Brasil – A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que visa a redução da jornada de trabalho foi o principal tema político da semana no cenário nacional. A iniciativa partiu da deputada federal Erika Hilton (PSoL-SP), que mobilizou as redes sociais em busca de apoio parlamentar para levar a discussão ao Congresso Nacional.
Com o número mínimo de assinaturas atingido, o debate sobre o tema ganhou força, impulsionado por manifestações de trabalhadores em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Fortaleza, Vitória e Porto Alegre. No entanto, algumas dúvidas sobre os impactos da PEC, especialmente no campo econômico, ainda permanecem.
Para esclarecer as questões levantadas, o Portal AM1 conversou com dois economistas, que explicaram as possíveis implicações da proposta.
De acordo com o economista e consultor empresarial Lauro Brasil, a medida pretende “melhorar a qualidade de vida dos trabalhadores”, proporcionando mais tempo para lazer, saúde e educação, sem comprometer a remuneração. Ele acredita que a proposta pode estimular a produtividade, já que trabalhadores descansados tendem a ser mais eficientes, além de contribuir para a criação de empregos de qualidade ao distribuir melhor a carga de trabalho.
“Espera-se que a medida estimule a produtividade, uma vez que trabalhadores descansados tendem a ser mais eficientes. Além disso, busca-se fomentar a criação de empregos de qualidade, distribuindo melhor a carga de trabalho entre a força laboral”, explicou Lauro Brasil em entrevista ao AM1.
Em contrapartida, o vice-presidente do Conselho Regional de Economia do Estado do Amazonas, Altamir Cordeiro, alerta que a redução da jornada pode gerar desemprego, principalmente devido às características do mercado de trabalho brasileiro. Segundo ele, a realidade do Brasil é diferente de países desenvolvidos que já adotaram a medida.
“É preciso ter cautela para poder abordar esse tema. Pois a realidade brasileira é muito diferente dos países mais desenvolvidos que estão experimentando a redução da jornada de trabalho. Os empregos no Brasil, são em sua grande maioria de baixa qualificação e intensiva de mão de obra. Adotar uma mudança sem os devidos cuidados pode resultar em menos empregos e não ao contrário”, afirmou Cordeiro.
Impactos Econômicos e Trabalhistas
Outra dúvida recorrente diz respeito ao possível impacto da PEC na economia. Altamir Cordeiro acredita que a redução da jornada pode afetar alguns modelos econômicos no Brasil, especialmente considerando a recente reforma tributária. Ele sugere que a medida poderá aumentar os custos operacionais, afetando a viabilidade de algumas atividades econômicas.
“A grande realidade dos empresários é que a mudança poderá aumentar os custos operacionais e inviabilizar certas atividades econômicas. Atualmente, o Brasil está regulamentando a reforma tributária, que ainda não definiu qual será a carga tributária imposta aos empresários nem de que forma a economia brasileira reagirá. Portanto, esse tema entra no cenário político, colocando, de um lado, os trabalhadores e, de outro, a classe empresarial”, comentou Cordeiro.
Por outro lado, Lauro Brasil acredita que as preocupações sobre o impacto negativo não são unânimes. Embora reconheça que a medida possa resultar em fechamento de negócios ou realocação de empresas para países com custos trabalhistas mais baixos, ele argumenta que os dados sobre esse efeito não são uniformes.
“Embora exista a preocupação de que a medida possa levar a um aumento nos custos das empresas, resultando em fechamento de negócios ou realocação para países com custos trabalhistas mais baixos, os dados não são uniformes. Por exemplo, na França, a introdução da jornada de 35 horas foi criticada por dificultar a competitividade em alguns setores, mas em grandes corporações, houve adaptação sem perda significativa de produtividade”, observou Lauro Brasil.
Setores Impactados pela PEC
Na avaliação de Lauro Brasil, os setores de tecnologia podem ser os mais beneficiados pela redução da jornada, enquanto áreas como manufatura e agricultura enfrentariam mais dificuldades. Ele acredita que setores que dependem mais de resultados qualitativos, como tecnologia e serviços, têm mais chances de se adaptar positivamente.
“Os setores de alta tecnologia e serviços podem se beneficiar, já que frequentemente dependem mais de resultados qualitativos do que de carga horária. Por outro lado, setores como o de manufatura e agricultura, que exigem intensa mão de obra, podem enfrentar mais dificuldades”, afirmou.
Para Altamir Cordeiro, no entanto, a redução da jornada pode impactar negativamente os principais setores empregadores do Brasil, como indústria, comércio e serviços. Segundo ele, o efeito na economia seria grande e negativo, pois a maioria desses setores depende de mão de obra intensiva.
“Os setores que terão maiores impactos com a adoção da redução da escala 6/1 seriam os principais empregadores do país: o segmento industrial, o comércio, bares e restaurantes, e a construção civil. O impacto na economia seria muito grande e negativo. Não podemos comparar empregos no setor de tecnologia, com profissionais bem qualificados que podem trabalhar remotamente de qualquer lugar, com aqueles que exigem uso intensivo de mão de obra”, explicou Cordeiro.
Adaptações e Incentivos para as Empresas
Lauro Brasil sugere que, para facilitar a transição, o governo pode adotar políticas de apoio, como incentivos fiscais e linhas de crédito para empresas em processo de adaptação. Além disso, a automação e o investimento em tecnologia seriam estratégias importantes para compensar a redução da força de trabalho.
“Políticas de apoio, como incentivos fiscais e linhas de crédito específicas para empresas em transição, são fundamentais. A automação e o investimento em tecnologia para otimizar processos também podem ser soluções viáveis para compensar a redução da força de trabalho”, afirmou Brasil.
Altamir Cordeiro, por sua vez, destaca que a implementação de uma jornada reduzida exigiria uma reformulação nas leis trabalhistas e a redução da carga tributária para as empresas, de modo a equilibrar o aumento dos encargos sociais.
“A implantação de uma jornada reduzida exigiria uma reformulação nas leis trabalhistas e uma menor carga tributária para as empresas, de modo a compensar o aumento dos encargos sociais”, concluiu Cordeiro.
Experiência Internacional
A redução da jornada de trabalho foi adotada por diversos países, com resultados variados. Na visão de Lauro Brasil, países como Islândia e Nova Zelândia obtiveram resultados positivos, como o aumento do bem-estar e a manutenção da produtividade. No entanto, na França, a medida de 35 horas foi criticada por dificultar a competitividade em alguns setores, e no Japão, a mudança enfrentou resistência cultural.
“Nos casos de impacto negativo, a falta de políticas adaptativas foi um problema. A França, por exemplo, viu a medida de 35 horas ser criticada por ter criado rigidez sem atender às necessidades específicas de alguns setores. Esses exemplos ilustram que a flexibilização bem-sucedida exige planejamento cuidadoso e personalização para atender às necessidades econômicas e sociais”, explicou Brasil.
Por outro lado, Altamir Cordeiro alerta que as realidades dos países que adotaram a redução da jornada de trabalho são muito diferentes da brasileira. Ele defende que, para o Brasil, essa medida não seria viável no momento atual, dada a necessidade de reformas estruturais para garantir um crescimento econômico sustentável.
“A realidade dos países que estão estudando a redução da jornada de trabalho ou que já estão implantando essa medida é muito diferente da realidade brasileira. Só com estabilidade econômica e política, o Brasil poderá oferecer mais empregos e renda para a população e, assim, poderemos falar em redução da jornada de trabalho”, concluiu Cordeiro.
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