Manaus, 7 de maio de 2024
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Cidades

‘O planeta vai fritar se nada for feito’, alerta biólogo sobre Floresta Amazônica e o aquecimento

A Floresta Amazônica é a maior floresta tropical do mundo e é famosa por sua biodiversidade. Ela está presente no Brasil, Colômbia e Peru

‘O planeta vai fritar se nada for feito’, alerta biólogo sobre Floresta Amazônica e o aquecimento

Foto: Arquivo / AGU

Amazonas – Um estudo realizado por uma equipe de mais de 30 autores, incluindo pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI), apontou que a maior floresta tropical do mundo pode estar aquecendo a atmosfera global no lugar de resfriá-la.

O artigo “Carbono e além: a biogeoquímica do clima em uma Amazônia em rápida mudança” (Carbon and Beyond: The Biogeochemistry of Climate in a Rapidly Changing Amazo​n) revisa os impactos relacionados ao desmatamento e à perda da floresta no bioma por dióxido de carbono CO2.

O estudo ainda investiga vários agentes de mudança menos reconhecidos, incluindo os outros gases de efeito estufa, como metano (CH4), óxido nitroso (N2O) e carbono negro de incêndios, compostos orgânicos voláteis biogênicos, aerossóis, ozônio e a soma da evaporação da água, do solo e da transpiração das plantas.

Outro ponto abordado no artigo, que foi publicado recentemente no periódico suíço Frontiers in Forests and Global Change, faz uma abrangente avaliação dos efeitos da Floresta Amazônica, incluindo a sua degradação por fogo e outros processos, no clima global até o momento.

O artigo Carbono e além: a biogeoquímica do clima em uma Amazônia em rápida mudança revisa os impactos relacionados ao desmatamento e à perda da floresta no bioma no dióxido de carbono CO2 - Foto: Divulgação_Floresta_Amazônica
O artigo Carbono e além: a biogeoquímica do clima em uma Amazônia em rápida mudança revisa os impactos relacionados ao desmatamento e à perda da floresta no bioma  – Foto: Divulgação_Floresta_Amazônica

Para o biólogo e pesquisador do INPA, Philip Fearnside, se em vinte anos isso não for combatido, com ações efetivas, principalmente quanto ao desmatamento da Floresta Amazônica, não só o mundo inteiro vai sofrer, mas todo o Brasil em proporções maiores e catastróficas.

“Os estudos sobre o aquecimento global  avaliam a emissão do gás carbono em um cenário de cem anos para as mudanças acontecerem, mas não temos cem anos para fazer alguma coisa. Se em vinte anos nada for feito para reduzir o aquecimento e evitar a degradação da floresta, o planeta vai ser frito”, disse o pesquisador.

Philip Fearnside relembrou a crise hídrica em São Paulo, em 2014, quando o Estado chegou a ficar quase que totalmente sem o abastecimento de água, usando todas as reservas. Segundo ele, o esgotamento dos recursos hídricos pode ser uma das catástrofes no Brasil, já que os reservatórios dependem 70% da Amazônia.

“Se a floresta aqui virar uma grande pastagem, ou outra coisa que não seja floresta, será um desastre enorme para o país. E não é só questão de dinheiro. O Brasil tem que ter muito interesse para controlar esses impactos de mudanças climáticas, mudar de lado e assumir a liderança”, criticou Philip, dizendo que o país tem se negado a enxergar as causas ambientais.

No ano passado, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou 89.604 focos de calor entre janeiro e outubro - Foto: Gabriela Bilo / Estadão_Floresta_Amazônica
No ano passado, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou 89.604 focos de calor entre janeiro e outubro – Foto: Gabriela Bilo/Estadão

O biólogo disse, ainda, que é necessário realizar um estudo para entender o porquê os “destruidores da floresta” estão realizando a queima e a derrubada das árvores. Segundo ele, não adianta apenas multar quem está provocando o desmatamento.

“O desmatamento tem que ser parado, não é só aplicar multas. Outro problema é a degradação que precisa ser enfrentada, pois ela, de certa forma, é mais prejudicial que o desmatamento. O desmatamento é uma coisa que é proposital. Você decide cortar árvores e você pode decidir não cortar também, além de que o governo pode criar meios para não haver o corte delas. O problema são aqueles que decidem entrar na floresta por conta própria, queimando, assim não tem controle fácil”, diz o pesquisador.

Outras preocupações que foram levantadas pelos pesquisadores envolvidos no estudo é quanto ao gás metano, que é emitido de várias maneiras, seja nas barragens ou na área de várzea.

“Uma descoberta recente é que tem muito gás metano saindo das florestas, principalmente nas áreas de várzea. Não é que a árvore que cause isso, mas o gás sobe pelos vasos dentro das árvores e são liberados e vira uma espécie de ‘chaminé’. Isso é mais um tipo de emissão”, alerta o pesquisador falando de outros componentes que não são gases, mas que vão para o ar, como as folhagens, poeiras e a fumaça”, afirma ele.

As florestas de várzea liberam muito gás metano no ambiente - Foto: Flora Cristalino_Floresta_Amazônica
As florestas de várzea liberam muito gás metano no ambiente – Foto: Flora Cristalino_Floresta_Amazônica

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Madeireiras e o prejuízo à floresta

Além disso, Philip falou também das madeireiras que contribuem para esse aquecimento, mesmo que autorizadas ou não, ela provocam incêndios na floresta. Conforme o especialista, elas retiram os troncos, mas o restante da árvore é abandonado no local e podem ser de fácil combustão para novos focos de incêndio.

“Explorando a madeira, você tira o tronco da árvore para vender e todo o resto fica dentro da floresta. Quando se tem algum fenômeno como o El Niño, por exemplo, a lenha pega fogo. Aí começa um ciclo vicioso e sempre vai haver aquela madeira morta na floresta. Isso também tem que ser combatido”, afirma Fearnside.

Fearnside disse que para essas mudanças climáticas não envolvem apenas a degradação e o desmatamento, mas a queima de combustíveis fósseis em todo o mundo é prejudicial ao planeta e contribuem para o aquecimento global.

O resto das árvores deixados na floresta pelas madeireiras também podem causar novos focos de incêndio - Foto: iStock_Floresta_Amazônica
O resto das árvores deixados na floresta pelas madeireiras também podem causar novos focos de incêndio – Foto: iStock_Floresta_Amazônica

“É importante controlar o aquecimento global do planeta, isso envolve não só  a degradação e o desmatamento, mas também os combustíveis fosseis queimados no mundo inteiro. Alguns países devem reduzir essas emissões brutalmente”, alerta novamente Philip.

Outros destaques feitos pelo pesquisador do INPA, que estão impactando na Floresta Amazônica, são as aberturas de estradas e rodovias, ação de grileiros, instalação de indústrias petroleiras e outros fatores.

Descobertas do estudo:

  • Incerteza considerável nos efeitos diretos e indiretos da Amazônia sobre o clima global, e incerteza ainda maior na resposta desses feedbacks climáticos às mudanças no uso da terra e à degradação de florestas.
  • Apesar dessas incertezas, após considerar o impacto de um conjunto mais amplo de feedbacks biofísicos – da floresta e do clima – (ou seja, dióxido de carbono, mas também metano, óxido nitroso, albedo, evapotranspiração, compostos orgânicos voláteis biológicos, ozônio e aerossóis), conclui-se, pela primeira vez, que o efeito líquido mais provável da Floresta Amazônica é o aquecimento global.
  • Este efeito de aquecimento líquido é conduzido em grande parte pelas emissões de óxido nitroso (N2O), carbono negro de incêndios e metano (CH4) da Floresta Amazônica, que parecem dominar o efeito do resfriamento atmosférico do sequestro de carbono da floresta.
  • O sumidouro líquido anual de carbono da Bacia Amazônica vem diminuindo há algum tempo e as forças políticas e sociais que estimulam a perda de florestas estão se acelerando. As respostas climáticas biofísicas que seguem essas mudanças sugerem que a contínua conversão da floresta provavelmente aumentará o aquecimento atmosférico no futuro.
  • Dada a grande contribuição de feedbacks climáticos menos reconhecidos (por exemplo, árvores amazônicas vivas emitem diretamente ~ 3,5% de todo o metano [CH4] emitido para a atmosfera global), a continuação do foco no carbono florestal sozinho é incompatível com os genuínos esforços para entender e gerenciar as mudanças climáticas globais na Bacia Amazônica.

Fonte INPA

Floresta Amazônica 

A Floresta Amazônica é a maior floresta tropical do mundo, famosa por sua biodiversidade. Ela é atravessada por milhares de rios, entre eles o grandioso rio Amazonas. A floresta cobre boa parte do noroeste do Brasil e se estende até a Colômbia, o Peru e outros países da América do Sul.

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Sobre Philip Fearnside

Biólogo e cientista norte-americano ativo há muitos anos no Brasil, onde desenvolveu a parte mais importante de sua carreira e ganhou ampla notoriedade nacional e internacional.

Pesquisador do INPA, Fearnside é referência para questões de serviços ambientais, BR-319, impactos ambientais de grandes obras na Amazônia e demais temas ambientais.

Philip Fearnside já mora no Brasil desde a década de 70 e é um dos nomes de peso no meio científico
Philip Fearnside já mora no Brasil desde a década de 70 e é um dos nomes de peso no meio científico