MANAUS – O que era para ser o resgate do patrimônio histórico acabou se tornando motivo de críticas por parte de historiadores – e até de piadas – em Manaus. Durante ações de revitalização em praças da capital, a restauração de monumentos descaracterizou algumas obras.
O caso mais grave foi da estátua de Tenreiro Aranha, localizada na Praça 5 de Setembro, conhecida como Praça da Saudade, no centro da cidade. O monumento de bronze, do escultor italiano Enrico Quattrini, foi pintado com uma tinta dourada vibrante.
De acordo com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) a intervenção realizada pela Prefeitura de Manaus não foi autorizada pela autarquia.
O superintendente substituto do Iphan, Mauro Augusto Menezes, afirmou que o instituto vai preparar um relatório e avaliar se a pintura causou impactos culturais na escultura.
“Nós firmamos, junto às entidades da prefeitura, o nosso interesse de estarmos juntos para consolidar, de uma vez por todas, um trabalho de parceria; de gestão compartilhada; se antecipando às intervenções futuras; fazendo com que elas possam preceder de uma análise técnica que não impacte o patrimônio cultural na sua qualidade de memória e identidade cultural da cidade”, afirmou.
Além disso, Iphan e a Secretaria Municipal de Limpeza Pública (Semulsp), responsável pelos serviços, se reuniram para alinhar normas e procedimentos cabíveis para ações de revitalização e manutenção de praças na cidade.
O Portal AM1 questionou a Semulsp se a pasta possui uma equipe técnica para realizar as ações de restauro, mas a secretaria se limitou a responder com informações divulgadas anteriormente, que não esclareceram a questão.
O caso também é investigado pelo Ministério Público do Amazonas (MP-AM).
Historiadores criticam ‘restauros’
Para o historiador Otoni Mesquita, os monumentos da capital vêm sendo tratados de forma inadequada, e revelam que não há técnicos envolvidos no processo.
“O que aconteceu são alguns atentados feitos pelo próprio órgão, que deveria contratar profissionais, constituir equipes, e contratar pessoas gabaritadas, com formação específica. Mas a culpa mesmo é de quem promoveu, de quem contratou, quem fez a solicitação sem ter o devido conhecimento na área, são pessoas neófitas, com certeza”, disse.
Assim como ele, o professor e historiador Fábio Augusto de Carvalho Pedrosa afirma que as intervenções são inadequadas e afetam diretamente a coletividade, a história e cultura da população manauara.
“Pela forma como foram feitos, nem podem ser chamados de restauro. Restauro é uma recuperação, o resgate de algo. O que temos vistos são descaracterizações do patrimônio”, afirmou.
O historiador é criador do Blog História Inteligente e vem levantando o debate sobre o tema na internet.
Pedrosa ainda citou outros monumentos, como jarros e as muretas da Ponte dos Bilhares, que foram pintados de dourado e laranja, respectivamente, tirando a naturalidade da obra. Ele aponta que as muretas são da mesma pedra utilizada na escadaria do Teatro Amazonas e na base do Palácio da Justiça.
Segundo o historiador, Manaus possui cerca de 1.656 prédios históricos e praças tombadas, que se concentram principalmente no Centro Histórico da capital, e muitos se encontram em situação de “abandono”. Espaços como o Largo de São Sebastião e a Praça da Polícia são tidos como exceção.
“O restante do que existe está em péssimas condições. Ressalto que a ideia de restaurar é maravilhosa, digna de aplauso. Mas, quando ela é executada de qualquer forma, sem aval de órgãos e com a participação de especialistas, ela acaba por desfigurar o patrimônio histórico”, concluiu.
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