Manaus, 22 de maio de 2024
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Cenário

Prefeito de Iranduba chama concursados a ‘pinga gota’ enquanto prazo de validade se exaure

A data de validade do concurso se esgota em dezembro

Prefeito de Iranduba chama concursados a ‘pinga gota’ enquanto prazo de validade se exaure

Fotos: Acervo pessoal dos candidatos

Os aprovados no concurso da Secretaria Municipal de Educação de Iranduba (SEMEI) fizeram várias denúncias ao Portal AM1 sobre a lentidão na convocação dos que estão dentro do número de vagas previstas no edital, dificultando também, o chamamento dos que fazem parte do Cadastro Reserva do certame. Além disso, há denúncias de servidores com cargas dobradas e relatos de que merendeiras e até vigias estão dando aula nas escolas do município.

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A data de validade do concurso se esgota em dezembro deste ano e os aprovados temem que o prefeito da cidade, Augusto Ferraz (Democratas), não atenda uma das reivindicações da comissão, amparada pela Lei 14.314/22. A norma trata da mudança do prazo de validade de concursos, possibilitando a prorrogação, devido ao decreto que reconheceu o estado de calamidade pública no país, em 2020, período crítico da pandemia da Covid-19.

O concurso foi realizado na gestão do ex-prefeito, Francisco Gomes da Silva, conhecido como ‘Chico Doido’. O certame foi homologado em dezembro de 2020, determinando a classificação definitiva dos aprovados e frisando a validade por dois anos, assim como a permissão de prorrogação por mais dois anos ‘para atender o interesse público da administração’.

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De acordo com o edital de n° 02/2020, o total de vagas era 211, bem como a formação de Cadastro Reserva. Os cargos foram divididos em quatro setores, sendo: Estrada e Ramais; Rio Negro; Rio Solimões; Cacau Pirêra e Sede. Das 211 vagas, 12 eram para o cargo de serviços gerais.

As áreas previstas no concurso eram: Educação Infantil; Língua Portuguesa; Matemática; Ciências; Geografia; História; Educação Física e Língua Inglesa, com um número específico para cada setor e disciplina, além das vagas destinadas a Pessoas Com Deficiência (PCDs).

Segundo a pedagoga Nilza Nobre, a chamada dos aprovados é conhecida como a ‘convocação pinga pinga’, uma vez que o prefeito chama poucas pessoas de cada setor a cada convocação.

“Eles estão chamando a conta gota. Sou a vigésima sexta do setor de Estradas e Ramais, que possui trinta e uma vagas e até agora foram convocados apenas dezesseis professores”, contou a pedagoga.

A comissão responsável pelo concurso relatou à reportagem que já tentou diversas vezes manter um diálogo com o chefe do Executivo de Iranduba e com o secretário de Educação, mas não obteve sucesso. Por meio de ofícios, eles tentam um acordo, mas não foram recebidos.

Jhames Bessa é um dos professores que está na lista dos classificados, ou seja, do Cadastro Reserva. Ele revelou a aflição de não ver a convocação nem dos aprovados no número de vagas, uma vez que a validade do concurso se aproxima, bem como a angústia por nunca terem conseguido ter uma conversa com Augusto Ferraz.

“Desde o início de 2021 tentamos manter um diálogo com o prefeito, mas ele nunca quis nos receber. Temos provas de documentos protocolados na Prefeitura pedindo reunião com ele. Fomos recebidos uma vez apenas pelo ex-secretário de Educação, que na ocasião, nos disse que o concurso não era para ter acontecido, que foi feito de maneira irregular e que o prefeito estava tentando ver uma forma de cancelar o concurso”, contou o professor.

O professor, classificado para a disciplina de história, afirma que nenhum dos aprovados para os setores ‘Sede’ e ‘Ramais’ foram chamados, e que em Cacau Pirêra, que também é um setor previsto no concurso, poucas convocações foram feitas, e que existem muitas reclamações de falta de professores.

No último dia 1°, a comissão fez uma manifestação na Ponte Jornalista Phelippe Daou, para chamar a atenção das autoridades de Iranduba e de todo o Estado.

O deputado federal José Ricardo Wendling (PT) também já tentou manter diálogo com a Prefeitura de Iranduba, bem como com o MP para que as reivindicações da classe fossem atendidas.

O parlamentar por meio de ofício, solicitou informações sobre a quantidade de cargas dobradas, nomes dos professores que estão de licença, já que essas licenças são as justificativas para o alto número de professores atuando em vários turnos e disciplinas. Além disso, solicitou também o número de matrícula e a lotação de cada profissional, porém, não teve resposta, de acordo com o documento enviado à reportagem.

José Ricardo protocolou ainda, representações no Tribunal de Contas do Amazonas (TCE-AM) e no Ministério Público de Contas (MPC-AM). Nos documentos, o deputado relata as denúncias dos concursados e pede providência para que as convocações aconteçam com mais celeridade. (Documentos podem ser conferidos no final da matéria)

Na Justiça

O caso foi parar no Ministério Público do Amazonas (MP-AM), já que nem prefeito, nem secretário e muito menos a Câmara Municipal de Iranduba resolveu o impasse.

“Fomos até à Justiça, uma vez que estavam chegando muitas notícias de falta de professores, e de que até merendeiras e vigias estavam ministrando aulas. Muitas dessas denúncias são feitas por pais, que infelizmente têm medo de represálias, já que pelas condições financeiras dependem do prefeito de alguma forma, dependem de uma cesta básica, por exemplo, mas até agora nem no MP encontramos ajuda”, revelou Jhames.

O professor afirma também, que a Secretaria de Educação da cidade mantém em seus quadros, atualmente, diversos professores em regime de carga dobrada, tirando a vaga tanto dos aprovados dentro do número de vagas, quanto dos que estão no Cadastro Reserva.

“A justificativa é que esses profissionais estão substituindo os que estão de licença, mas pedimos a comprovação disso e nunca nos foi mostrado. Isso se tornou um grande problema e por isso, acionamos o Ministério Público, mas só tivemos respostas vazias e na decisão, a própria repetição do discurso do atual secretário (Altemar Leão). Tem ainda a situação de desistência de alguns professores e, em vez deles chamarem o próximo da fila ficam fazendo carga dobrada”, desabafou Bessa.

Os professores denunciam também que pedagogos, que não têm licenciatura para ministrar uma disciplina específica, estão dando aula para o fundamental II, que corresponde do 6° ao 9° ano. Assim como, professores de Educação Física ministrando aulas de inglês.

Descaso

Diante do descaso em convocar os aprovados, a comissão agora busca a prorrogação do concurso.

Segundo os professores, o prefeito não convoca os concursados por implicância e porque muitos profissionais que atuam hoje no município são apadrinhados de vereadores e secretários.

“Ele (o prefeito) já disse que não vai prorrogar. E sabe por que? Porque não é interessante para ele prorrogar a vigência, simplesmente porque ele quer colocar o eleitorado dele, as pessoas que irão votar nele. Muitos dos professores que estão nas escolas, são professores que não reclamam e os que estão entrando agora já viram que não têm direito a auxílio localidade, não têm direito a vale refeição, vale transporte, ou seja, estão ali e não recebem o que é direito deles por lei “, disse o professor de história.

Um professor que não quis se identificar e já atua nas escolas do município, relatou que outros colegas confirmam que existem muitos casos de profissionais dando aula de disciplinas diferentes das suas formações e que o município está assim há pelo menos cinco anos. Casos, que deveriam ser mantidos apenas em situação de emergência, mas se tornaram comuns.

Durante toda a apuração da reportagem, os professores nos relataram que estão “fazendo bico” para sobreviver, o que os deixa frustrados, uma vez que estudaram desde a época da faculdade, muitos pagaram cursinho para realizar o concurso, pagaram as taxas e hoje não estão em sala de aula.

Veja aqui alguns dos documentos que comprovam o chamamento moroso

Outro lado

O Portal AM1 procurou a Prefeitura de Iranduba, por meio da assessoria do prefeito. Enviamos uma mensagem com onze perguntas e fomos informados que a demanda seria repassada para o secretário de educação e equipe.

A reportagem esperou por dois dias um posicionamento oficial, mas até a publicação desta matéria não obtivemos retorno.

Confira os questionamentos do AM1:

Prezados, boa tarde,

Estamos fazendo uma matéria sobre os professores aprovados e também os classificados, ou seja, os que fazem parte do Cadastro Reserva do concurso público da Secretaria Municipal de Educação de Iranduba (SEMEI).

Gostaríamos de saber:

  • São 211 vagas, conforme prevê o edital. Porque os aprovados ainda não foram todos chamados?
  • E os classificados. Tem alguma previsão deles serem chamados?
  • Há denúncias de que existem mais de 100 professores hoje atuando com carga dobrada no município, uma vez, que existem professores aptos na lista para serem chamados e ocupar as vagas em aberto, não precisando ter um grande número de professores em carga dobrada. Qual o posicionamento da Prefeitura em relação a isso?
  • A Prefeitura pode fornecer ou publicar no Portal da Transparência os documentos que comprovem as devidas cargas dobradas?
  • Porque o prefeito Augusto Ferraz, chegou a falar que o “concurso não era para ter acontecido, que foi feito de maneira irregular” e tentou cancelar o certame?
  • Sabemos que diante da Lei, os aprovados têm o direito de ser chamados e assumirem as vagas. Quando isso acontecerá?
  • É verdade que o prefeito nunca quis manter diálogo com os aprovados?
  • Nos foi denunciado, por pais de alunos, que em muitas escolas, pessoas que estão no cargo de merendeira e até vigia estão dando aula. Procede?
  • Procede a denúncia de que pedagogos, que não têm licenciatura específica, estão ministrando aulas?
  • Com base na Lei 14.314/22, aprovada e que está em vigor desde março deste ano, a comitiva de aprovados e classificados buscam a prorrogação do concurso, uma vez que ele foi realizado em período de pandemia. Como a Prefeitura se posiciona em relação a isso?
  • Recebemos outras denúncias de que professores que atuam nas escolas da SEMEI não têm direito a auxílio localidade, refeição e transporte. Isso procede?