Manaus, 18 de maio de 2024
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Cidades

Hidrelétricas e mudança no clima ameaçam árvores centenárias

Estudo do Inpa mostra que degradações provocadas pela construção de hidrelétricas em combinação com mudanças do clima prejudicam ecossistemas inteiros

Hidrelétricas e mudança no clima ameaçam árvores centenárias

Árvores mortes no rio. Fotos – Tayane Carvalho, Angélica Resende e Jochen Schöngart - Inpa

A implantação da hidrelétrica de Balbina e as mudanças climáticas alteraram o regime de inundação de florestas alagáveis pobres em nutrientes causando mortalidade de árvores centenárias da Amazônia. É o que aponta o artigo publicado por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC) na revista científica New Phytologist.

Um das grandes árvores afetadas foi  a macacarecuia ou cueira (Eschweilera tenuifolia), árvore símbolo dos igapós de águas pretas e altamente adaptada ao pulso de inundação (subida e descida anual das águas dos grandes rios da Amazônia Central).

No artigo “Perturbações do pulso de inundação como ameaça a árvores centenárias da Amazônia” (Flood-pulse disturbances as a threat for long-living Amazonian trees), buscou-se elucidar a relação de distúrbios climáticos e antrópicos com o crescimento e a mortalidade da macacarecuia, pertencente à mesma família da castanha-do-pará (Lecythidaceae), que durante períodos evolutivos desenvolveu adaptações sofisticadas para sobreviver às inundações prolongadas.

Em comparação ao crescimento e a mortalidade da espécie em um ambiente não perturbado (Parque Nacional do Jaú) e em outro ambiente perturbado pela alteração do pulso de inundação, causado pela implementação da hidrelétrica de Balbina (a jusante da barragem), no Rio Uatumã, na década de 1980, no município de Presidente Figueiredo.

Resultados

As árvores que cresciam na área não perturbada apresentaram diferenças no crescimento após 1975, quando se sucederam períodos de intensas cheias nos rios da Amazônia Central, e grandes mudanças climáticas no panorama global se intensificaram, o que afetou até mesmo as áreas remotas de igapó da Amazônia.

Quanto às árvores crescendo na área perturbada pela alteração no pulso de inundação, causada pela hidrelétrica de Balbina, houve alterações distintas no padrão de crescimento após a implementação da hidrelétrica, período no qual ocorreu mortalidade em massa de macacarecuia, e também de outras espécies como o arapari.

Parte das árvores morreram no período da construção da barragem, quando houve uma grande redução na disponibilidade de água nos igapós a jusante da barragem, como consequência do represamento do Rio Uatumã, para a criação do Reservatório de Balbina.

Outro momento que causou a morte de árvores foi durante a operação da barragem que criou condições permanentes de inundação, ultrapassando a capacidade adaptativa da espécie, e resultando em mortalidade massiva, ou seja, extremos de falta ou excesso de água, causam a mortalidade desta espécie superadaptada à inundação regular.

“A previsão é que a frequência e magnitude desses dois extremos de falta e excesso de água deverão aumentar, devido às mudanças climáticas em curso e dos planos de implementação de dúzias de grandes usinas hidrelétricas nos rios amazônicos”, diz Resende, que é engenheira florestal e atualmente faz pós-doutorado na Embrapa Amazônia Oriental, no Pará.

Recomendações

Em conjunto com outros resultados obtidos no âmbito do projeto Peld-Maua do Inpa, os resultados evidenciam os impactos em florestas alagáveis de igapó na Amazônia Central, causados por alterações do pulso de inundação em consequência de mudanças do clima e do uso de terra (usinas hidrelétricas).

Os autores recomendam em termos de políticas públicas que os tomadores de decisão considerem os potenciais impactos nas áreas alagáveis a jusante das usinas hidrelétricas planejadas, quando da realização do Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima).

Também sugerem que haja ajuste na geração de energia das usinas existentes e em construção, de forma a considerar a manutenção de um pulso de inundação nas áreas alagáveis a jusante da barragem assegurando a sobrevivência dos organismos e dos importantes processos ecológicos desses ambientes críticos.

Para a mitigação das mudanças climáticas globais na Amazônia, os autores entendem que isso exige ações concretas em nível internacional, reduzindo as emissões de gases de efeito de estufa em nível global e regional e, simultaneamente, reflorestando áreas degradadas em grande escala.

 

(*) Com informações do Inpa