Manaus, 3 de maio de 2024
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Cidades

Educadores lamentam mortes de professores da Ufam para a covid-19: “estamos órfãos do conhecimento”

Os docentes relembram que não foram só perdas de colegas de trabalho ou amigos, mas há a perda do capital intelectual e do conhecimento que as vítimas possuíam

Educadores lamentam mortes de professores da Ufam para a covid-19: “estamos órfãos do conhecimento”

Foto: Arquivo Pessoal / Luiz Fernando/Arnóbio Bezerra/Iva Tai

MANAUS – Desde o início da pandemia provocada pelo novo coronavírus, várias classes trabalhadoras foram afetadas, tanto com o elevado número de pessoas contaminadas pelo vírus, quanto pelas mortes causadas por complicações da Covid-19. No meio acadêmico isso não foi diferente. O vírus fez muitas vítimas fatais entre os educadores – que, querendo ou não, deixou centenas de alunos “órfãos do conhecimento”.

Entre essas vítimas estão os professores de universidades do Estado, como a Universidade Federal do Amazonas – que, desde março do ano passado, já perdeu 119 membros, entre docentes e Técnicos-Administrativos em Educação (TAEs). Ainda segundo dados da Ufam, desses mortos, 18 estavam diretamente combatendo a doença no Hospital Universitário Getúlio Vargas (HUGV/Ebserh).

Recentemente, a Universidade divulgou em seu site notas de pesares em nome do docente do Instituto de Filosofia, Ciências Humanas e Sociais (IFCHS), professor Luiz Fernando de Souza Santos, ocorrida em 11 de março, e do professor Arnóbio Alves Bezerra, em 9 de março. Para o professor e doutorando em História, Luiz Antônio Nascimento, as mortes dos educadores são mais que uma perda de pessoas, mas uma perda do capital intelectual.

“Perdi meus colegas favoritos, inclusive dois professores do meu departamento. O professor Luiz Fernando e o professor Arnóbio Bezerra eram incríveis profissionais, que vão fazer falta para a educação amazonense. Cada pessoa morta é uma perda inimaginável e causa muita tristeza e dor. No caso dos colegas professores, perde-se um mundo de sabedoria e conhecimento. Eles tinham dezenas de alunos, que agora ficaram meio ‘órfãos’. Então não perdemos só colegas de trabalho ou amigos, perdemos companheiros de conhecimento”, salientou Antônio.

Embora divergissem opiniões em algumas ideias, o professor Antônio falou da contribuição dos docentes para um espaço acadêmico melhor e mais igualitário.

“Nós professores tínhamos eles como amigos. Colegas de trabalho e interlocutores em estudos, pesquisas e atividades em sala de aula. Muitas vezes opositores teóricos, mas isto é fundamental no processo de ensino e aprendizagem. Os estudantes nos compreendem como pesquisados que têm compreensões e pontos de vista, hora convergentes e hora divergentes. E é justamente nesses encontros de ideias que se produz um conhecimento novo. Cada professor morto é a perda de dezenas de anos de conhecimentos”, lamenta o sociólogo.

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O professor de História e escritor, Otoni Mesquita, relembrou que na áreas das Artes também houve perda de mestres. Alguns foram seus alunos, e depois se tornaram professores na instituição. Entre eles está a professora Ivaney Machado, mas conhecida como “Iva Tai”. Ela morreu logo no início da 2ª onda da covid-19 no Estado, em janeiro deste ano.

Iva era do ICSEZ, Campus de Parintins, no Amazonas, e dedicou o trabalho à equipe de criação, coordenação de muitas atividades na Ufam e no curso de Artes Visuais.

“Perdi vários colegas próximos e outros que eu não tinha tanto contato na universidade, inclusive, ex-alunos e professores. As perdas são diárias em vários setores da área do saber, além de amigos e familiares. Isso precisa parar!”, comentou o professor Mesquita.

Mesquita também chegou a comparar a covid-19 com um ensaio de sua autoria, sobre a Epidemia das Trincheiras, de 1918. Nesse período, a cidade também foi tomada por uma doença de pessoas vindas da guerra e vinham contaminados nas embarcações que saíam de Belém e do Acre.

“Não havia controle no Porto das embarcações que chegavam ora de Belém, ora do Acre. Quando as autoridades achavam que haviam controlado aquela doença nova, lá chegava uma outra embarcação com novos contaminados. Eles voltavam a proliferar o vírus pela cidade. Infelizmente, é isso que estamos experimentando novamente”, relembrou Otoni.