Manaus, 29 de março de 2024
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Cenário

Rotta se exibe com ‘trabalho’ nas redes sociais, mas ignorou demanda dos moradores de Manaus

Enquanto o vice-prefeito mostra trabalho a todo vapor, as ruas de Manaus ficaram esquecidas, mesmo com um orçamento milionário

Rotta se exibe com ‘trabalho’ nas redes sociais, mas ignorou demanda dos moradores de Manaus

Foto: Reprodução

MANAUS, AM – Querendo aparecer com uma boa imagem, Marcos Rotta (MDB), vice-prefeito de Manaus e comandante da Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminf), usa as redes sociais como uma forma de se promover e alegar que está realizando um bom trabalho à frente da pasta. No entanto, a realidade da população manauara é diferente da que é mostrada por ele na internet, e o que deixou de ser feito em 2021 fica como pendência para um orçamento milionário para 2022.

Com o período de chuva cada vez mais intenso, os moradores dos bairros de Manaus têm relatado as alagações nas residências causadas por falta de infraestrutura. Parte desse problema são as ruas esburacadas, que acabam acumulando a água da chuva e se espalhando nas casas das famílias. É por meio das redes sociais, inclusive, que os moradores denunciam a falta de atenção da Prefeitura de Manaus para solucionar as demandas.

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Mas, se os moradores usam as redes sociais para cobrar soluções das autoridades, o vice-prefeito de Manaus utiliza para mostrar que os problemas estão sendo resolvidos. No comando da Seminf, Rotta não deixa espaço e estampa que “o trabalho não para”, preenche cada lacuna da sua página na internet para garantir ao eleitor que o voto não foi jogado fora.

Foto: Reprodução

Entre ocultar comentários que cobram trabalho da Seminf, Marcos Rotta tenta mostrar um pouco do trabalho que é executado para recuperar as ruas de Manaus. Em 2022, o objetivo é asfaltar 10 mil ruas da cidade, deixando as demais para cronogramas futuros. Para este ano, a Prefeitura de Manaus conta com o orçamento de mais de R$ 7,1 bilhões, sendo esse valor dividido entre as secretarias, deixando a Seminf com R$ 398.160,00 (trezentos e noventa e oito mil, cento e sessenta reais), conforme o Demonstrativo das Despesas por Órgão da Lei Orçamentária Anual.

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Porém, mesmo aparentando estar cumprindo com o dever, a população espera pelo trabalho que não chega. No primeiro ano da administração, a Seminf gastou quase R$ 36 milhões em contratos, de acordo com o Portal da Transparência. Apenas com despesas, a pasta teve R$ 503.870.617,41 (quinhentos e três milhões, oitocentos e setenta mil, seiscentos e dezessete reais e quarenta e um centavos), mas esse valor milionário não foi aplicado em melhorias em muitos bairros da cidade.

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Foto: Osmar Neto / Seminf

As despesas do ano ainda tiveram um acréscimo de R$ 39.688.531,81 (trinta e nove milhões, seiscentos e oitenta e oito mil, quinhentos e trinta e um reais e oitenta e um centavos). Vale lembrar que o prefeito David Almeida (Avante) ainda foi à Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam) para pedir um “socorro” aos deputados estaduais quanto ao orçamento de 2021, que teve o valor de mais de R$ 5 bilhões.

Com um orçamento bem cheio, as obras conseguiram chegar às ruas de Manaus, no entanto, somente nas vias principais, deixando as ruas secundárias de fora do cronograma. Durante o ano de 2021, o Portal Amazonas 1 mostrou diversas denúncias de moradores que relataram a falta de infraestrutura nos bairros, entre as denúncias, a de um morador que já tinha levado o problema de infraestrutura de sua rua até a Seminf, por oito vezes, mas nada tinha sido solucionado.

Buracos espalhados pela cidade

A rua que bateu recordes de reclamações por conta dos buracos foi a rua Mantiqueira, esquina com a rua Cubatão, no bairro Redenção, zona Centro-Oeste da cidade. O problema que apareceu devido a uma obra de reparo em uma tubulação já era um problema antigo enfrentado pelos moradores, mas com a nova gestão, continuou sendo o pesadelo das famílias que moram na região.

Após muita insistência da população, o prefeito David Almeida e o vice-prefeito Marcos Rotta chegaram a ir ao local e prometeram solucionar o problema, mas o serviço não foi visto. Na ocasião, foi determinado o início imediato das obras de recuperação na rua. Para chamar a atenção das autoridades, os moradores realizaram uma manifestação para cantar “parabéns” à elas, com direito a bolo de aniversário para o buraco.

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Foto: Reprodução

“Eles vêm aqui, eles olham, eles enganam a gente e dizem que vão fazer uma coisa e não fazem. Estamos cansados das mentiras que contam para gente. Queremos solução, não queremos mais mentira!”, desabafou uma moradora ao vereador Rodrigo Guedes (PSC).

Outra moradora ainda revelou que o vice-prefeito Marcos Rotta a bloqueou nas redes sociais por conta dos diversos comentários exigindo ações de recuperação na rua. “Ele vem dizer que o trabalho não para, mas aqui parou faz meses!”, desabafou.

Foto: Reprodução

Na época, o Portal Amazonas 1 procurou a Seminf para tratar da situação da rua. A pasta informou que ‘’devido às construções irregulares na área, não tinha condições de acesso com a movimentação de máquinas e equipamentos mais pesados e que aguardava ‘’as desapropriações, todas as medidas para que a recuperação da área seja iniciada estão sendo tomadas para que não haja riscos para a população’’.

Serviço incompleto

Quando se trata de tentar  solucionar o problema, a Seminf acaba fazendo um trabalho pela metade. No bairro Santo Antônio, na zona oeste, por exemplo, os moradores relataram que a pasta teria recapeado apenas o trecho da rua que passa em frente à Unidade Básica de Saúde (UBS), mas na parte de baixo da rua, a via estava completamente esburacada

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“Isso é só um serviço superficial. O ideal é fazer o serviço completo, que é recapear toda a via, e não jogar apenas o asfalto. Daqui a pouco, esses buracos estão abertos de novo”, disse um dos moradores ao Portal Amazonas 1.

Em duas ocasiões, a equipe de reportagem foi até o local para denunciar a falta de infraestrutura na rua. Em todas as vezes, a situação foi encaminhada para a Seminf, que informou que o bairro entraria no cronograma de obras. Entretanto, quando foi incluída, os moradores foram surpreendidos com um trabalho mal executado.

Prefeitura
Foto: Antônio Mendes/Amazonas1

“A situação é horrível e precária, principalmente no período de chuva. A situação está no bairro todo, lá em cima [na rua principal] está asfaltado, mas só lá. O resto está tudo assim, cheio de buraco, cheio de cratera, e quando está chovendo, fica tudo alagado”, comentou dona Lara, uma das moradoras do local.

Em uma mesma denúncia no bairro, um morador que se identificou como Marcos desafiou o vice-prefeito a solucionar o problema das ruas esburacadas. Na época, ele afirmou que a equipe da Seminf chegou a realizar serviços no local, mas classificou as ações como “sem vergonha”.

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“No começo deste ano, até apareceu uma equipe aqui da Seminf, mas aquele serviço “sem vergonha”. Porque o serviço só presta onde o vice-prefeito [Marcos Rotta], responsável pela pasta, está presente com equipe de filmagem da prefeitura”, desabafou.

O morador ainda revelou que entrou em contato com Marcos Rotta para informar sobre a qualidade do serviço prestado aos moradores, mas foi ignorado pelo órgão. “Venha ver a situação da rua! Eu, na primeira vez que a equipe veio aqui e fez o serviço ruim, eu entrei em contato com o senhor e avisei que o serviço tinha ficado ruim, de péssima qualidade”, disse.

Contradição

A falta de compromisso demonstrada pelo vice-prefeito entra em contradição com as críticas que ele fez durante o primeiro ano em relação à gestão do ex-prefeito Arthur Neto (PSDB). Sendo vice do tucano, o mandato dos dois foi repleto de polêmicas e em entrevista, Rotta chegou a dizer que foi traído pelo companheiro.

Em um dos escândalos da gestão passada, Rotta precisou deixar o comando da Seminf após um rompimento político entre Arthur e o senador Eduardo Braga (MDB), e ao receber o convite para ser candidato ao Governo do Estado do Amazonas, mas a história não foi para frente – o que só complicou ainda mais o clima entre os dois.

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“Tive que sair da secretaria, onde eu já estava enraizado num trabalho de mais de um ano. Aceitei o convite, me desincompatibilizei da secretaria e fui adubado durante praticamente cinco meses”, relatou.

Foto: Divulgação

Na época, o vice-prefeito de Manaus estava filiado ao PSDB, mas acabou sendo surpreendido com a candidatura de outro político para disputar o cargo, este anunciado por Arthur Neto. “Mas quatro dias depois, em uma rede social, vem uma postagem do excelentíssimo senhor feudal, mas conhecido também como prefeito, postando que o nosso candidato seria outro”, explicou.

Em entrevista, Rotta disse ter ficado chateado com a situação, e buscou um novo partido. Defendendo uma nova sigla, ponderou que não está na política para ser servido, mas sim para servir.

Agora, com um novo prefeito para demonstrar lealdade, Rotta faz comentários sobre a gestão passada, mais precisamente sobre Arthur, o que demonstra que a Prefeitura de Manaus quer apagar a administração do tucano e criar uma nova identidade para o município.

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Uma das obras atacadas pelo vice-prefeito foi o complexo viário na avenida Max Teixeira, que foi inaugurado às pressas pelo ex-prefeito. Segundo Rotta, seria necessário que a obra passasse por uma revisão para corrigir erros.

Na época, Marcos Rotta afirmou que a administração acionaria o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Amazonas (CRE-AM) para “acautelar” e desenvolver um parecer técnico “apartidário” em relação às condições do viaduto. “Temos uma série de problemas para enfrentar”, destacou.

Após cirurgia, vice-prefeito Marcos Rotta segue no hospital e passa bem
Foto: Reprodução

Por sua vez, o prefeito David Almeida explicou que a vistoria não era uma forma de atacar as obras entregues por Arthur Neto, mas sim para garantir a segurança da população. “Ele [Arthur] reclama que só falamos das coisas ruins; não! Estamos falando das coisas boas, só que como gestor cabe a mim constatar se as obras estão dentro do padrão de engenharia”, disse.

Entre tantas contradições e compartilhamentos para gerar engajamento, é a população de Manaus que sofre com a falta de atenção da prefeitura, em especial da Seminf, uma vez que não é ouvida quando precisa e acaba ficando em segundo plano, em um jogo político em que a imagem vale mais do que o trabalho executado.