne um esforço constante para conciliar esses dois papéis exigentes.

“Apesar de alguns avanços, as dificuldades ainda persistem. Embora haja uma aceitação das mulheres no cenário político, sendo minoria ainda, as pressões sociais e as expectativas tradicionais ainda podem dificultar a participação plena das mães no parlamento. Nós, mulheres, precisamos aprender a votar em mulher. Somos 53% do eleitorado, porém, nós temos uma representatividade muito baixa, que é 10%. Então, isso persiste nesse preconceito com a mulher estar presente nesses espaços de decisão. A presença da mulher ainda é muito tímida no parlamento’, pontuou.

A parlamentar disse ao Portal AM1 que a ideia de que as mulheres devem se limitar ao papel de cuidadoras ainda persiste, o que pode dificultar o reconhecimento de suas habilidades e contribuições no âmbito político.

No entanto, para ela, isso pode ser mudado, porque assim como as mulheres dominam os afazeres em casa, elas podem muito bem dominar os trabalhos políticos.

“Mães no Parlamento enfrentam desafios como a falta de políticas de conciliação entre trabalho e família, horários de trabalho inflexíveis e estigma relacionado à maternidade, que pode afetar sua credibilidade e capacidade de atuação política. Essas questões precisam ser abordadas para garantir uma representação verdadeiramente inclusiva e eficaz”, destacou a vereadora.

 

Tarefa árdua

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(Foto: Arquivo Pessoal)

Conforme a professora, socióloga e doutora em Filosofia Política, Ivanilce Chagas, após muito tempo de luta e, apesar, da efetiva representativa feminina no Parlamento, hoje, ainda existem inúmeros entraves para a participação feminina nesse espaço e a maternidade termina por dificultar a entrada e permanência das mulheres na política.

“As dificuldades impostas às mulheres e, especialmente, às mães e a sobrecarga de tarefas indicam a permanência de entraves à representação feminina no Parlamento. Especialmente, as mulheres da classe trabalhadora, os entraves se sobrepõem de maneira mais acentuada pela falta de uma rede de apoio, pela falta de vagas nas creches, pela falta de assistência social que possa favorecer o seu envolvimento com assuntos da política representativa. É importante que as mulheres que são mães, também sejam representadas nos espaços de poder e decisão política, não apenas por uma questão quantitativa, mas pela representatividade e prática de políticas públicas que atendam às suas demandas”, defendeu a socióloga.

Ivanilce abordou, ainda, o fato de o campo político ser historicamente reconhecido como um espaço puramente masculino e, por isso, a inferioridade feminina foi naturalizada e elas foram excluídas dos espaços públicos de poder e decisão. Porém, segundo ela, devido às inúmeras frentes de lutas que se desenharam ao longo do tempo, a mulher foi se situando na posição de protagonista na vida pública.

Na visão da professora, entre as dificuldades impostas às mães no exercício parlamentar, existem os entraves estruturais, os espaços institucionais, e, sobretudo, os espaços políticos, que não são pensados para abrigar mães.

“Não existem trocadores nem espaço para amamentação ou cuidados básicos, por exemplo, nos espaços públicos de poder. Na Câmara Federal, por exemplo, fatores como os horários das sessões, o tempo de licença-maternidade, que é de somente quatro meses, são dificuldades impostas às mães. No geral, existe um impedimento até para elas se lançarem candidatas, pela ausência de uma rede de apoio para o cuidado dos filhos enquanto atuam num parlamento”, destacou.

Chagas afirmou, também, que a manutenção da centralidade do trabalho de cuidado na figura da mulher é uma das barreiras que impede muitas mulheres de sequer cogitar participar da política.

Ainda segundo a professora, diante da responsabilidade de uma dupla e até tripla jornada diária, tendo que conciliar a vida doméstica com o trabalho ou outras tarefas, faz praticamente com que elas anulem as possibilidades e interesses no exercício da política.

 

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