*Por Ruy Marcelo
A Administração Pública Brasileira se ressente de várias deficiências e fraquezas de desempenho, mas talvez não haja maior e mais perniciosa que as do universo de obras paralisadas, tendo em vista o seu elevado poder corrosivo ao erário e de obstáculo à satisfação plena do interesse público primário.
Quando não se trata de mau gerenciamento dos contratos, rios de dinheiro são canalizados para satisfazer, em muitos casos, o entusiasmo irrefletido e a prepotência inconsequente do governante da vez, ignorando-se o passivo (financeiro e operacional) dos compromissos efetuados em governos antecedentes. Postulam-se novas obras, inclusive algumas de utilidade questionável, perdendo de vista sérias pendências. Muda o governo, mudam as escolhas, com isso, aprofundando a mazela do abandono das obras públicas.
É quase que generalizado o fato. Levantamento do Tribunal de Contas da União, de agosto de 2023, mostrou haver mais de 8,6 mil obras paralisadas ou inacabadas por todo o País.
No Amazonas, auditoria do Tribunal de Contas do Estado, postulada por representação do MP de Contas, descortinou que, no período de 2009 a 2020, acumularam-se 426 obras estaduais inacabadas, as quais consumiram mais de 1,3 bilhão de reais. Um dos episódios mais relevantes é o da cidade universitária em Iranduba.
Aliás, a gravidade desse cenário motivou o advento de novas leis estaduais. A Lei 5531/2021 prescreve à Administração Estadual a ampla publicidade e transparência ativa sobre as obras paralisadas, inacabadas ou desativadas, com exposição de justificativas e de providências saneadoras.
A seu turno, a Lei 5909/2022 torna obrigatória: 1) a fixação de placa em obras públicas paralisadas com indicação de previsão de retomada bem como 2) o encaminhamento de relatório das obras nessa situação, com as devidas justificativas, à Assembleia Legislativa (ALEAM) e ao Tribunal de Contas (TCE/AM), toda vez que a paralisação exceder a 90 dias.
A ordem jurídica repulsa com veemência a situação. Tanto assim que a hipótese de abandono pode configurar possível ato de irresponsabilidade fiscal. Conforme a norma geral do art. 45 da LRF, é vedado incluir na lei orçamentária e seus créditos adicionais o custeio de novos projetos sem que
estejam adequadamente atendidos os em andamento e contempladas as despesas de conservação do patrimônio público.
Certamente, há casos de inviabilidade superveniente de retomada e justificado motivo ao adiamento ou à alteração de projetos e destinação dos objetos inacabados. Nem tudo é descaso.
Não obstante, seja qual for a situação, o princípio constitucional da eficiência administrativa torna imperativo ao público gestor o estudo da problemática no sentido de avaliar e traçar caminhos para evitar a perpetuação do dano ao patrimônio público, de modo que o assunto não pode passar batido no planejamento público e orçamentário sob pena de caracterizar má-gestão por erro grosseiro e negligência.
Em âmbito nacional, registra-se a esperança de melhor disciplina gerencial do assunto com a vigência da Lei 14719/2023, que institui o pacto nacional pela retomada de obras inacabadas no campo da infraestrutura educacional e de saúde a depender de iniciativa dos estados, DF e municípios envolvidos.
(*) Professor de Direito, Mestre em Direito Ambiental pela UEA
(*) As opiniões e comentários emitidos pelos comentaristas e entrevistados não refletem necessariamente a opinião do Portal AM1.
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