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Economia

Dez anos da PEC das Domésticas: trabalhadoras do AM divergem sobre mudanças

Mesmo com direitos garantidos, domésticas ainda veem vantagens em exercer a profissão sem carteira assinada

Dez anos da PEC das Domésticas: trabalhadoras do AM divergem sobre mudanças

Milhões de trabalhadoras ainda atuam na informalidade (Foto ilustativa: Tânia Rêgo/Agência Brasil)

Manaus (AM) – Há exatos 10 anos, a Constituição Federal sofreu uma alteração para igualar as trabalhadoras domésticas aos demais trabalhadores brasileiros. No entanto, nesse período, muitas domésticas ainda estão optando por exercer a profissão sem carteira assinada, para aumentar os lucros.

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), até janeiro deste ano, 4,4 milhões de trabalhadores domésticos atuavam sem carteira assinada, o equivalente a 74, 8% do total – ou 3 de cada 4.

A nova legislação para a profissão determina que a jornada diária da doméstica ou doméstico deve ser de oito horas diárias ou 44 horas semanais, podendo ser reduzida. O tempo de trabalho também pode ser negociado entre a empregada e o seu empregador, segundo a Lei das Domésticas, com jornadas diárias de 12 horas seguidas por 36 horas de descanso.

Com a nova lei, é obrigatório o controle das horas trabalhadas com a folha de ponto. O controle pode ser feito de forma manual, mecânica ou eletrônica.

No caso de excederem as 44 horas semanais, o empregador deve pagar hora extra, que no período de segunda a sábado, devem ter acréscimo de no mínimo 50% do salário. Nos domingos e feriados, as horas são calculadas com 100% de acréscimo.

Regulamentação

Segundo a advogada Aline Laredo, a nova lei veio para fazer jus à profissão pelos empregados domésticos, que estavam, em parte, fora da legislação. Aprovada em 2013 e regulamentada em 2015, a lei chegou para estabelecer direitos, como o recolhimento mensal de FGTS e, no caso de o colaborador terminar o contrato, no momento da rescisão, tem direito de recolher a multa de 40% do FGTS, ao seguro-desemprego, as horas extras, auxílio-acidente e todos os previdenciários.

“Foi um marco divisório para essa categoria, que a partir deste momento, ele [empregado] passou a ter esses direitos garantidos porque antes dessa lei, mesmo que o empregado doméstico entrasse na Justiça do Trabalho, ele não tinha uma legislação que o resguardasse porque eles estavam fora da CLT [Consolidação das Leis do Trabalho]”, disse Aline Laredo.

A advogada explicou que o empregador precisou fazer uma organização. A especialista em Direito Trabalhista afirma que o trabalho doméstico sempre foi feito de maneira informal e destacou que, no Amazonas, mais ainda, onde muitas meninas com idade entre 7 a 10 anos vinham de cidades do interior para trabalhar em casas de família. Por providenciarem casa, alimento e, algumas vezes, escola, os empregadores consideravam isso como salário das crianças.

“Houve uma resistência cultural nos estados, mas também no Amazonas, muito grande. Então foi um marco muito importante para essa categoria ver os seus direitos reconhecidos em legislação”, disse Laredo.

Ainda segundo a especialista, após a legislação, muitas domésticas pediram o desligamento para, então, trabalharem de carteira assinada. Ela explicou que, hoje em dia, os tributos do salário mínimo de um empregado doméstico chegam a sair, em média, por R$ 335, 00.

Além disso, com a legislação, foi criado o e-social, portal de tributação única do empregado doméstico, no qual o empregador usa para registrar alguma ocorrência como o caso de a empregada ficar grávida.

Caso o empregador não saiba como utilizar o portal, ele pode contratar um advogado ou contador para fazer o registro.

Quando o “patrão” realiza o salário do empregado, ele já está fazendo o pagamento dos 40% do FGTS mensalmente e, quando chegar o momento que o empregado for demitido, a porcentagem já está no seu salário do que foi depositado durante o tempo de trabalho. E no caso de demissão por justa causa, o empregador pode ir até a Caixa Econômica Federal sacar o valor que não foi utilizado.

A advogada explicou que muitos empregadores demitiram as pessoas que trabalhavam em suas casas. Mas disse que teve uma parte que conseguiu manter o trabalhador. Ela ressaltou que o trabalho doméstico ainda é uma das categorias mais informais, porém, que tem melhorado, relatando que muitos só aceitam exercer a profissão de carteira assinada.

O ponto de vista das profissionais

Ao Portal AM1, a empregada doméstica Enizia Pereira da Costa, de 42 anos, que atualmente está cursando a faculdade de Direito, disse ser diarista e está há um ano na profissão, e agora é empregada doméstica com carteira assinada.

Ela aprova a a regularização da categoria, pois garante direitos. Para dona Enizia, a nova lei ampara a sua profissão.

“Foi muito melhor para mim, trabalhar de carteira assinada porque eu era diarista anteriormente. Era um dinheiro que eu pegava rápido, mas também não dava para eu me programar com nada. Então a partir do momento que eu comecei a trabalhar de carteira assinada, eu posso me programar para fazer uma compra a longo prazo. Fora os benefícios que nós temos como o INSS”, disse.

“Então, se eu precisar de algum dia, que Deus me livre, eu precisar me ‘encostar’, parar de trabalhar por doença ou outro problema, eu tenho o INSS como amparo. É um dos benefícios, mas tem também o vale-transporte, alimentação, então ficou bem melhor de carteira assinada. Nós pegamos o dinheiro de uma só vez. Eu achei muito melhor de carteira assinada”, disse Enizia.

Maria Vanda Marques de Souza, de 45 anos, por sua vez, ver vantagens em não ter a carteira assinada. Ela conta que trabalhou durante 16 anos dessa forma mas, pós a mudança na legislação, o empregador não teve condições de mantê-la como determina a lei.

Atualmente, Vanda continua trabalhando com a mesma família, porém, como diarista. Ela disse que a mudança de passar de carteira assinada para diarista, foi boa, mesmo não tendo mais o salário fixo no final do mês.

“Além de eu trabalhar com as mesmas pessoas, apenas uma ou duas vezes por semana, eu ainda tenho a oportunidade de trabalhar com outras pessoas e aumentar a minha renda”, afirmou.

“Para mim, melhorou em parte porque a minha renda melhorou e tenho um pouco mais de tempo para resolver assuntos pessoais. E optei trabalhar também, com artesanato, que com o meu trabalho de diarista, melhorou na questão financeira”, completou.

Contudo, ela afirma que seria bom se pudesse conciliar o aumento da renda com alguns dos direitos garantidos. Segundo Vanda, quando a pessoa tem um salário fixo, pode administrar melhor os gastos, por outro lado, como diarista pode ampliar a renda e tem mais tempo livre.

“Hoje eu tenho mais tempo para dar assistência para minha família, fazer coisas que eu não fazia antes. Porque trabalhar de carteira assinada requer muito do seu tempo. Você tem um compromisso com aquele trabalho, então você só falta por motivos de doença ou por algum motivo extraordinário que não possa estar no local”, concluiu.

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