Manaus, 3 de maio de 2024
×
Manaus, 3 de maio de 2024

Cenário

Alessandra Campêlo evita pressão sobre amigo policial envolvido em agressões

Deputada estadual se refere a homens que batem em mulher como "covardes, feminicidas, bandidos e monstros", mas em relação ao amigo policial – envolvido em agressão a uma babá – preferiu um tratamento "diferenciado".

Alessandra Campêlo evita pressão sobre amigo policial envolvido em agressões

Manaus (AM) – A deputada Alessandra Campêlo mudou o tom, nessa segunda-feira (21), a respeito da violência contra mulheres ao se manifestar no caso do policial civil Raimundo Nonato Machado e da mulher, Jussana Machado, que na última sexta-feira (18), agrediram violentamente uma babá em um condomínio no bairro Ponta Negra, zona Oeste de Manaus.

Jussana ainda atirou no advogado Ygor de Menezes Colares, que tentou defender a funcionária.

Antes, a deputada, que preside a Comissão da Mulher, da Família e do Idoso, na Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (Aleam) usava os termos “monstro”, “bandido”, “covarde” e “feminicida” contra acusados e suspeitos de violência contra mulheres.

Mas, agora, manteve distância do episódio envolvendo o policial, que  considera “amigo” e que, recentemente, fez campanha para ela, em 2022, e para o irmão, o vereador Allan Campêlo, em 2020.

(Foto: Reprodução/Redes Sociais)

Na nota divulgada dois dias após o caso se tornar público, em meio à repercussão dos vídeos das agressões nas redes sociais, a deputada repudiou a violência e afirmou que o trabalho dela como parlamentar não é seletivo, porém, em nenhum momento, fez qualquer referência aos “amigos” agressores da babá e do advogado.

“Repudio a violência contra a mulher de todas as formas, seja quem for o autor! Num país com 1 feminicídio a cada 6 horas e 1 estupro a cada 7 minutos, minha luta contra a violência não é pessoal nem seletiva. Agressão não é a resposta para qualquer desavença, dentro ou fora de casa. No caso da agressão a babá, divulgada em redes sociais, assim como em TODOS os casos que chegam à Procuradoria da Mulher, colocamos à disposição da vítima nosso apoio jurídico e psicossocial. Violência contra mulher é crime!”

A resposta da parlamentar se diferencia de outras manifestações públicas sobre violência contra mulher. “A missão de defender as mulheres eu abraço de corpo e alma. A Procuradoria da Mulher da @assembleiaam é uma mão forte que pesa sobre os agressores, covardes e feminicidas. Acompanhei o Caso Débora desde o início e, hoje, fui ao Pará na missão que uniu as polícias do Amazonas e Pará na captura do Gil Romero, principal suspeito da morte da jovem”, disse a parlamentar sobre o caso de feminicídio ocorrido no início do mês de agosto.

Outro post foi publicado com os dizeres “enjaulado”, se referindo ao caso do homem flagrado espancando uma mulher no meio da rua em Manacapuru.

Veja abaixo como a parlamentar costuma reagir à prisão e denúncias de homens envolvidos em agressões a mulheres:

Na manhã desta segunda-feira (21), Alessandra Campêlo voltou a se manifestar sobre o caso, após informar que esteve em alguns municípios do interior do estado para realizar ações em benefício da população.

Em seguida, a parlamentar divulgou o nome da babá, vítima da agressão e afirmou que o caso é algo lamentável e repugnante. “O caso da agressão à Cláudia, – a babá, e estou nominando porque ela não é simplesmente uma pessoa agredida, ela é um ser humano, ela é uma mulher, o nome dela é Cláudia, ela está recebendo apoio psicossocial da Procuradoria da Mulher. Ela já teve atendimento da nossa assistente social que a levou até o pronto-socorro. Ela teve também atendimento jurídico, a nossa advogada esteve na delegacia, e também está tendo apoio psicológico”, disse.

Alessandra disse que trata as questões de combate à violência contra a mulher de forma impessoal. “Conheço professor Nonato, conheço sim a sua esposa, mas o fato de conhecê-los não me exime em momento algum de abrir mão de atuar juridicamente e com apoio psicossocial à Claudia, que é a mulher que foi agredida”.

Diferente de outras manifestações, a deputada lembrou que o policial é responsável por atividades sociais envolvendo crianças em situação de vulnerabilidade social.

“É lamentável, porque de onde eu conheço o professor Nonato, conheço de mais de 50 projetos sociais que nós já apoiamos com a distribuição de quimonos, que davam aulas gratuitas pra crianças em situação de pobreza e extrema pobreza. Foram centenas de meninos e meninas que tiveram oportunidade, por meio do esporte, puderam estudar e tiveram ali, com a disciplina – que é sim fundamental no ensinamento do jiujítsu – seguiram bons caminhos, que eram crianças e hoje são adultos que fazem uma faculdade ou que trabalham e que tiveram os bons ensinamentos do jiujítsu (..) porque é toda uma história, uma carreira que é praticamente sepultada por conta de uma atitude como aquela que deixou não só o Amazonas, mas todo o Brasil horrorizado”, disse Alessandra.

A deputada concluiu o discurso na Aleam dizendo que poderia ter feito um vídeo com a equipe dela na delegacia e, no sábado, no hospital, mas, segundo ela, naquele momento, a vítima estava muito abalada. “Eu não uso do mandato e da procuradoria pra lacrar na internet, eu uso meu trabalho pra verdadeiramente ajudar as mulheres. Não faço hipocrisia, o meu trabalho e meu apoio às mulheres é impessoal, ele não é seletivo”, afirmou.

Rigor para pobres e inimigos

Para Fabrício Paixão, professor, advogado, filósofo e psicólogo; o comportamento da deputada revela o personalismo político que, segundo ele, ainda permeia a República brasileira.

“Morte aos inimigos e proteção aos amigos. Atualmente, o importante para um posicionamento não é a conduta em si, mas quem praticou a conduta. Não seria incomum um sujeito cometer um crime e ser condenado pela opinião de determinado político, enquanto outro cometendo o mesmo crime ser protegido, pois a ética dos políticos brasileiros baseia-se nos interesses próprios.

Ainda conforme o advogado, não se emite opinião em relação à conduta, mas às pessoas. “Se for um inimigo político, a conduta será reprovada veementemente. Se for amigo, finge-se cegueira. Isso revela que a política de rigor das leis que alguns políticos pregam só serve para os pobres e seus inimigos”, enfatizou o advogado.

Honrarias nas Casas legislativas

O mestre de jiu-jitsu e investigador da Polícia Civil, Raimundo Nonato Machado, recebeu, em 2021, a Medalha de Ouro Alfredo Barbosa Filho na Câmara Municipal de Manaus (CMM). Mas, por conta do episódio de violência em que ele se envolveu, na última sexta, a CMM deu início, no domingo (20), ao processo para o cancelamento da honraria.

Raimundo Nonato recebeu honraria da CMM em 2021. A homenagem foi proposta pelo vereador Allan Campêlo (Foto: CMM)

Sobre as medalhas e homenagens concedidas por parlamentares na Aleam e na CMM, o analista político e advogado, Carlos Santiago, chamou de “indústria de produção de comendas” dentro dos parlamentos.

“Comenda para um ex-governador do Estado que foi cassado por compra de voto; é comenda dada a um ex-presidente que se tornou ficha-suja; é comenda dada a pessoas que não contribuíram em nada para a cultura, para a economia, para o social do Amazonas e da cidade de Manaus. Conceder medalha sem nenhum critério real, sem uma investigação para saber quem é a pessoa agraciada, acaba acontecendo o que aconteceu na Câmara dos Vereadores de Manaus, que em nome da sociedade, deu um título para um indivíduo que pela sua história não merece e não merecia receber qualquer título”, disse.

Para o especialista, a ação de abusos e violência, seja contra homem ou contra mulher, não pode ter amparo na sociedade e muito menos para aqueles que se colocam como representantes do povo.

“Isso é um exemplo negativo, mas que pode trazer algo positivo a medida que os legisladores comecem a fazer de fato uma triagem mais seria para concessão de títulos dentro do Poder Legislativo. Não pode ser apenas um ato pessoal, na amizade ou por interesse eleitoral, a sociedade paga muito caro para que os contribuintes sejam bem representados”, concluiu.