Manaus, 3 de maio de 2024
×
Manaus, 3 de maio de 2024

Política

Eleitor escolhe parlamentares pela fama e coloca a própria vida nas mãos das celebridades

Personalidades famosas trocaram os holofotes pela tribuna e garantiram cargos públicos nas eleições

Eleitor escolhe parlamentares pela fama e coloca a própria vida nas mãos das celebridades

Foto: Reprodução

Manaus, AM – Muitos eleitores dizem que deixaram de acreditar na política brasileira, mas continuam arriscando seu voto em personalidades famosas que trocam os holofotes pela tribuna. Além de terem visibilidade, os candidatos usam a propaganda de que desejam transformar a política brasileira, que perdeu a confiança dos eleitores por conta dos escândalos de corrupção. Mas, apesar do “desejo” de mudar o Brasil, os famosos que ocupam os cargos públicos possuem pouca atuação e ao menos, até agora, não cumprem a promessa de fazer a “nova política”.

As personalidades usam a visibilidade para atrair os eleitores e conquistar uma cadeira nos órgãos públicos. Funkeiros, atletas, humoristas, musas do Carnaval, jornalistas e até mesmo atores pornôs integram a lista de personalidades que, mesmo não eleitos, conseguiram acumular um bom número de votos nas urnas.

Leia mais: Entrada de Bolsonaro no PL deve provocar saída de pelo menos 15 políticos da sigla

Segundo o cientista político Carlos Santiago, grande parte do eleitorado brasileiro vota em pessoas, personalidades e em “salvadores da pátria”. Com isso, o voto consciente em uma ideologia, em uma proposta ou em uma sigla partidária acaba sendo a minoria.

“Proposta, partidos e autoridades estão muito desgastadas. Por isso, alguns partidos procuraram pessoas famosas para obter boa votação e eleger uma bancada significativa”, comentou o cientista político.

Com o avanço da tecnologia e cada vez mais pessoas ficando famosas por conta das redes sociais, isso pode influenciar na candidatura e nas eleições futuras, deixando de lado as propostas para a melhoria do Brasil. “Antes a maioria das personalidades vinham do rádio, depois da televisão e agora do YouTube. As ideias, propostas e ideologias políticas estão em segundo plano”, destacou.

Um dos exemplos de votação em personalidades famosas está o caso do humorista Francisco Everaldo Oliveira Silva, conhecido como Tiririca. Tentou se eleger pela primeira vez em 2010, tornando-se o deputado federal mais votado do Brasil, com 1.348.295 votos. Durante a campanha, ele fez deboches sobre o cargo em que concorria, mas conseguiu atrair eleitores e se eleger.

Leia mais: De olho nas eleições, Lula viaja à Europa para encontrar lideranças da esquerda

Foto: Reprodução

“O que é que faz um deputado federal? Na realidade, eu não sei. Mas vote em mim que eu te conto”, ironizou o humorista. Após assumir o posto, Tiririca foi apontado como analfabeto e precisou passar por avaliações em audiência na Justiça Eleitoral, o que acabou sendo uma polêmica na época, já que pessoas analfabetas não são elegíveis.

Apesar desse problema, o qual foi considerado irrelevante em audiência, conseguiu se reeleger em 2014 com 1.016.796 votos, ficando novamente entre os parlamentares mais votados do Brasil. Ao decorrer do mandato, afirmou que deixaria a vida política, mas não fez jus à declaração e se reelegeu em 2018, mas desta vez com uma quantidade reduzida de eleitores que confiaram o futuro a ele, sendo eleito novamente com 453.855 votos. Na prática, o mandato não resultou em nada de novo.

Leia mais: Congresso aprova crédito extra de mais de R$ 9 bilhões para Auxílio Brasil

O “efeito Tiririca” pode ter assustado alguns brasileiros na época, chegando até ser motivo de piada sobre em quem votar nas eleições. Mas o fato é que, mesmo não possuindo ensino e conhecimento para assumir o posto, o humorista conseguiu chamar atenção e ser eleito, levando com ele candidatos com menos votos. Outros famosos também embarcaram na aventura e se candidataram para os cargos públicos, mesmo não reunindo um número expressivo como o do comediante, ainda assim, conquistaram espaço nos órgãos e o poder de definir o futuro da nossa vida.

Do reality para a Câmara

Com fama nacional pela participação no reality Big Brother Brasil, Jean Wyllys conquistou a preferência do público e ganhou o programa na quinta edição, se tornando o mais novo milionário do Brasil,. No entanto, não foi apenas o BBB5 que ele ganhou.

Em 2010, disputou um cargo na Câmara dos Deputados pelo PSOL e conseguiu a cadeira com menor quantidade de votos no Rio de Janeiro, mas foi eleito graças ao desempenho de outro candidato da sigla. Em 2014, foi reeleito para o cargo, sendo o sétimo deputado mais votado no Rio, com quase 145 mil votos.

Apesar de permanecer na Casa por dois mandatos, não foram as ações políticas que fizeram Wyllyes ter destaque, mas sim as brigas com os colegas. Durante a votação para o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, Jean Wyllys cuspiu em direção ao presidente Jair Bolsonaro, na época deputado federal.

Leia mais: Pesquisa diz que mais de 50% dos brasileiros querem impeachment de Bolsonaro; presidente desdenha

Foto: Reprodução

Após a cena, Wyllys afirmou que foi insultado por Bolsonaro e não se arrependia de ter cuspido no colega de parlamento. “Na hora que eu fui votar, esse canalha decidiu me insultar na saída e tentar agarrar meu braço; ele ou alguém que estivesse perto dele. Quando eu vi o insulto, eu devolvi com um cuspe na cara dele, que é o que ele merece”, disse.

As constantes discussões entre Wyllys e a família Bolsonaro o levaram a pedir proteção na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, devido às ameaças de morte que recebia frequentemente em 2018.

Vale destacar que o ex-BBB foi reeleito nas eleições de 2014, mas decidiu não assumir o cargo e deixou o Brasil para se dedicar à carreira acadêmica.

Ex-ator pornô

Expulso do PSL por criticar o presidente Jair Bolsonaro – que até então representava a sigla – o deputado federal Alexandre Frota assumiu o posto com 155 mil votos pelo estado de São Paulo e é mais uma das celebridades que ocupa cargo público por meio do voto.

Leia mais: Alexandre Frota pede abertura de CPI para investigar facada de Bolsonaro

Em diversos momentos, algumas inimizades políticas tentam atingir Frota pelo passado na indústria pornográfica, como é o caso do deputado Eduardo Bolsonaro, que constantemente relembra a ex-profissão do colega de Parlamento e troca ofensas com Frota na Casa.

Foto: Câmara dos Deputados

Apesar das discussões com a família Bolsonaro, o deputado esteve do lado de Jair Bolsonaro, atual presidente do Brasil, durante a campanha de 2018, e recebeu muitos votos por parte do eleitorado bolsonarista de São Paulo.

O desejo de se envolver na política despertou em 2013, durante as manifestações contra o governo Dilma e os pedidos de impeachment da presidente. Foi na mesma época em que conheceu Bolsonaro, e uma amizade entre os dois surgiu, mas que acabaria com o rumo do governo federal.

Campeão do mundo no Senado

Ídolo no futebol brasileiro e campeão do mundo pelo Brasil no tetracampeonato em 1994, o ex-jogador Romário decidiu seguir carreira política e já ocupa uma cadeira no Senado Federal. Em 2010, Romário se candidatou pela primeira vez como deputado federal e foi o sexto mais votado com mais de 615 mil votos no Rio de Janeiro.

Em 2014, o ex-jogador focou em um cargo maior na política e mirou no Senado Federal. Dos oito candidatos que disputavam a vaga, Romário teve 63,43% dos votos contra apenas 20,51% do segundo colocado.

Leia mais: Romário assume presidência do Senado pelos próximos dias

Nesta semana, Romário exercerá o cargo de presidente do Senado Federal, sendo eleito em 2021 como o segundo vice-presidente da Casa, para o mandato da Mesa Diretora. Ele deve ficar no comando dos trabalhos até o próximo dia 16 de novembro.

Foto: Lucio Bernardo Jr / Câmara dos Deputados

O ex-jogador de futebol é o segundo-vice-presidente do Senado e está substituindo os ausentes Rodrigo Pacheco e Veneziano Vital do Rêgo. Ao comandar a sessão pela primeira vez, Romário afirmou que é uma honra assumir o posto.

“É com muita honra, alegria e entusiasmo que assumo, pela primeira vez, o posto de presidente do Senado. Fico no cargo até o próximo dia 16, quando o presidente Rodrigo Pacheco retorna da COP-26, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas”, escreveu Romário no Twitter.

Segunda tentativa

Thammy Miranda, filho de Gretchen, tentou nas eleições de 2020 uma cadeira na Câmara Municipal de São Paulo e foi eleita. Esta é a segunda vez que ele concorria nas eleições, já que em 2016 não conseguiu se eleger e recebeu apenas 12.408 votos válidos.

O ator destacava que não iria desistir da carreira política e, em mais uma tentativa, triplicou o número de votos e foi eleito com mais de 43 mil confirmações na urna pelo PL. Com a quantidade de votos, Thammy se tornou o nono vereador mais votado de São Paulo.

Leia mais: Vídeo: Bolsonaro revela intimidades com Michelle e deixa primeira-dama em saia justa

Após a eleição, Thammy afirmou que não pensa mais na vida artística como profissão, e está engajado na carreira política. “Eu quero fazer desse caminho político a minha missão pra poder fazer a diferença e deixar um legado”, comentou, deixando claro que como políticos tradicionais, resolveu fazer dos cargos públicos um meio de vida.

Foto: Reprodução

Facilidade para serem eleitos

A Câmara dos Deputados teve um impasse no início do segundo semestre de 2021 ao tentar aprovar a PEC da Reforma Eleitoral. Um dos pontos do texto estava a criação do “distritão”, método que facilitaria a eleição de personalidades famosas.

Contudo, a proposta foi rejeitada pela Câmara e excluída do texto, mas antes dessa ação, gerou críticas e discussões entre os parlamentares. Isso porque, com o distritão, os deputados mais votados em cada Estado passariam a ocupar os cargos na Câmara e todos os votos dos candidatos que não conseguiram se eleger seriam desconsiderados.

Sendo assim, esse modelo acabaria colocando no topo personalidades famosas, sendo celebridades ou políticos. No caso das celebridades, por exemplo, por terem uma base de admiradores, os eleitores poderiam acabar votando na celebridade e elegendo somente ela, o que excluiria colegas de partido que não receberam quantidade suficiente de votos para serem eleitos.

Leia mais: Câmara aprova PEC dos Precatórios; cinco deputados do AM votaram a favor

No atual modelo de votação, os votos de candidatos que não se elegeram são reaproveitados pelos partidos, menos em partidos que não conseguiram eleger nenhum candidato. O modelo distritão também favorece candidatos já eleitos e enfraquece partidos menores, visto que os mais votados possuem vantagem e condições de fazerem campanhas mais caras.

Apesar do método ter sido descartado, até então, na Câmara dos Deputados, eleitores ainda continuam elegendo personalidades famosas para ocuparem cargos públicos e desconfiando da política brasileira, mesmo entregando de bandeja as administrações do Brasil para celebridades.

Acompanhe em tempo real por meio das nossas redes sociais: Facebook, Instagram e Twitter