Manaus, 2 de maio de 2024
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Manaus, 2 de maio de 2024

Cenário

Manauaras nunca elegeram um novato no meio político para comandar a cidade

Segundo especialistas ouvidos pelo Portal AM1, a rejeição de nomes ‘novatos’ para o Executivo Municipal reflete como é a política local, uma política fechada em grupos e oligarquias, que não favorece novidades.

Manauaras nunca elegeram um novato no meio político para comandar a cidade

Créditos: Fachada da Sede da Prefeitura de Manaus (Valdo Leão / Semcom) - Amazonino Mendes (Clóvis Miranda) - Eduardo Braga (José Cruz/Agência Brasil) - David Almeida (Antonio Pereira / Semcom) - Arthur Neto (X - Antigo Twitter/@Arthurvneto) - Serafim Corrêa (Divulgação/Correa Benayon) - Alfredo Nascimento (Divulgação/Câmara dos Deputados) - Luíz Alberto Carijó (Thiago Correa/CMM) - Manoel Henrique Ribeiro (Creative Commons)

Manaus (AM) – Os eleitores de Manaus nunca escolheram desde o período da redemocratização, registrada no ano de 1985, um nome novato do meio político para ocupar o mais alto cargo municipal, ou seja, a Prefeitura da cidade.

Desde meados de 1985, todos os nomes escolhidos, pelos moradores da capital amazonense para comandar a cidade, eram ou são conhecidos da política do Amazonas ou àqueles que tinham o apoio declarado dos chamados ‘caciques políticos’ e nomes mais populares da história da política no estado.

Segundo especialistas ouvidos pelo Portal AM1, a rejeição de nomes ‘novatos’ para chefe do Executivo Municipal reflete como é a política local, uma política fechada em grupos e oligarquias, que não favorece novidades.

Há apenas uma exceção nesse cenário, que foi o que aconteceu nas eleições gerais de 2018, quando o eleitor amazonense escolheu Wilson Lima (União Brasil) para governador, um novato em relação a todos os outros nomes que disputavam com ele naquele pleito.

Na visão de outros cientistas políticos, a exceção do ano de 2018 aconteceria com “qualquer pessoa” que se apresentasse como novidade na disputa eleitoral daquele ano, que foi marcada pelo discurso do ‘novo’, em detrimento às velhas figuras do meio político.

Raio-X

Os nomes que já comandaram a capital do Amazonas no período analisado pela reportagem foram: Amazonino Mendes; Manoel Henrique Ribeiro, conhecido como ‘Manoel Pracinha’; Alfredo Nascimento; Arthur Neto; Eduardo Braga; Luís Alberto Carijó; Serafim Corrêa e David Almeida, sendo que Amazonino esteve na Prefeitura por três vezes, Manoel por duas vezes; Alfredo também por duas vezes e Arthur três vezes.

Manoel foi o menos conhecido entre os nomes, mas ele ocupou cargos na administração municipal, nomeado pelo próprio Amazonino.

Alberto Carijó era presidente da Câmara Municipal de Manaus (CMM), quando assumiu o cargo temporariamente em 2004, devido a renúncia de Alfredo que se tornou ministro dos Transportes, na época. Após isso, Carijó também exerceu cargo de primeiro escalão em secretarias municipais.

O site de Divulgação de Candidaturas e Contas, o ‘DivulgaCand’, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contém informações sobre as eleições municipais somente a partir da eleições de 2004.

De acordo com os dados, em 2004 disputaram o cargo de prefeito seis nomes: Amazonino; Arthur; Herbert Amazonas; o atual senador Plínio Valério, a ex-senadora Vanessa Grazziotin e Serafim, que foi o vencedor da disputa.

Nas eleições de 2008, novamente seis pessoas entraram na disputa: João Ricardo Bessa Freire, mais conhecido como Bessa, candidato pelo PSOL; Luiz Navarro; o atual senador Omar Aziz; Francisco Praciano; Serafim e Amazonino, este último venceu a eleição.

Já no ano de 2012, nove políticos concorreram ao cargo de chefe do Executivo Municipal: Arthur Neto que se elegeu a prefeito; Henrique Oliveira; Herbert Amazonas; Jerônimo Maranhão; Luiz Navarro; Pauderney Avelino; Sabino Castelo Branco; Serafim e Vanessa.

Em 2016 novamente nove nomes estavam na corrida pela cadeira de prefeito, quando Arthur foi reeleito. Disputaram o cargo: Henrique Oliveira; Hissa Abrahão; José Ricardo; Luiz Castro; Marcelo Ramos; Marcos Antônio de Queiroz, conhecido pelo último sobrenome, Serafim e Silas Câmara.

O último pleito municipal, que teve como vencedor, o atual prefeito David Almeida (Avante), foi a disputa com mais candidatos, exatamente onze pessoas. Concorreram com David: Amazonino Mendes; Alfredo Nascimento; Capitão Alberto Neto; Chico Preto; Coronel Menezes; Gilberto Vasconcelos; Marcelo Amil; Ricardo Nicolau; Romero Reis e José Ricardo.

Novatos de 2020 e 2022

Podem ser considerados nomes novos nas eleições de 2020, Capitão Alberto que obteve 76.576 votos (7,95%); Coronel Menezes que alcançou 110.805 votos (11,51%); Ricardo Nicolau que teve 12,29% dos votos, um total de 118.289 votos; Romero Reis que recebeu 29.102 votos (3,02%); Marcelo Amil que obteve 0,29% dos votos (2.280) e Gilberto Vasconcelos com apenas 742 votos (0,08%). Juntos eles obtiveram 338.310 mil votos.

No segundo turno daquele ano, David obteve 466.970 votos contra 443.747 de Amazonino. A votação dos adversários totalizou 910.717 votos.

O último pleito realizado no estado foi o geral, em 2022 que contou com outros nomes novatos, como o da defensora Carol Braz que conseguiu 87.114 votos (4,55%) e Israel Tuyuka que conquistou 21.229 votos (1,11%). Os dois tiveram um total de 108.343 votos.

Política fechada

Para o sociólogo, cientista político, especialista em eleições e professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Gilson Gil, o resultado de 2018 realmente foi uma exceção, uma vez que nas outras apenas figuras conhecidas saíram vencedoras.

No entanto, na opinião de Gilson, Manaus elegeu três vezes um candidato de oposição ao grupo de poder. Arthur, em 1988, ganhando de Gilberto Mestrinho e Amazonino; o próprio Amazonino em 1992 contra Arthur e José Dutra e Serafim em 2004 que venceu Amazonino e Eduardo.

“É possível, em Manaus, um oposicionista vencer, mas mesmo assim, foram nomes que já existiam no campo político. Nenhum era um outsider, como Wilson em 2018. A minha leitura é que em 2018, qualquer ‘poste’, se fosse novidade, venceria. Em 2020 para prefeito, a situação já estava mais moderada e ainda tinha a pandemia. Podemos dizer que David era novo em relação ao Amazonino, na época. Em 2004, já havia ocorrido uma novidade moderada, com a eleições do Serafim. Nossa política não favorece novidades, é muito fechada em grupos e oligarquias. Geralmente o grupo do poder prevalece”, disse.

Desafios para os novos

Carlos Santiago, que é sociólogo, cientista político e advogado disse à reportagem que nunca alguém fora da tradição política foi escolhido para prefeito em Manaus e que as pessoas novas enfrentam muitas dificuldades devido uma tradição da cidade manauara.

Ele afirmou que alguns nomes sem experiência administrativa já estiveram no cargo, mas nunca alguém que estava fora da tradição partidária.

“Nem nas eleições de 2016 em que o país renovou os prefeitos, elegendo prefeitos como João Dória (São Paulo), Alexandre Kalil (Belo Horizonte) e Marcelo Crivella, no Rio de Janeiro, a cidade de Manaus renovou em relação ao seu prefeito. Manaus em vez de apostar em Marcelo Ramos, que naquela época era algo novo resolveu manter o mandato do ex-prefeito Arthur. Então, os desafios para os novos políticos e até para aqueles que estão fora da política são enormes, devido a tradição da cidade, mas Manaus tem também uma visão mais de ousadia política. Talvez o eleitorado esteja aguardando alguém para de novo, assim como já fez lá atrás com Arthur, eleger uma nova referência política da cidade e do estado”, opinou.

Articulação e mobilização

Já na visão do cientista político, antropólogo e professor do Departamento de Ciências Sociais da Ufam, Ademir Ramos, o ‘novo’ é o resultado de uma articulação e mobilização de forças em torno de um partido. Ele defende que se o partido tiver a capacidade de fazer isso, o novo pode alcançar sucesso no processo eleitoral.

“O Wilson Lima (governador) é um bom exemplo, teve toda uma força em volta dele e um respaldo partidário, porque faz parte da regra do jogo, da disputa eleitoral no Brasil e ele se deu muito bem em termo de sucesso, o ex-presidente Bolsonaro (Jair) é outro exemplo também numa outra instância executiva”, destacou.

Ademir também enfatizou que se houver essa articulação para as eleições deste ano isso pode acontecer e Manaus eleger uma pessoa com um perfil muito mais técnico.

“Tudo isso passa pela questão do partido político. Como os partidos políticos no Brasil e particularmente, aqui no Amazonas, são dominados por oligarquias familiares e interesses burocráticos distanciados dos interesses coletivos e sociais isso é muito raro acontecer. Quer dizer, não é o novo em si, que não aparece e não se coloca como uma opção, é o próprio partido político que ofusca esse surgimento e ascensão”, finalizou o professor.

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