Manaus (AM) – O penúltimo debate entre os candidatos a prefeito de Manaus, realizado na noite de terça-feira (1) pela TV A Crítica, foi marcado por críticas, promessas vagas e a ausência de propostas concretas para temas cruciais da cidade. É o que analisa o professor, sociólogo e cientista Luiz Antônio. Segundo ele, o debate expôs uma série de fragilidades, tanto em termos de conteúdo quanto de postura.
Dos cinco prefeituráveis convidados, apenas três compareceram: Amom Mandel (Cidadania), Capitão Alberto Neto (PL) e Marcelo Ramos (PT). O prefeito David Almeida (Avante) e o deputado estadual Roberto Cidade (União Brasil) justificaram suas ausências alegando incompatibilidade de agenda.
Luiz Antonio ressaltou que as falas dos candidatos demonstraram não apenas limitações nas propostas, mas também estratégias discursivas preocupantes, como o uso do medo e da superficialidade, especialmente no que diz respeito à segurança pública e à mobilidade urbana.
O especialista fez uma crítica direta ao Capitão Alberto Neto, associando sua retórica ao movimento bolsonarista. “A primeira crítica que eu preciso fazer é ao Capitão Alberto Neto, que, como um bom quadro da extrema direita bolsonarista, de uma extrema direita que tem se reproduzido no mundo inteiro e que está se aproximando perigosamente de uma estrutura fascista, ou neofascista, se você preferir”, apontou o sociólogo. Segundo Luiz Antônio, a estratégia de Alberto Neto tem sido pautada na exploração do medo da população, o que pode ter um efeito devastador em termos de manipulação política.
“Ele tem trabalhado com a ideia de causar medo nas pessoas ou explorar o medo delas. Porque você sabe que, quando a pessoa está com medo, ela fica mais vulnerável para apoiar propostas, apoiar nomes e apoiar cenários muito catastróficos”, enfatizou o cientista político. Para ele, essa abordagem tenta reforçar a sensação de insegurança da população e direcioná-la para soluções rápidas e, por vezes, ineficazes, como a proposta do candidato de instalar câmeras e botões de pânico nos ônibus de Manaus.
‘Irresponsável’
Luiz Antonio foi enfático ao comentar essa proposta de segurança no transporte público, chamando-a de “irresponsável”. “O Capitão Alberto Neto, por exemplo, fala em transformar os ônibus em um balcão de banco. Vou colocar câmera e vou colocar botão de pânico. Ora, todos os bancos têm botão de pânico e têm câmera, e são assaltados. E, com muita frequência, aquele funcionário do banco que aciona o botão de pânico não raro é ameaçado ou mesmo ferido e morto pelos assaltantes”, destacou.
Ele continuou a crítica ponderando sobre os riscos dessa ideia em um ambiente de transporte coletivo. “Imagina, 60 ou 70 trabalhadores dentro do ônibus, há um assalto. Acionar o botão de pânico vai fazer o quê? A polícia vai chegar em dois segundos, dez minutos, cinco minutos? Cinquenta minutos? Quanto tempo a polícia vai demorar para chegar?”, questionou.
O sociólogo alertou para os perigos de um possível confronto entre policiais e assaltantes num ônibus cheio de passageiros, podendo transformar um roubo em uma situação de sequestro.
“Se a polícia chegar com um bandido dentro de um ônibus, armado, e a polícia cerca esse ônibus, você sai de um furto simples ou de um roubo qualificado para um sequestro. Só um policial irresponsável é capaz de propor isso. Um botão de pânico para combater crime dentro de ônibus é uma irresponsabilidade”, concluiu.
Não consegue falar sem teleprompters
A análise do sociólogo também se estendeu a Amom Mandel. Segundo Luiz Antônio, Amom tem uma habilidade inegável com o uso das mídias digitais, mas essa competência não tem se traduzido em propostas substanciais para os problemas da capital amazonense.
“Amom Mandel é um rapaz que aprendeu a usar muito bem as redes sociais, tanto que conseguiu se eleger vereador e, posteriormente, deputado federal, mas tem uma enorme dificuldade de falar sem os teleprompters, digamos assim, ou sem as plataformas que permitem a ele fazer os ajustes e as correções de rumo.”
No entanto, o principal problema com Amom, segundo o especialista, está na superficialidade com que ele aborda os principais desafios de Manaus, como o transporte público. “Ele fala que tem um programa muito bom, mas, a rigor, nenhum dos problemas centrais do povo médio de Manaus ele conseguiu sequer tocar no assunto. Transporte público, por exemplo, ele falou aquilo que a gente lê em qualquer bula de remédio”, criticou Luiz Antônio.
Para ele, a proposta de Amom de “modernizar” o transporte coletivo soa genérica e insuficiente. “Eu preciso falar para o usuário do ônibus, que hoje está levando duas horas para sair do São José para chegar na Ufam, que tenha um pouco de paciência, mas que em seis meses, oito meses, eu faça com que ele chegue na universidade pela metade do tempo. Se eu não falo isso, se eu não dou um prazo razoável e concreto, o usuário vai continuar sem confiança nas propostas”, frisou.
Faltou clareza
Luiz Antonio também abordou a performance de Marcelo Ramos, o candidato mais experiente entre os três que participaram do debate. Embora tenha apontado a trajetória política de Ramos, que disputa eleições há mais de 20 anos, o cientista político criticou a falta de clareza e objetividade em suas propostas.
“O Marcelo está disputando eleição há mais de 20 anos. Faltou a ele ser mais propositivo, ser mais claro. Quando ele fala do ‘Pézinho de Meia’, acho que é importante ele falar, por exemplo, da importância dos pais valorizarem a educação, da importância da sociedade valorizar os trabalhadores da educação, da importância de você democratizar a escola”, sugeriu Luiz Antonio.
Para ele, Ramos poderia ter explorado melhor temas centrais, como a democratização da gestão escolar, uma proposta que, em sua visão, poderia ter ganhado força se o candidato tivesse defendido um modelo de gestão mais participativo.
“Um diretor da escola eleito pela comunidade escolar o aproxima dos professores. Com isso, os professores se sentirão mais participativos do processo de gestão da escola, e o Marcelo precisava dizer isso, ele precisa sinalizar para isso”, disse, apontando que a experiência de Ramos não se refletiu em um desempenho convincente.
Ponto importante
Ainda segundo a análise do sociólogo Luiz Antonio, um ponto interessante é a volta do tema das creches ao debate eleitoral.
“Há mais de 10 anos, as eleições municipais não traziam essa discussão à tona. Fui um dos primeiros a levantar essa pauta neste processo eleitoral, em abril, e, desde então, candidatos como Amom, Roberto Cidade e Capitão Alberto Neto começaram a incorporá-la em seus discursos”, comentou Luiz Antonio. No entanto, ele apontou que, apesar de mencionarem a importância das creches, os candidatos parecem não entender sua real função e propósito.
Luiz Antonio ironizou a falta de conhecimento dos candidatos, principalmente de Alberto Neto, ao relacionarem creches com educação cívico-militar. “Imagina uma criança de seis meses fazendo continência ou participando de ordem unida. A creche é para crianças de três meses até três anos. Depois disso, elas vão para a pré-escola, e, aos seis anos, entram no ensino fundamental”, esclareceu.
Outro ponto destacado foi o número de vagas de creche que os candidatos apresentaram, os quais, segundo Luiz Antonio, não refletem a realidade. “Consultei a Secretaria de Educação Municipal, e me informaram que Manaus tem cerca de seis mil vagas de creche. Destas, apenas mil são da Prefeitura, e o restante é conveniado. Isso mostra que os números citados por Amom e Alberto Neto não batem com os dados oficiais, sugerindo uma desconexão entre as promessas e a realidade”. Para Luiz Antonio, a defesa de creches por candidatos de direita e extrema direita, somada à proposta de parcerias público-privadas, revela uma falta de compreensão sobre a gestão pública de educação infantil.
Escândalo de Parintins não passou batido
O recente escândalo envolvendo servidores públicos e membros da Polícia Militar (PM) em supostas operações ilegais para influenciar as eleições em Parintins não passou despercebido durante o debate. Os candidatos fizeram duras críticas sobre o possível uso da máquina para interferir no processo eleitoral e cobraram medidas rigorosas sobre o assunto.
Outro ponto criticado e alvo de várias acusações foram as ausências de David Almeida e Roberto Cidade, ambos liderando as pesquisas para um eventual segundo turno.
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