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Cidades

Manaus: comunidade onde criança morreu soterrada teme nova tragédia: ‘fomos esquecidos’

Ao Portal AM1, moradores da comunidade Fazendinha afirmaram que foram esquecidos pela Prefeitura de Manaus, mesmo após morte de criança de 7 anos

Manaus: comunidade onde criança morreu soterrada teme nova tragédia: ‘fomos esquecidos’

Foto: Reprodução

Manaus – Prestes a completar três meses da tragédia que matou a menina Raika Mirela dos Santos Pereira, de 7 anos, os moradores da Comunidade Fazendinha, na zona norte de Manaus, foram esquecidos pela prefeitura e temem novos deslizamentos por conta das fortes chuvas que atingem a capital e vivenciar uma nova tragédia como a do começo do ano.

O Portal AM1 esteve na comunidade, escutou as denúncias e reclamações dos moradores, que apelam para os poderes públicos para que uma providência seja tomada. Em janeiro, a criança de 7 anos morreu soterrada após um deslizamento, a família conseguiu se salvar, mas Raika Mirela não saiu a tempo de casa.

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Foto: Camila Duarte / Portal AM1

Depois de meses, a angústia dos moradores da Comunidade Fazendinha continua sendo a mesma. Morando ao lado dos destroços da casa em que a criança vivia, o autônomo Édison Fabiano afirmou que a Defesa Civil só apareceu no local no dia da tragédia e, após isso, não voltou para ajudar as famílias.

“Estamos esquecidos, a Defesa Civil só veio naquele dia e até hoje não vimos mais nada acontecer. Nós estamos com medo da casa lá de cima desabar e não dormimos direito quando chove, ficamos reunidos aqui fora [..] nosso maior medo é aquela casa desabar, se isso acontecer, ela vem igual um tsunami e trazendo tudo para baixo”, relatou.

Foto: Reprodução / TV AM1

Além do medo de novos deslizamentos, os moradores da comunidade ainda precisam conviver com as alagações. Todas as vezes em que chove, a casa das famílias é invadida pela água, devido ao mato alto que acumula a água da chuva e acaba transformando a passagem das pessoas em um grande lago.

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“É uma parte difícil de se morar. Aqui alaga quando dá um temporal. Também não temos poste, as pessoas puxam a energia e colocam lâmpadas nas árvores. Não estamos à vontade, quando chove, as árvores podem cair. Precisamos que as autoridades olhem para o nosso lado!”, afirmou.

Para tentar frear a água da chuva, os moradores precisaram unir forças e juntar centavo a centavo para construir uma espécie de córrego para fazer a drenagem. Com cimento e areia, as famílias da Fazendinha tentaram ao máximo conter os estragos feitos pela chuva, mas todo esforço ainda não é o suficiente.

Foto: Camila Duarte / Portal AM1

“Os moradores tiraram, cada um, um pouquinho e fizemos isso por necessidade. Não é o nosso dever, é o dever da Prefeitura de Manaus. Então, nós moramos aqui e queremos uma melhoria”, declarou o autônomo.

Depois da tragédia, as famílias foram cadastradas no Auxílio Aluguel da Prefeitura de Manaus e passaram a receber um valor de R$ 300, mas o dinheiro não é o suficiente para que eles encontrem uma nova moradia.

No caso da artesã Silvania Azevedo, apesar de estar com o dinheiro em mãos, é difícil encontrar uma casa no valor que foi disponibilizado aos moradores. “Não dá para nada. Dá para gente comprar alguma coisa, mas para auxílio-aluguel, como eles garantiram que era para alugar um ambiente para gente, isso daí não dá!”, disse.

Foto: Reprodução / TV AM1

Além do pouco valor, ela encontra dificuldades para encontrar uma casa que aceite crianças. Com uma família grande e um dos filhos sendo autista, achar uma casa que abrigue os filhos e com um valor econômico virou uma rotina a mais, além do receio de novos deslizamentos no local.

“Permanecemos no local até a última ordem. A Defesa Civil não tem ligado para nós para perguntar a situação. Nós que fomos lá para poder receber o auxílio, fora isso, nada mais. Eles não vieram mais aqui, só se tiver um deslizamento e nos afetar, aí eles vêm!”, contou.

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A moradora também explicou que, com medo de uma nova tragédia, as famílias não têm dormido dentro das casas. Todas as vezes em que chove, os moradores são obrigados a ficar debaixo dos guarda-chuvas fora das residências e vistoriando o local para ficar em alerta caso alguma casa ameace desabar.

Foto: Camila Duarte / Portal AM1

Silvania contou, ainda, que além de ficar preocupada com um novo deslizamento, ela ainda precisa se dividir em tirar a água da chuva de dentro de casa, uma rotina que ficou normalizada por conta das chuvas dos últimos meses.

Com o sentimento de que as famílias da Comunidade Fazendinha merecem serem atendidas, a artesã pede para que a Prefeitura de Manaus tenha um olhar crítico sobre a situação. “Eles deveriam verificar melhor os locais que estão sendo afetados pela chuva. Sabemos que é chuva e ninguém tem culpa, mas temos autoridades que precisam olhar por nós”, comentou.

“Eles precisam dos nossos votos, agora é tempo de eleição e eles deveriam olhar mais pela gente, assim como nós olhamos por eles na hora de votar”, pontuou.

Déficit de Moradia

Após a tragédia, o Portal AM1 procurou especialistas para que fizessem uma breve análise sobre os problemas de moradia em Manaus e, tal busca por informações, apontou que a morte de Raika Mirella é considerada déficit de moradia.

Para o presidente do Conselho de Arquitetura do Amazonas, Jean Faria, os deslizamentos causados por conta das chuvas são coisas que ocorrem há muito tempo em Manaus. Para ele, falta fiscalização.

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“O grande problema é que as pessoas ainda insistem em morar em locais que não são feitos para morar. Em costas de barranco, fundos de morro, em cima de igarapés. As questões das invasões irregulares, acho que teria que ter uma atitude mais enérgica do próprio Estado ou município para evitar que isso aconteça”, explicou.

Como forma para combater as invasões ou construções em locais irregulares, o urbanista destacou que as autoridades poderiam adotar métodos como sinalização nessas áreas, e ressaltar que os locais têm riscos de desabamento. Outra forma seria construindo conjuntos habitacionais.

Foto: Reprodução

“Temos um déficit muito grande, principalmente para população de baixíssima renda que não tem como pagar. Esse tipo de habitação é feito com recursos a fundos perdidos, então isso pode ser pensado numa situação onde você faça um determinado conjunto habitacional de forma regular, de forma segura, em que você possa tirar dessas áreas de risco e colocando nesses conjuntos”, explicou.

Depois de meses, os moradores da comunidade Fazendinha continuam sofrendo com o mesmo problema que matou a criança soterrada, enquanto o prefeito David Almeida continua assinando contratos milionários.

O Portal AM1 tentou contato duas vezes com a Defesa Civil. O primeiro contato foi feito na terça-feira (12), mas a assessoria informou que estava sem sistema para dar respostas sobre o caso de Raika Mirela e o que foi feito para os moradores da área. O segundo contato foi feito na quarta-feira (13), no entanto, não houve retorno.