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Brasil

Dia da Língua Portuguesa: especialistas e ativista divergem sobre linguagem neutra

No Dia Mundial da Língua Portuguesa, ativista e acadêmicos analisam estratégia de inclusão social

Dia da Língua Portuguesa: especialistas e ativista divergem sobre linguagem neutra

Foto: Artur Mamede/ Portal AM1

Manaus (AM) – Instituído em 2019 durante a Conferência Geral da Unesco, o Dia Mundial da Língua Portuguesa, celebrado em 5 de maio, é um reconhecimento a uma das línguas mais difundidas do mundo, com mais de 265 milhões de falantes espalhados por todos os continentes. A “última flor do Lácio, inculta e bela”, como a caracterizou o poeta Olavo Bilac, passou por adaptações ao longo dos séculos e serviu de base para polêmicas.

Um caso recente é a defesa da linguagem neutra como forma de representar pessoas que não se enquadram nas categorias masculino e feminino. Os apoiadores alegam que a causa tem como finalidade superar o domínio desses padrões na linguagem. O exemplo mais famoso é a expressão “todes”, utilizada até em postagens de perfis de órgãos do governo federal nas redes sociais. No entanto, defensores do uso padrão da língua – independente da orientação política – contestam a efetividade do recurso.

O coordenador da Aliança LGBT+ no Amazonas, Gabriel Mota, diz que a variação é um processo natural. “Acredito que a língua é viva e que as variações que ocorrem dentro de grupos sociais devem ser consideradas como parte da linguagem, para que não haja exclusão”, argumenta Gabriel, que defende o aprofundamento do debate a partir da academia.

Questionamentos

Nesse âmbito, o professor substituto do curso de Letras da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Rogério Cardoso, posiciona-se contra o uso da linguagem neutra no ambiente institucional e acadêmico.

“Trata-se de uma linguagem visivelmente artificial, ou seja, ela não surgiu espontaneamente entre os usuários da nossa língua. É muito mais uma pauta política do que linguística”. O argumento de que o recurso levaria à inclusão social, de acordo com o professor, suscita outros questionamentos.

“A estrutura gramatical da língua portuguesa, com apenas dois gêneros gramaticais, é um agente perpetuador da exclusão social? Pessoas podem excluir pessoas, mas será que a língua, enquanto código de comunicação, pode também excluir pessoas? Que melhoras concretas a linguagem neutra há de trazer para certos segmentos da população LGBT?”, indaga.

O professor Luiz Carlos Martins, que atua na área de Estudos do Discurso do curso de Letras da Ufam, acredita que as mudanças na língua operam por meio de um processo além da intenção humana. “Sou gay; mas não tenho ainda uma opinião consistente sobre o assunto. Por um lado, eu acho a causa necessária. Por outro, a língua não funciona com imposições e decisões racionais. A mudança acontece sem que os humanos tenham planejado e forçado isso”, conclui.

Decisão do STF

Em fevereiro deste ano, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) declarou inconstitucional uma lei do Estado de Rondônia que proíbe a denominada linguagem neutra em instituições de ensino e editais de concursos públicos. Por unanimidade, a Corte entendeu que a norma viola a competência legislativa da União para editar normas gerais sobre diretrizes e bases da educação. Esse entendimento não diz respeito ao conteúdo da norma, limitando-se à análise sobre a competência para editar lei sobre a matéria.

O tema é objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7019. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) sustenta, entre outros pontos, que a Lei estadual 5.123/2021, a pretexto da defesa do aprendizado da língua portuguesa conforme a norma culta e as orientações legais de ensino, apresenta preconceitos e intolerâncias incompatíveis com a ordem democrática e com valores humanos.

A lei está suspensa desde novembro de 2021 por liminar deferida pelo relator, ministro Edson Fachin.

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