Manaus, 6 de maio de 2024
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Manaus, 6 de maio de 2024

Cidades

Falta de monitoramento no aeroporto de Manaus pode ter influenciado segunda onda da Covid

A falta de um bloqueio sanitário mais efetivo pode ter causado segunda onda da doença. Cenário se repete em outros lugares do país

Falta de monitoramento no aeroporto de Manaus pode ter influenciado segunda onda da Covid

Foto: Márcio Silva/AM1

Manaus – A segunda onda da Covid-19 no Amazonas, no início de 2021, acendeu um alerta nas medidas de isolamento social. A flexibilização das medidas de restrição é considerada um dos motivos para o aumento de casos. Outros, no entanto, veem a abertura completa dos aeroportos, sem qualquer fiscalização, como uma das razões. Além disso, a falta de fiscalização e monitoramento de pacientes infectados recém-chegados de destinos nacionais e internacionais, sem qualquer testagem, também é criticada por pesquisadores e estudiosos.

O epidemiologista e pesquisador Jesem Orellana, do Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia) cita, como exemplo, o Aeroporto Internacional de Tóquio, onde foi detectada a variante P.1 do novo coronavírus, descoberta no Amazonas. A variante foi descoberta após quatro japoneses que estavam infectados com o vírus retornarem de uma viagem à Amazônia.

Orellana critica, inclusive, a falta de políticas públicas e iniciativas do poder público neste sentido. “Bloqueio sanitário é algo que deveria ser básico. Infelizmente, em Manaus, capital mundial da covid-19, nada disso está acontecendo”, afirma.

Os totens de álcool em gel no aeroporto fazem parte das medidas adotadas pela Infraero para conter a disseminação do vírus. Foto: Márcio Silva/AM1

Problema nacional

O problema da falta de monitoramento não acontece somente em Manaus. A jornalista Pâmela Baltazar, por exemplo, esteve em Belém (PA) no início de janeiro de 2021, e relata que não havia nenhum posto de orientação no Aeroporto Internacional Val-de-Cans, na capital paraense.

“Fiquei chocada que não havia nenhuma fiscalização e nenhum posto tanto em Manaus como em Belém. Lembrei muito do filme Planeta dos Macacos: a Origem, porque no filme, o vírus começa a ser espalhado pelos aeroportos, e parte disso é o que está acontecendo no Brasil”, conta.

A jornalista Bruna Souza também esteve em férias, no início do ano, e passou por diversos aeroportos brasileiros, como o do Galeão (RJ), Foz do Iguaçu (PR), Salvador (BA) e Fortaleza (CE). Segundo ela, não havia postos de fiscalização em nenhum aeroporto, inclusive no de Manaus, quando finalizou a viagem.

“Uma coisa boa que eu vi foi que hoje, nos embarques, você não precisa mais ter contato com quase nenhum funcionário. Isso pode até mesmo diminuir o risco de algum contágio. Além disso, em Salvador, havia a orientação para que quem desembarcasse, quando pegasse a bagagem na esteira, mantivesse o distanciamento de 1,5m. Agora, estandes de orientação para quem estava chegando, com orientações sobre quarentena e monitoramento, eu não vi”, relembra.

Posto de monitoramento e fiscalização

Em nota, a Infraero informou que tem adotado medidas como distanciamento social, uso de máscara e higienização de mãos em todos os aeroportos. A empresa também diz que mantém contato constante com os órgãos responsáveis pelo controle da pandemia nas esferas federal, estadual e municipal “para alinhar as práticas de combate à transmissão do novo coronavírus”.

Até o final de 2020, a Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas (SES-AM) mantinha um posto de monitoramento de passageiros na sala de desembarque do aeroporto. Neste posto, passageiros que desembarcavam em Manaus recebiam um panfleto com instruções para baixar o aplicativo SASI, por meio do qual os passageiros poderia acionar a SES se tivessem algum sintoma de covid-19. O posto não existe mais, e procurada pela reportagem, a Secretaria informou as ações no aeroporto são de competência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

“Esse posto que tínhamos no aeroporto ajudou muito, mas infelizmente foi uma ação abandonada, assim como a testagem por RT-PCR em novembro, que foi a menor de toda a pandemia. Foi por isso que tivemos grandes tragédias e o aumento absurdo nos casos”, afirma Jesem Orellana.

Em nota, a Anvisa informou que há um posto de orientações no Aeroporto Internacional de Manaus. A assessoria de imprensa da agência ressaltou que o órgão trabalha para assegurar a vigilância sanitária adequada nos aeroportos, principalmente na chegada e partida de voos domésticos e internacionais, “tendo em vista o atual cenário epidemiológico”.

A agência destaca que também tem trabalhado para intensificar a vigilância de casos suspeitos de COVID-19 nos aeroportos, para “orientação imediata quanto ao isolamento domiciliar e reporte aos órgãos de vigilância epidemiológica, de acordo com a definição de caso suspeito divulgada pelo Ministério da Saúde.”

Posto de monitoramento e fiscalização da SES ficava na sala de desembarque do Aeroporto. Hoje, não está mais. Foto: Márcio Silva/AM1

Fechamento?

Embora o número de casos esteja alto em todo o país, o epidemiologista afirma que o fechamento dos aeroportos não é uma solução, e não ajudaria em nada. Segundo ele, o que ajudaria no combate é o monitoramento ostensivo, como aconteceu em Tóquio e Londres.

“O vírus já está espalhado, e fechar os aeroportos é impossível. E outra coisa: fechar o aeroporto de Manaus pode diminuir a dispersão a partir do Amazonas, mas e os outros estados? Seria completamente desastroso, principalmente para a economia”, afirma.

Orellana salienta que essa medida não pode ser isolada, mas sim coordenada pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e pelo Ministério da Saúde. Entretanto, segundo ele, falta gestão e coordenação nacional.

“No caso do Brasil, nada disso vale. Tem prevalecido o ‘deixa rolar’, e por isso, nosso país é considerado laboratório a céu aberto e ameaça à humanidade,” completa.

O pesquisador também reitera que o que poderia ajudar no controle da pandemia seria a redução dos voos entre as cidades mais afetadas pelo coronavírus, além de formulários de triagem e fiscalização de passageiros.

“Essa é uma ação, além de aumentar o rigor da fiscalização de embarque e desembarque, com testagem de possíveis sintomáticos e não sintomáticos por sorteio, por exemplo. Também se poderia criar um formulário de triagem antes da compra da passagem, para rastrear informações de exposição recente ou passada ao novo coronavírus. Estratégia e tecnologia não faltam, mas falta vontade política e gente qualificada”, ressalta.