Manaus, 18 de abril de 2025
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Cidades

Polícia é acionada para expulsar mães de crianças autistas da Prefeitura de Itacoatiara

Mulheres realizavam uma manifestação pacífica na sede da prefeitura em busca da publicação de uma lei que beneficia as crianças.

Polícia é acionada para expulsar mães de crianças autistas da Prefeitura de Itacoatiara

(Foto: Divulgação)

Itacoatiara (AM) – Mães de crianças autistas precisavam sair da Prefeitura de Itacoatiara (a 270 quilômetros de Manaus), nesta sexta-feira (5), após a Polícia Militar ser acionada para encerrar uma manifestação pacífica que elas estavam realizando.

Em busca da publicação de uma lei que tornava a Associação Estimular de Utilidade Pública, as mulheres ocupavam a prefeitura desde as primeiras horas da manhã e prometiam sair somente após serem atendidas pelo prefeito Mário Abrahim, o que não foi possível.

“Queriam nos expulsar, mas não aceitamos. Apenas saímos da prefeitura depois de sermos orientadas pelo nosso advogado. Nosso objetivo era somente que o prefeito, ou alguém abaixo dele, publicasse a lei. Ele não precisava nem olhar na minha cara, mas que atendesse essas crianças. Nós atendemos 156 crianças em nossa associação e essa lei iria nos ajudar a buscar recursos para dar continuidade nas nossas ações”, destacou Bruna D’Ândelis, presidente da associação.

A prefeitura encerra as atividades na sede do Executivo as 13h. Com isso, acionou a polícia para expulsar as mulheres do local e convocou a Associação de Atendimento e Apoio ao Autista – Estimular para uma reunião na próxima terça-feira (9) para conversar sobre o assunto. Segundo a entidade, a publicação da lei é aguardada desde agosto de 2023, quando o projeto foi aprovado pelos vereadores da Câmara Municipal de Itacoatiara. Quase um ano depois, a medida ainda segue parada, impedindo a Estimular de buscar recursos.

Com lei publicada no Diário Oficial dos Municípios do Amazonas (DOM), os benefícios da associação podem começar a valer. De acordo com a Estimular, hoje seria o último dia para a prefeitura publicar a medida, por conta das restrições eleitorais que obrigam o prefeito Mário Abrahim a se afastar das suas funções como gestor.

“A gente não queria confusão, mas acionaram a polícia para nos retirar. Não somos bandidos ou vagabundo. Aqui não é a casa do povo? Estamos atrás de um direito que é nosso, não estamos pedindo favor ao prefeito. E infelizmente, me senti muito humilhada. Eles não sabem o que é ser uma mãe de autista; nós sofremos diariamente e nossos filhos precisam de atendimento contínuo, todos os dias”, desabafou Soraya Cordovil, mãe de criança autista.

Para o advogado e vereador Arnoud Lucas, a falta de publicação da Lei causa indignação não somente para as mães, mas para toda Itacoatiara. Segundo o parlamentar, além das crianças, a própria prefeitura seria beneficiada com a Lei, já que os atendimentos na Associação Estimular ajudariam a ‘desafogar’ as filas da esfera municipal.

“Fica a minha indignação. Não se chama polícia para mulheres, mães de crianças autistas. Isso é jogar muito baixo, porque essa prefeitura não tem dono. O dono da prefeitura é o povo e essas mães estavam ali de forma ordeira e pacífica. Não se chama polícia para mães de família, pelo contrário, se ajuda essas pessoas”, lamentou Arnoud Lucas.

Entenda o caso

Em julho do ano passado, a Câmara Municipal de Itacoatiara aprovou o projeto que concede o título de Utilidade Pública para a Associação Estimular. A entidade sem fins lucrativos atendia, na época, cerca de 90 crianças diagnosticadas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e precisava vender rifas, cachorro-quente, e pedir ajuda financeira para arcar com as despesas da instituição. Hoje, o número de crianças que precisam do atendimento chega a 156.

O projeto de lei, aprovado pelos parlamentares, era de autoria do vereador e advogado Arnoud Lucas. O texto foi encaminhado para o Executivo municipal e vetado pelo prefeito Mário Abrahim. Os vereadores, mesmo mantendo o veto do gestor, por outro lado, se mobilizaram internamente para aprovar o benefício por meio de um decreto.

Com isso, para valer como Lei, a utilidade pública precisava apenas ser publicada no Diário Oficial pelo prefeito Mário Abrahim. Desde julho de 2023, as mães aguardam.

“Hoje foi a gota d’água. Até agora, não entramos na Justiça porque não queríamos briga. Pelo contrário, sempre buscamos o diálogo. Esperamos quase um ano, mas hoje seria o último dia. Não queremos esperar mais seis meses e ver o sofrimento dessas crianças, precisamos que o prefeito faça sua parte!”, pontuou Bruna D’Ângelis.

Sem atendimento

Após não serem atendidas pelo prefeito Mário Abrahim na sede da Prefeitura de Itacoatiara, as mulheres foram orientadas pelo advogado e vereador Arnoud Lucas a procurar a Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DPE-AM).

À reportagem, a defensora pública Camila Campos de Souza, coordenadora do polo da DPE-AM em Itacoatiara, destacou que o Defensoria acolheu a associação e que o caso deve receber acompanhamento.

“Tomamos fé da situação na data de hoje, justamente, por conta da comoção e por meio da polícia. Desde já, nos dispusemos a receber a presidenta da Associação, pegamos o contato e vou repassar [a causa] ao defensor responsável pela atuação. Reforçamos que nossa atuação é judicial, mas também acompanhamos casos extrajudiciais de interesse de pessoas vulneráveis”, frisou.

A prefeitura

A reportagem entrou em contato com a Prefeitura de Itacoatiara solicitando informações sobre o caso e esteve, na sede do Executivo municipal, para reforçar o pedido. Por meio da secretaria, a prefeitura informou que vai se posicionar sobre a demanda por meio de uma nota oficial. Até a publicação da matéria, o documento não foi divulgado.

 

(*) Por Bruno Pacheco, repórter especial do AM1

 

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