Manaus, 3 de maio de 2024
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Manaus, 3 de maio de 2024

Cidades

Filhos são obrigados a cuidar dos pais que os abandonaram na infância?

O Portal AM1 conversou com o advogado familiarista, Cheine Araújo, que explicou os direitos e deveres dos filhos sobre a questão de abandono paternal.

Filhos são obrigados a cuidar dos pais que os abandonaram na infância?

(Foto: Reprodução/Internet)

Manaus (AM) – Neste domingo (13), o país inteiro celebra o Dia dos Pais, uma forma de homenagear àqueles que vivem em prol de suas famílias. Além disso, a data também tem o objetivo de fortalecer a relação entre pais e filhos. No entanto, o abandono paterno é uma realidade que, com o passar do tempo, só aumenta no Brasil.

Dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), obtidos a partir do Portal da Transparência do Registro Civil, mostram que, entre janeiro e abril de 2023, 60.295 bebês não receberam o nome do pai — o que representa 6,8% do total de 874.166 nascimentos contabilizados pelos cartórios neste período.

Embora seja garantida por lei a responsabilidade de cuidar dos filhos desde a gestação, registrá-los e assumir a paternidade, muitos pais escolhem abandoná-los e voltar na idade adulta com algum pretexto de acolhimento.

Segundo o advogado Cheine Araújo, da área do Direito da Família, essa questão é uma prática antiga e até se tornou “comum”. “Isso ocorre muito; de o pai abandonar o filho quando menor e, quando fica doente e com mais idade, volta para requerer cuidados e ajuda dos filhos“, disse.

Mas o filho é obrigado a cuidar do pai que o abandonou?

Sim. Conforme explica o advogado, os filhos são obrigados a cuidar dos pais, mesmo que eles tenham sido abandonados na primeira infância.

“No artigo 229 da Constituição Federal está disposto que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. Porém, um direito não exclui o outro”.

Araújo explica, ainda, que, ao crescerem e se darem conta da situação, os filhos podem recorrer à Justiça para pedir reparação por abandono afetivo. “Temos muitas ações judiciais nesse sentido, tanto de filhos buscando indenizações por abandono afetivo como também de pais requerendo apoio financeiro dos filhos”.

Conforme cada situação, Cheine Araújo informa que a Justiça determina um valor para que o filho pague ao seu genitor, uma pensão, até que este seja curado, se for caso de doença, por exemplo, ou até a morte. Mas, o filho não é obrigado a cuidar desse pai de maneira afetiva.

“Quando o pai recorre à Justiça requerendo apoio do filho, ele já coloca como quer esse apoio, seja ele financeiro ou cuidados até a morte ou até as condições que são previstas de carência ou enfermidade sejam alteradas. Vai que, o pai ganhe um prêmio na loteria ou receba algum valor e passe a não necessitar mais financeiramente, daí a carência não será mais prevista”, disse.

“Geralmente, também ocorre que o filho fica obrigado a pagar um cuidador ou pagar alguém para prestar os devidos cuidados, não tendo que ele próprio fazer isso. Até porque, restabelecer um relacionamento é bem delicado, isso já entra em outras esferas”, enfatiza.

Mas, e se o filho não tiver condições de cuidar de seu genitor? “Daí, fica prejudicada a possibilidade que é avaliada no binômio acima. Mas é avaliado caso a caso, pois o filho pode prestar apoio de alguma outra forma“, finaliza.

“Meu filho não tem o sobrenome do pai”

Ana Vitória Santos, de 24 anos, é mãe de Ítalo, de 1 ano de idade. Assim como outras muitas jovens que, hoje em dia, não conseguem obter a paternidade na certidão de nascimento de seus filhos, Ana Vitória passa por dificuldades para criar e cuidar da criança.

“O pai do Ítalo mora na mesma cidade que eu, namoramos pouco tempo, mas, quando engravidei, ele não quis assumir o meu filho. Eu tive gravidez de risco, pois meu filho, desde a gestação, foi diagnosticado com problema no rim. Ele quer ser pai, porém, não quer registrar a criança no nome dele”, desabafa a jovem.

A mãe de Ítalo relata que, mesmo com as dificuldades enfrentadas, até aqui, luta para proporcionar o melhor à criança. “Mesmo ele não querendo ser pai, não vai faltar amor e nem comida para o meu filho. Fui abençoada em ter uma família que me apoia. O Ítalo recebe muito amor e carinho de todos. Mas, eu penso que, quando ele estiver maior, vai querer saber quem é o pai dele”, conta.

Sobre essa questão, a mãe afirma que pretende contar a verdade ao pequeno Ítalo, mas não pretende amedrontá-lo ou fazer sentir raiva de seu genitor. “Quando esse dia chegar, eu vou contar tudo a ele, mas hoje não precisa. Não farei ele sentir raiva do pai que não quis assumi-lo e nem deixarei ele criar medos que possam prejudicá-lo no futuro”.

“Apesar de o pai dele não querer ser um pai que ele merece, uma figura paterna não vai faltar. Os meus irmãos cuidam muito melhor do Ítalo do que o pai dele faria. Além disso, meu padrasto é doido por ele e o cria como um filho. Eles levam ele para passear, brincam com ele, tomam conta quando eu preciso trabalhar. Para mim, isso é ser pai”, relata.