Manaus, 29 de março de 2024
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Eleições 2020

Presos provisórios no Amazonas não irão votar pela quarta eleição seguida

Seap e TRE-AM jogam a responsabilidade um para o outro sobre o descumprimento da Constituição que garante o voto para presos que ainda não foram condenados pela Justiça

Presos provisórios no Amazonas não irão votar pela quarta eleição seguida

Foto: SSP-AM

De fora da quarta eleição consecutiva, os presos provisórios do Amazonas não irão registrar seus votos para vereador e prefeito no pleito municipal deste ano. Segundo as assessorias da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) e do Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE-AM), a pandemia do novo coronavírus foi o motivo pelo qual as urnas não serão distribuídas nas unidades prisionais.

No entanto, uma decisão assinada em 18 de junho deste ano pelo presidente do TRE, desembargador Aristóteles Lima Thury, justificou também a falta de prazo para realização da alteração no cadastro dos presos aptos a votar e as restrições orçamentárias. (Veja a decisão)

Com isso, mais de 3 mil presos provisórios ficam de fora das eleições em 2020. O direito de voto dos presos que ainda não foram condenados pela Justiça é assegurado pela Constituição Federal. Além deles, os adolescentes internados em centros socioeducativos administrados pela Secretaria de Estado de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc) também podem exercer seu direito ao voto, que não é obrigatório para nenhum deles.

Empurra

Desde o pleito de 2014, que elegeu José Melo como governador do Amazonas, os presos provisórios não exercem seu direito às urnas. Questionada pela equipe de reportagem do Portal AM1 sobre o porquê de os presos não participaram das eleições de 2016 e 2018, e da eleição suplementar de 2017, a assessoria da Seap se esquivou da resposta e disse que o “TRE-AM possui essa informação”.

A secretaria responsável pela custódia dos presos também foi questionada sobre a quantidade de votos válidos registrados nas unidades prisionais em 2014, e informou, mais uma vez, que os dados estão com o TRE-AM, que controla a apuração dos votos.

A assessoria do TRE-AM foi procurada pela equipe de reportagem do Portal AM1 em setembro deste ano para ter acesso aos dados e informações. A assessoria informou que a demanda havia sido encaminhada à Corregedoria Regional Eleitoral para conhecimento e providências, porém, dois meses depois, até agora, o Órgão não deu retorno aos questionamentos.

Primeira eleição que presos ficaram de fora

Em 2016, a assessoria da Seap se pronunciou sobre a não participação dos presos provisórios nas eleições e disse que o cadastramento biométrico para os detentos havia sido solicitado em fevereiro daquele ano ao TRE-AM, e que a resposta foi que não seria possível realizar a efetivação da revisão em tempo hábil para que os presos provisórios pudessem participar das eleições.

Em julho de 2018, a Seap informou à imprensa que estava realizando levantamento dos presos provisórios que estavam aptos a votar nas eleições. A declaração veio após a divulgação de que a Justiça Eleitoral havia firmado, em abril daquele ano, um Termo de Cooperação Técnica e Parceria com diversas entidades públicas para garantir o exercício do direito de voto aos presos provisórios e aos adolescentes internados.

Mesmo com o compromisso da Justiça Eleitoral Amazonense, do Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM); da Secretaria de Estado de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM); da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap); da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Cidadania (Sejusc); da Defensoria Pública do Estado (DPE-AM) e da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Amazonas (OAB-AM), os presos e adolescentes internados não votaram naquele ano.

Em 2020, nem mesmo um diálogo ou tentativa de Termo de Cooperação Técnica foi firmado ou discutido entre Seap e TRE-AM, conforme resposta das duas assessorias para o Portal AM1.

Última eleição com participação dos presos

Coincidência ou não, os presos tiveram sua última participação na eleição de 2014, que teve a vitória de José Melo como governador do Amazonas, cassado em 2017 por compra de votos.

Um dos pontos de investigação do caso que levou a cassação de Melo, e que ainda está sendo apurado pelo MP, é uma suposta negociação do ex-secretário de Justiça, major Carliomar Brandão com o traficante José Roberto Fernandes Barbosa, o ‘Zé Roberto’ da facção criminosa Família do Norte (FDN), a fim de obter apoio político para Melo em troca de favorecimentos a traficantes.

Em 2014, Zé Roberto ainda estava preso no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj). O caso foi divulgado pela Revista Veja, ainda em outubro daquele ano, que publicou trechos de uma conversa de 30 minutos gravada entre o major Brandão com Zé Roberto. Na gravação, o traficante prometeu conseguir mais de 100 mil votos para Melo de amigos e parentes fora da cadeia e, em troca, o major da Sejus promete que ‘ninguém vai mexer com os presos da FDN’.