Manaus, 18 de maio de 2024
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Cenário

Decreto 037/2017, de Iranduba, e o risco da passagem municipal mais cara da Região

Decreto 037/2017, de Iranduba, e o risco da passagem municipal mais cara da Região

Por Ricardo Gomes*

Linhas Gerais sobre Concessão dos Serviços Públicos de Transporte Público nos municípios.

A regra original sobre Serviços Públicos é a que deveriam ser prestados diretamente por  ente público (União, Estados e Municípios), mas o Poder Publico:

⁃ Sempre se revelou um péssimo prestador de serviços, quando observado o critério qualidade; – Na visão dos melhores Doutrinadores, para realmente ser eficiente, deve se deter em regulamentar e fiscalizar, daí a própria CF, em seu artigo 175, prevê expressamente a concessão de Serviços Públicos, que em linhas gerais foi regulamentada pela Lei Federal 8987/1995, onde, segundo o parágrafo único do artigo primeiro, Todos os Estados-Membros e Municípios, caso a caso, de acordo com suas peculiaridades deveriam, vale dizer, há 22 anos, ter editado, através de suas Assembleias Legislativas e Câmara de Vereadores, Leis Estaduais ou Municipais, sem confronto com as Normas Superiores, especificando os detalhes fundamentais dos Serviços que iriam conceder, é a chamada descentralização, que obviamente deveria conter uma estrita observância aos princípios da finalidade e interesse público, com eficácia e eficiência .

No geral, quando a Administração Pública deseja repassar a execução de determinado serviço público de sua competência para a iniciativa privada pode fazê-lo mediante autorização, permissão ou concessão (art. 21, XII, e art. 175, CF/88).

Segundo a previsão da Lei nº 8.987/95, em seu art. 2º, II, concessão de serviço público “é a transferência da prestação de serviço público, feita pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, mediante concorrência, a pessoa jurídica ou consórcio de empresas, que demonstre capacidade para o seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado”.

Concessão, então, é a delegação contratual da execução de serviço, originalmente de competência do Poder Público, através de licitação, na modalidade concorrência.

Há concessão também para execução de obra pública ou uso de bem público. 

Em qualquer caso, o particular vai explorar a atividade ou bem por sua conta e risco, nas condições e pelo prazo previstos na legislação e no contrato.

O contrato é bilateral (acordo de vontades, interesses contraditórios e efetivos jurídicos para ambas as partes), com natureza jurídica administrativa, ou seja, sujeito ao regime jurídico de direito público, marcado especialmente pela presença da cláusulas exorbitantes e submissão ao interesse público.

Assim, os contratantes têm liberdade relativa ao estipular as cláusulas, podendo negociar prazo, remuneração etc., mas ficando adstritos também às regras legais de finalidade, forma, mutabilidade, procedimentos etc.

Ressalto, uma vez mais, que por essa via se transfere tão somente a execução do serviço, obra, ou uso de bem público; a titularidade permanece com o Poder Público. 

A isso se chama delegação. 

O caso de transferência de titularidade denomina-se outorga, e se opera somente mediante lei, como é o caso das autarquias, por exemplos.

Aliás, acrescente-se que autarquias e fundações também podem receber concessão de serviço público, que a doutrina denomina de concessão legal de serviços públicos.

Sobre a necessidade de autorização legislativa, veja o que determina a Lei nº 9074/1995, em seu art. 2º:

“É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios executarem obras e serviços públicos por meio de concessão e permissão de serviço público, sem lei que lhes autorize e fixe os termos, dispensada a lei autorizativa nos casos de saneamento básico e limpeza urbana e nos já referidos na Constituição Federal, nas Constituições Estaduais e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e Municípios, observado, em qualquer caso, os termos da Lei nº 8.987/95.”

Resumindo, temos as principais características das concessões e concessionários:

  • É delegação de serviço público, obra ou uso de bem público, feita pelo poder concedente (União, Estados-membros, Distrito Federal ou Municípios) em cuja competência se encontra o serviço delegado;
  • Não transfere a titularidade, somente a execução o ou uso;
  • Efetivada através de contrato bilateral, precedido de licitação, na modalidade concorrência (art. 175, CF/88);
  • Contrato é de natureza administrativa, ou seja, sujeito às regras do direito público;

o Cabe à União fixar normas gerais de contratação, em todas as modalidades (art. 22, XXVII, CF/88);

  • A execução do serviço pelo concessionário é por sua conta e risco, e é paga mediante tarifa, com natureza de preço público;
  • Concedente fixa normas de prestação do serviço ou uso do bem público, fiscaliza, impõe sanções e reajusta tarifas;
  • Concessionário tem direito à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro da concessão;
  • Concessionário se sujeita às obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributárias;
  • A subcontratação é possível desde que prevista no edital e no contrato, e com prévia anuência da Administração Pública concedente, que não se obriga a tal, ainda que haja previsão no edital e no contrato (Lei nº 8.987/95, art. 26);
  • Poderá haver encampação, que é a retomada do serviço pela Administração Pública antes do prazo estabelecido, por interesse público, com a consequente indenização do concessionário. 

Trata-se de ato unilateral da Administração Pública;

Por inadimplemento contratual por parte do concessionário, poderá haver caducidade ou decadência, sem direito à indenização, exceto à parte não amortizada dos equipamentos que reverterão para o poder concedente; também é ato unilateral;

  • Reversão é a incorporação dos bens do concessionário pelo poder público, para prosseguimento na prestação do serviço, nos casos de extinção da concessão, com direito à indenização (Lei nº 8.987/95, art. 36);
  • A responsabilidade civil objetiva (art. 37, § 6º, CF/88), se aplica ao concessionário que causa prejuízos a terceiros, em decorrência da prestação de serviço público;

o Em regra, é necessária lei autorizativa para a execução indireta de serviços mediante concessão.

Teci todas essas considerações por que hoje, quase véspera da Independência do Brasil, bem cedo, quando produzo melhor, me pus à analisar um curioso Decreto Municipal, de uma cidade próxima da Capital Amazonense, que trata do reajuste da Tarifa de Ônibus, e lendo o Decreto pela vigésima vez, observo um cheiro de ilegalidade muito forte, sob a ótica de tudo o que foi colocado neste artigo, e como não vi fundamentação legal nenhuma no Ato Administrativo, nem previsão legal que Autorize o Município, como Concedente à fazê-lo, me inclino na Direção de que os Legitimados (Câmara de Vereadores, Ministério Publico, ou outros personagens em casos específicos), devem urgentemente ir à juízo, objetivando em nome da vinculação de todo Ato à uma Legislação que o tenha previsto, atacar o que não tem forma discricionária, e nem poderia tê-lo por que há limites muito pequenos para a discricionariedade que não lhe permitem ser um cheque em branco.

Como a Lei Maior prevê o Direito à livre manifestação e aqui não há anonimato, me permito posição de que há muito o que se combater judicialmente no Decreto 037/2017, da Prefeitura de Iranduba, a meu ver, sem qualquer fundamentação legal, sem anunciar em que Lei Municipal de Concessão se baseia, sem anunciar como de uma só vez, reajusta uma tarifa retroagindo à 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016, quando nenhum contrato de concessão no mundo, por pior que fosse, poderia prever uma cláusula de reajuste nesse formato; e principalmente por que, se levado a termo, sem um Justo combate na esfera judicial, pode colocar o município de Iranduba, num triste pódio: o da passagem municipal mais cara da Região Norte, com tarifas, num município muito pequeno, que variam de R$ 4,75 a R$ 8,50, em distâncias que em Manaus, distante 20 quilômetros a Prefeitura da Capital Amazonense cobra R$ 3,80, em ônibus bem mais novos, confortáveis e refrigerados.

Difícil crer que Iranduba, com Diesel mais barato que Manaus, com IDH e renda per capta muito menor que a capital Amazonense, consiga fazer sua população, de maioria assalariada com o piso mínimo

Nacional, com uma taxa de desemprego monstruosa, no meio da maior crise financeira do país, consiga suportar o

Pesadíssimo ônus que o Poder Municipal quer impor.

Noutro giro, há notícias de que vários Parlamentares Municipais já teriam

requerido ao Prefeito , por ofício, que enviasse à Câmara Informações e cópias do Processo licitatório e do  Contrato de Concessão dos Serviços Públicos de Transporte Municipal, sem resposta, atitude que, se confirmada, caracteriza INFRAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA, prevista no inciso III do artigo 4o do Decreto-Lei 201/67, sujeitando o Prefeito, à Denuncia com julgamento pela Câmara de Vereadores com a sonora possibilidade de afastamento e/ou cassação de Mandato .

Ressalte-se que nem a Lei Municipal de Concessões, nem o Processo Licitatório é muito menos o Contrato de Concessão do Transporte Publico Municipal estão no Portal de Transparência da Prefeitura de Iranduba, como seria sua obrigação legal, de acordo com a determinação da Lei.

Na verdade, a Lei Federal n° 8.883, de 08/06/1994, alterou e acrescentou vários dispositivos à Lei Federal n° 8.666, de 21/06/1993, a qual regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, instituindo normas para licitações e contratos da Administração Pública.

Na Seção II da Lei Federal n° 8.666/1993, que trata “Da Formalização dos Contratos”, foi acrescentado parágrafo único ao seu art. 61, o qual reza que:


“Art. 61

Parágrafo único. 

A publicação resumida do instrumento de contrato ou de seus aditamentos na imprensa oficial, que é condição indispensável para sua eficácia, será providenciada pela Administração até o quinto dia útil do mês seguinte ao de sua assinatura, para ocorrer no prazo de vinte dias daquela data, qualquer que seja o seu valor, ainda que sem ônus, ressalvado o disposto no art. 26 desta Lei.” 

A norma transcrita acima se refere à publicação resumida do instrumento de contrato e seus eventuais aditamentos, trazendo explicitamente, no texto legal, referências concernentes à eficácia do contrato administrativo, bem como à questão dos prazos para sua publicação.

O texto aduz que as publicações em questão devem ocorrer na imprensa oficial, cuja definição encontra-se contida no art. 6°, inciso XIII, da Lei de Licitações, senão vejamos:

Art. 6° …

XIII – Imprensa Oficial – veículo oficial de divulgação da Administração Pública, sendo para a União o Diário Oficial da União, e, para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, o que for definido nas respectivas leis;”

Sobre “Leis” é importantíssimo frisar que a partir de 2011, ocorreu a publicação da chamada Lei da Informação Pública, que parece não estar vigente em vários municípios do Amazonas, principalmente em Iranduba, que demonstra precisar de Assessoria de qualidade, para que o a Administração município seja apresentada à Lei 12.527/2011, que expressamente recomenda :

“Lei nº 12.527/2011: 

Art. 8º. É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas.

“§ 1º Na divulgação das informações a que se refere o caput, deverão constar, no mínimo:

“[…]

“IV – informações concernentes a procedimentos licitatórios, inclusive os respectivos editais e resultados, bem como a todos os contratos celebrados;

“§ 2º Para cumprimento do disposto no caput, os órgãos e entidades públicas deverão utilizar todos os meios e instrumentos legítimos de que dispuserem, sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais da rede mundial de computadores (internet)”.

O dispositivo normativo acima transcrito determina expressamente a obrigatoriedade dos órgãos e entidades da administração pública efetuarem a divulgação dos editais de licitações na internet, e ainda, vai além, determina a divulgação do resultado do processo licitatório e publicação dos contratos que vierem a ser celebrados.

Com base nas informações de toda Legislação vigente confrontadas com o Decreto 037/2017, da lavra do Prefeito de Iranduba, Chico DOIDO, é plenamente possível  opinar que a população precisa estar atenta, vigilante e diligente para exigir do Poder Publico que conheça, siga e cumpra a Lei, e, se houver dúvidas sobre qualquer Ato Administrativo, que reclame de forma ordeira, pacífica e democrática, de maneira formal, à Câmara de Vereadores, ao Ministério Publico e/ou que elejam representante e, numa das formas previstas na Legislação, se façam representar perante o Poder Judiciário, para que a chamada “discricionariedade”, sem fundamento legal, não seja usada para impor sacrifícios absolutamente ilegítimos como se todos fossem expectadores passivos e inexpressivos .

(*) Ricardo Gomes é advogado