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Após ‘silêncio’ de MP e OAB, Defensoria quer barrar proibição do TJAM no uso de minissaia e top

Após ‘silêncio’ de MP e OAB, Defensoria quer barrar proibição do TJAM no uso de minissaia e top

Do TJAM, a juíza Larissa Gadelha assinou a portaria com as restrições de trajes para meninas (Reprodução)

A Defensoria Pública do Estado (DPE-AM) ingressou nesta quarta-feira, 23, com um mandado de segurança com pedido de liminar para suspender imediatamente os efeitos da Portaria nº 11, de 9 de outubro de 2019, editada pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Barreirinha, disciplinando o ingresso de crianças e adolescentes no Festival Folclórico da cidade, que inicia hoje, 24, e vai até sábado, 26.

Assinada pela juíza Larissa Gadelha, a portaria impôs, entre outros itens, regras de vestimentas, como a proibição do uso de top e minissaia para crianças e adolescentes com menos de 18 anos, sob o argumento de garantir a “integridade moral das moças”. O assunto causou polêmica nas redes sociais e dividiu internautas.

Procurados durante esta semana, o Ministério Público do Estado (MP-AM) e a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), no Amazonas, omitiram-se de expedir qualquer posicionamento sobre o caso.

No Judiciário, a OAB defende a ordem jurídica, segundo o seu próprio regimento interno, e o MP, em tese, é o fiscal da lei, independentemente, de sua conveniência institucional.

Já Associação dos Magistrados do Amazonas (Amazon), no apoio à juíza Larissa Gadelha, insistiu na tese de que a portaria pretende “prevenir” que crianças e adolescentes não sejam utilizados como objetos de “exploração sexual”.

Defensores agem

O mandado de segurança da DPE contra a portaria é assinado pelos defensores públicos do Polo do Baixo Amazonas Gabriela Ferreira Gonçalves, Danilo Justino Garcia, Everton Sarraff Nascimento e Rafael Lutti e pela coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher da Defensoria Pública do Estado do Amazonas (Nudem/DPE-AM), Pollyana Souza Vieira.

O documento foi publicado em 17 de outubro de 2019, no Diário Oficial Eletrônico do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM), no Caderno Administrativo – Seção V. 

Em seu artigo 2ª, da portaria, o documento proíbe a participação de menores de 18 anos de idade durante a realização do festival folclórico do município com “trajes tais minissaias, tops, etc, que atentem contra a integridade moral”. Quem descumprir a medida estará sujeito a multa de R$ 500, estabelece ainda a portaria. 

Violência agravada

Entre os argumentos levantados pelos defensores públicos no mandado de segurança está o de que a portaria, sob o pretexto de disciplinar a entrada de crianças e adolescentes no evento cultural, acaba traduzindo uma tutela de corpos femininos e agrava ainda mais a violência de gênero, pois legitima o inconsciente coletivo de que a mulher (seja criança, adolescente ou adulta) deve seguir determinados padrões para ser respeitada ou considerada digna. 

Os defensores também destacam que a violência de gênero possui raízes estruturais que passam pelo controle de corpos femininos, e que a portaria deve ser repudiada porque, entre outras razões, contribui para a assimilação da ideia de que se o corpo da mulher está fugindo do “padrão da moral” há o “convite” à violência (indo na contramão da desconstrução desse imaginário social). 

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Machismo estrutural

O mandado de segurança assinado pelos defensores também levanta questionamento sobre de que maneira uma minissaia, um top ou outro tipo vestimenta podem atentar contra a integridade moral de crianças e adolescentes, senão quando vistos sob a ótica do machismo como sistema estrutural. 

De acordo com o mandado de segurança, a portaria possui também vício da ilegalidade, havendo abuso do poder disciplinador, pois, da forma como editada, atenta contra a dignidade (artigo 1º, III, e artigo 227, ambos Constituição da República de 1988), a liberdade e a igualdade (artigo 5º, caput, e artigo 227, ambos da CRFB/88), o respeito (artigo 227, CRFB/88), dentre outros direitos e garantias fundamentais e humanos, dirigidos às crianças e adolescentes e as mulheres, enquanto grupos reconhecidamente vulneráveis.

Sem justificativa

O mandado de segurança considera também que não se pode admitir o argumento de que a portaria apenas estaria seguindo o exemplo histórico de outras portarias editadas para disciplinar eventos realizados no Amazonas, como o Carnaval em Manaus ou o Festival de Parintins, pois um erro não justifica outro.  

Com base nesses argumentos, o mandado de segurança pede a concessão da medida liminar, para que sejam, imediatamente, suspensos os efeitos da Portaria nº 11/2019, da Vara Única da Comarca de Barreirinha/AM, incluindo o Artigo 2º, com as regras sobre vestimentas; que sejam requisitadas informações à autoridade coatora e que no mérito da ação seja declarada a inconstitucionalidade e ilegalidade da portaria e de seu Artigo 2º. 

(*) Com informações da assessoria de imprensa da DPE-AM. Material editado por Paula Litaiff